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Patologia de sementes

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1. Introdução

Existe um grande número de fatores que afetam a qualidade das sementes.
Esses fatores podem ser agrupados em quatro classes distintas:

a) Fatores genéticos: Os fatores genéticos capazes de afetar a qualidade das sementes estão relacionados com as diferenças de vigor e de longevidade observadas dentro de uma mesma espécie, como também com as vantagens auferidas pela heterose (vigor híbrido);

b) Fatores fisiológicos: Os fatores fisiológicos têm sua ação determinada, principalmente, pelo ambiente no qual as sementes se formam e pelo manuseio das mesmas durante as fases de colheita, de beneficiamento e de armazenamento;

c) Fatores físicos;

d) Fatores sanitários: Os fatores sanitários se caracterizam pelo efeito deletério provocado pela ocorrência de microrganismos e insetos associados às sementes, desde o campo de produção até o armazenamento. 

Os insetos podem causar danos generalizados, como danos ao embrião e ao tecido de reserva necessário para sua alimentação, danos pela ovoposição, pelo aumento da temperatura, da umidade e da produção de dióxido de carbono.

Os microrganismos, por sua vez, constituem-se em outro fator importante em termos de qualidade das sementes, como também podem se constituir em fator limitante da produção, como é o caso de bacterioses, viroses e doenças fúngicas existentes em várias regiões agriculturáveis.

Esses aspectos devem ser observados com muita atenção, à medida que se busca o estabelecimento de padrões de sementes para os principais microrganismos patogênicos ocorrentes nas diversas culturas de importância econômica, a fim de que as sementes distribuídas aos agricultores constituam-se em um ponto de alta qualidade e de desempenho satisfatório nos campos de produção.

2. Transmissão de patógenos associados às sementes

A maioria dos patógenos que ocorrem nos campos de produção de sementes podem ser transmitidos pelas sementes. Os mecanismos de transmissão utilizados pelos patógenos são variados e podem ser classificados de acordo com sua localização na semente (misturado, aderido à superfície ou localizado no interior da semente) e com o desenvolvimento do patógeno durante o crescimento da planta.

As expressões infestação e infecção, muito empregadas em patologia de sementes, têm seu significado próprio. O termo infestação é utilizado para caracterizar a presença do patógeno misturado (escleródio, galhas, etc.) ou aderido à superfície das sementes. Já o termo infecção indica que o patógeno está localizado no interior da semente (cotilédones, embrião, etc.) (Figura 1).



Figura 1 - Ciclo de mancha foliar olho-de-rã (Cercospora sojina) na cultura da soja.


Certos patógenos localizados no interior das sementes podem produzir infecções sistêmicas na planta, enquanto outros podem produzir infeções localizadas em folhas, pecíolos, hastes, vagens, etc. O mesmo acontece com os patógenos que infestam as sementes. Quando uma semente infestada germina e produz uma nova planta, essa poderá apresentar uma infecção sistêmica (Figura 2) ou uma infecção local.
 


Figura 2 – Esquema de infecção em plantas de milho por Ustilago maydis.


 
Alguns patógenos provocam perdas em nível de campo, restringindo seus efeitos à redução de rendimento sem, no entanto, afetar a viabilidade das sementes. Por outro lado, outros patógenos se caracterizam por, além de provocar reduções de rendimento, concentrar seus efeitos danosos sobre a semente. Como consequência direta, teremos reduções da porcentagem de germinação e do vigor, com reflexos altamente negativos sobre a classificação de lotes de sementes, diminuindo a disponibilidade desse insumo para a semeadura seguinte. Desta forma, nenhum veículo de disseminação de doenças é tão eficiente quanto às sementes, pelo fato dessas permitirem uma transmissibilidade prolongada, uma máxima infecção, uma disseminação de patógenos a grandes distâncias, a perpetuação do patógeno, o aumento do potencial de transmissão, a indução de doenças por dois ou mais patógenos e pela introdução dos mesmos em áreas novas (Figura 3).


Figura 3 - Ciclo de vida de Puccinia recondita f.sp. tritici na cultura do trigo.

