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Rasteabilidade sem rumo


Luis Alberto Moreira Ferreira
A frase atribuída ao general De Gaulle ? ?O Brasil não é um país sério? ? está por merecer um complemento: ?E não faz a menor questão de provar o contrário?. O que nos leva, neste momento, a essa conclusão são os descaminhos a que está sendo submetida a rastreabilidade bovina em nosso país.


 Incompreensivelmente, um recurso para qualificar o nosso produto e melhorar a gestão do nosso negócio está sendo tratado com tal descaso ou falta de competência que nos faz temer pelo pior: o descrédito do Brasil diante dos países importadores de carne e a conseqüente perda de mercados, com resultados desastrosos para toda a pecuária nacional.

 Enganam-se profundamente os que pensam que os custos e os benefícios da rastreabilidade dizem respeito somente ao comércio exterior: um revés nas exportaçnoes será um desastre para o preço da carne também no mercado interno, uma vez que cada tonelada não exportada servirá para aumentar a oferta em um ambiente de consumo já retraído e com preços baixos.

 Não se trata de alarmismo, mas sim de tomada de consciência da posição do Brasil no mercado internacional da carne: somos, hoje, o maior exportador do produto ? e temos que agir de acordo com a dimensão da nossa importância no mercado mundial. Estamos, no entanto, fazendo o contrário. Lideramos as exportações de carne, mas agimos como se fôssemos uma República de Bananas.

 O tamanho da nossa indignação ? e, podemos garantir, de todos que vêem a rastreabilidade como uma ferramenta para o incremento da pecuária ? é proporcional à pasmaceira em que se encontra o Sistema Brasileiro de Identificação Bovina e Bubalina (Sisbov).

 Vamos, resumidamente, aos fatos. O Sisbov foi instituído em janeiro de 2002, estabelecendo que à partir de julho daquele ano os animais cuja carne seria exportada para a União Européia deveriam ser identificados e registrados na Base Nacional de Dados (BND) do Sistema, onde deveriam permanecer por um período mínimo de 40 dias. Essas providências, no entanto, começaram a vigorar somente um ano depois.

 Em novembro de 2003 foi definido um calendário estabelecendo: a) quarentena para os animais destinados a todos os mercados (nõ somente à UE) a partir de 31/12 daquele ano; b) permanência de 90 dias na BND dos animais para exportação (todos os mercados) a partir de 31/05/2004; c) permanência de 180 dias a partir de 31/11/2004; e) permanência de 365 dias a partir de 31/05/2005; f) a partir de 31/05/2005, registro na BND de todos os animais nascidos no país.

 Apesar dos naturais problemas de percurso, até maio de 2004 o Sisbov vinha se mostrando exeqüível. Naquele mês, masi de 4 milhões de animais foram registrados na BND, confirmando a adesão dos pecuaristas ao Sistema.A partir daí, no entanto, um tão poderoso quanto retrógrado lobby conseguiu jogar trevas sobre um caminho que se mostrava claro o suficiente para conduzir a rastreabilidade a seu destino natural de modernizar efetivamente a pecuária brasileira.


 Mesmo declarando-se favorável à rastreabilidade, no que piamente acreditamos, infelizmente o ministro Roberto Rodrigues, se viu envolvido pela avalanche de opiniões contrárias, o que inclui deputados federais que se dizem representantes da agropecuária.

 Um dos resultados do ?excelente? trabalho do lobby foi a suspensão do cronograma, de modo que continua em vigor a permanência de 40 dias na BND. Outro, foi o descrédito do Sistema. Um terceiro, está sendo a perpetuação da inércia, por meio da constituição de incontáveis ?grupos de trabalho? com a função de apresentarem ?propostas? para o Sisbov.

 A situação, no entanto, chegou no limite. Mesmo que não tenha sido o causador da pasmaceira atual, chegou a hora de o Ministério da Agricultura marcar uma posição em relação so sistema de rastreabilidade bovina no Brasil. Governar, nos ensinam os dicionários, significa controlar o rumo, dar direções.

 Se produzirmos carne para o mercado, temos que ouvir o que o mercado está dizendo. E o mercado é claro: quer segurança alimentar, quer produtos com qualidade, quer garantias sobre o que compra. Vamos continuar fazendos ouvidos moucos para o mercado? Vamos continuar no faz de conta? Vamos continuar acreditando que o mercado se curvará a nós?

 Os que pensam assim certamente ainda não perceberam que estamos no ano 2005, que o mundo está atento àquilo que contraria ou não atende aos requisitos de sustentabilidade e de vida saudável, que o mundo globalizado significa ausência de fronteiras ? ou seja, estão todos vendo o que acontece no nosso quintal, a exemplo das missões de diversos países que nos têm visitado ultimamente para ver como são nossos pastos, currais e frigoríficos.

 A exemplo do que confirma em entevista ao Jornal dos Criadores, o diretor do frigorífico Independência, senhor Miguel Graziano Russo, todos os países importadores -  e não somente os da União Européia ? exigem hoje que a carne que compram seja de animais identificados. Em pouco tempo, as exigências serão maiores, de modo a não termos mais como fazer de conta. Ou teremos a rastreabilidade ou não teremos o mercado externo ? isso sem contar que o mercado interno também deverá, mesmo que aos poucos, mudar suas exigências de consumo.

 Vamos esperar o quê para fazermos rastreabilidade com seriedade?

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