
Anvisa Simplifica Regulação de Alimentos: Eficiência ou Risco?
Introdução
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Instrução Normativa (IN) nº 344/25, estabelecendo um procedimento otimizado de análise para petições na área de alimentos. Essa iniciativa visa agilizar processos regulatórios por meio da aceitação de documentações técnicas emitidas por Autoridades Reguladoras Estrangeiras Equivalentes (AREE), entidades reconhecidas por possuírem padrões regulatórios similares aos da Anvisa.
A medida tem como objetivo reduzir a burocracia, encurtar prazos de análise e facilitar a entrada de novos produtos no mercado brasileiro. Contudo, essa flexibilização levanta dúvidas: até que ponto a adoção de pareceres estrangeiros pode impactar a segurança alimentar nacional? A decisão fortalece ou fragiliza a autonomia regulatória brasileira?
A Nova Regra e Suas Aplicações
O procedimento otimizado de análise, consolidado pela RDC nº 741/22, já é utilizado na aprovação de medicamentos e dispositivos médicos. Agora, sua aplicação foi ampliada para novos alimentos, ingredientes e materiais de contato com alimentos.
A IN nº 344/25 cobre as seguintes categorias:
- Aditivos alimentares, exceto aromatizantes de espécies botânicas regionais;
- Coadjuvantes de tecnologia, exceto enzimas utilizadas nesse processo;
- Enzimas empregadas como coadjuvantes na produção de alimentos;
- Novas substâncias para materiais em contato com alimentos;
- Novas tecnologias aplicadas a embalagens e materiais de contato;
- Segurança e eficácia de propriedades funcionais ou de saúde de novos alimentos e ingredientes (exceto probióticos e enzimas);
- Avaliação de segurança e eficácia de propriedades funcionais de probióticos;
- Análises de risco de produtos veterinários que podem impactar a cadeia de alimentos.
Com essa medida, a Anvisa pretende otimizar seus processos ao aproveitar avaliações técnicas já realizadas por órgãos estrangeiros reconhecidos, como a FDA (Estados Unidos), EFSA (União Europeia) e Codex Alimentarius (ONU).
Vantagens da Nova Regra
1. Redução de Burocracia e Prazos
A simplificação documental pode diminuir o tempo necessário para aprovar produtos, beneficiando a indústria de alimentos ao reduzir custos e acelerar lançamentos.
2. Facilitação do Acesso a Novas Tecnologias
A aceitação de análises internacionais permite que o Brasil acompanhe inovações globais, garantindo que os consumidores tenham acesso mais rápido a novos produtos e ingredientes.
3. Fortalecimento da Indústria Nacional
A harmonização regulatória pode beneficiar empresas brasileiras que exportam, uma vez que suas certificações internacionais poderão ser aproveitadas no Brasil sem necessidade de trâmites duplicados.
Pontos de Atenção e Possíveis Riscos
1. Risco à Soberania Regulatória
Embora a Anvisa mantenha o poder de decisão, existe a preocupação de que a dependência de avaliações estrangeiras possa enfraquecer a capacidade do Brasil de estabelecer critérios próprios para segurança alimentar, adaptados à realidade local.
2. Capacidade de Fiscalização da Anvisa
Mesmo com a aceitação de documentações estrangeiras, o Brasil tem desafios específicos, como clima, consumo e hábitos alimentares distintos. O sucesso dessa estratégia dependerá da capacidade da Anvisa de monitorar e validar os produtos aprovados internacionalmente.
3. Impacto na Competitividade da Indústria Nacional
Empresas brasileiras podem enfrentar maior concorrência de multinacionais, que já possuem certificações de órgãos estrangeiros e, com essa nova regulamentação, terão menos barreiras para entrar no mercado brasileiro.
4. Segurança Alimentar e Adaptação ao Contexto Nacional
Produtos aprovados no exterior podem não ter sido testados para a realidade brasileira, incluindo diferenças de exposição, interações e padrões de consumo, o que pode exigir maior monitoramento após a comercialização.
A Regulamentação em Números
A IN nº 344/25 se soma a outras regulamentações recentes que buscam modernizar os processos da Anvisa. Veja um comparativo com normas anteriores:
Regulamentação | Setor Aplicado | Objetivo |
---|---|---|
RDC nº 741/22 | Medicamentos e dispositivos médicos | Aceitação de pareceres técnicos de órgãos internacionais |
IN nº 289/24 | Medicamentos biológicos e vacinas | Procedimento otimizado para análise de petições |
IN nº 290/24 | Dispositivos médicos | Avaliação de petições de registro internacional |
IN nº 344/25 | Alimentos e ingredientes | Acelerar a regularização de produtos aprovados no exterior |
Conclusão
A adoção do procedimento otimizado de análise é um passo importante para modernizar o setor regulatório no Brasil, permitindo maior eficiência nos processos e aproximando o país de práticas internacionais. No entanto, o sucesso dessa medida dependerá de um equilíbrio entre agilidade e rigor técnico, garantindo que o mercado brasileiro não se torne excessivamente dependente de avaliações estrangeiras sem a devida análise contextualizada.
O impacto final ainda será medido nos próximos anos. Se bem executada, a regulamentação pode impulsionar a indústria nacional, reduzir custos e aumentar a inovação. No entanto, se houver fragilidades na fiscalização, o consumidor pode ser prejudicado e a soberania regulatória brasileira pode ser colocada em xeque.
O Brasil está pronto para essa mudança ou estamos abrindo espaço para uma flexibilização excessiva? O futuro regulatório dirá.