 

Os danos causados por microrganismos transmitidos por sementes são bastante variáveis, estando na dependência do patógeno envolvido e do inóculo inicial do mesmo, da espécie cultivada, das condições climáticas vigentes no decorrer do desenvolvimento da cultura, etc. A avaliação dos danos causados por microrganismos nos campos de produção de sementes é uma tarefa árdua e de difícil execução, uma vez que existem vários fatores agindo simultaneamente sobre a planta, fazendo com que os resultados obtidos tenham baixa exatidão, comprometendo a reprodutibilidade de resultados. Entretanto, as porcentagens de perdas podem ser relacionadas com outras, tais como a porcentagem de área foliar destruída pelo patógeno (Figura 4), a porcentagem de plântulas e/ou plantas mortas, a porcentagem de sementes infectadas e avaliação dos efeitos do patógeno sobre outros componentes da produção.



Figura 4 - Ferrugem (Puccinia recondita f.sp. tritici) em folhas de trigo.

 

3. Efeito de patógenos sobre a qualidade das sementes

Da mesma forma que são observados problemas de redução de rendimento em nível de campo, devido à incidência de patógenos, os mesmos podem também causar redução da qualidade das sementes para fins de comercialização e semeadura.

3.1. Problemas provocados por bactérias

O principal efeito de bactérias sobre as sementes é o completo apodrecimento das mesmas por ocasião da germinação e a morte da plântula nos primeiros estágios de desenvolvimento. Além da morte de sementes e plântulas, as bactérias podem também produzir descoloração do tegumento.

3.2. Problemas causados por fungos de campo

Muitos fungos são sérios parasitas de primórdios florais e de sementes, causando redução tanto quantitativa quanto qualitativa do rendimento. Outros fungos como os saprófitos e parasitas fracos, podem causar descoloração do tegumento, a qual terá influência negativa no valor comercial.

Os danos comumente provocados por fungos em sementes são:

a) Aborto de sementes: exemplos típicos destes danos são os causados por carvões (Ustilago spp.) (Figura 5), bem como Drechslera sorokiniana e algumas espécies de Fusarium;


Figura 5 - Danos de Ustilago maydis em milho.

 

b) Redução do tamanho da semente: existem vários exemplos deste tipo de dano. Podem-se destacar os danos causados por Alternaria brassicicola e Phoma lingam em brassicáceas, Stagonospora nodorum em trigo, Drechslera teres em cevada, fungos causadores de míldio em cereais, etc;

c) Podridão de sementes: muitos fungos associados às sementes causam apodrecimento quando as mesmas ainda se encontram sobre a planta, ou mesmo durante a germinação em laboratório ou no campo;

d) Esclerotização: a transformação do órgão floral ou da semente em esclerócio é uma importante doença em certas categorias de fungos e hospedeiros;

e) Necroses em sementes: muitos fungos causadores de podridões de sementes produzem necroses nas mesmas, enquanto outros se limitam a hospedar o tegumento ou pericarpo;

f) Descoloração das sementes: a descoloração das sementes é um fator de depreciação muito grande. No material destinado à semeadura, este tipo de anormalidade caracteriza, geralmente, a presença de parasitas; nos produtos destinados ao consumo, geralmente é indicativo de uma baixa qualidade;

g) Redução de viabilidade e perda de germinação: obviamente, todos os fungos que provocam necroses ou podridões profundas nas sementes irão reduzir a viabilidade, longevidade e a emergência das mesmas em nível de campo.
 
3.3. Problemas causados por fungos de armazenamento

Os principais fungos envolvidos na perda de produtos armazenados pertencem a várias espécies de Aspergillus e algumas espécies de Penicillium, os quais têm sua atividade regulada pelas condições ambientais vigentes durante o período de armazenamento e pelas condições do lote de sementes, especialmente de seu estado físico, teor de umidade e inóculo inicial. Os danos causados às sementes são bastante variados, originando perdas significativas quanto ao valor cultural e nutricional do produto armazenado.

Os principais efeitos sobre as sementes são:

a) Perda da germinação devido à invasão do embrião, especialmente em sementes de gramíneas;

b) Descoloração das sementes, causando problemas de redução da viabilidade, do valor nutricional e do valor comercial do produto;

c) Aumento da taxa de ácidos graxos, causando rancificação do óleo, sendo a taxa de ácidos graxos livres um indicativo da deterioração das sementes;

d) Aquecimento da massa de sementes, com consequente aumento da taxa respiratória, podendo levar as sementes a uma rápida deterioração;

e) Produção de toxinas, causadas tanto por Aspergillus como por Penicillium, as quais podem ser letais ao homem e aos animais.
 
3.4. Danos causados às sementes por vírus e nematóides
Os vírus geralmente causam o aborto de sementes, mas quando transmitidos pelo embrião, podem provocar redução da viabilidade, especialmente em leguminosas. Os vírus podem também provocar alterações morfológicas e descoloração das sementes, reduzindo o valor qualitativo dessas.

Algumas espécies do nematóide Anguina produzem galhas nas espigas de trigo, cevada e outras gramíneas. As galhas são produzidas principalmente a partir de botões florais não diferenciados, sendo o grão da espiga substituído por galhas.

De um modo geral, a ação bioquímica de microrganismos sobre o hospedeiro baseia-se em três atividades distintas, as quais podem atuar isoladamente ou em conjunto no processo de desenvolvimento de uma doença. Essas atividades estão relacionadas com a ação enzimática na degradação da parede celular do tecido vegetal, com anormalidade do hospedeiro decorrente da produção de hormônios de crescimento e com a produção de toxinas, as quais irão causar decomposição dos tecidos vivos, redução do crescimento radicular, aumento da taxa respiratória e interferência no metabolismo normal de aminoácidos.

A maioria dos danos provocados por microrganismos às sementes traz, como consequências, variações significativas quanto ao peso, forma e coloração das sementes. Desta forma, deve-se adotar métodos apropriados de beneficiamento de sementes, como utilização de máquinas adequadas e perfeitamente ajustadas, cujo objetivo é a eliminação desses fatores do lote de sementes. Quando se planeja produzir sementes de alta qualidade, é indispensável à adoção de medidas preventivas e/ou curativas, visando minimizar as perdas decorrentes da incidência de microrganismos. O mau controle fitossanitário é bastante comprometedor, não apenas em termos de rendimento ou de qualidade final do produto, mas também por permitir que o problema persista geração após geração, fazendo com que grandes investimentos sejam necessários para evitar frustrações de safras.
 
4. TESTES DE SANIDADE DE SEMENTES

4.1. Princípios

Um teste, para ser utilizado de forma rotineira pelos laboratórios de análise sanitária de sementes, deve atender a cinco objetivos fundamentais:

a) os resultados obtidos no teste de sanidade devem ser precisos, oferecendo resultados compatíveis com os observados a campo;

b) os resultados obtidos no teste de sanidade devem ser facilmente reproduzíveis; isso é conseguido quando se tem uma metodologia muito bem definida e avaliada, fazendo com que o teste seja facilmente aplicável e interpretado;

c) o teste de sanidade deve ser suficientemente sensível a ponto de permitir a detecção de baixas porcentagens de infecção atendendo, em especial, aos padrões estabelecidos no programa de produção de sementes;

d) o tempo e o trabalho dispensados na execução e avaliação dos testes de sanidade, bem como os materiais e equipamentos, devem manter-se dentro de limites economicamente aceitáveis;

e) os resultados alcançados em testes de sanidade que necessitem incubação das sementes devem ser obtidos no mais curto período de tempo possível; isso é necessário tanto para o remetente da amostra como para o próprio laboratório. A escolha de uma ou outra metodologia para a avaliação da qualidade sanitária das sementes está na dependência, especialmente, da finalidade de sua aplicação e dos objetivos a serem alcançados, estando diretamente relacionada com a política que normatiza o desenvolvimento e execução do programa de sementes.

4.2. Objetivos

Podemos dizer que os testes de sanidade têm aplicação prática em todas as fases do programa de produção de sementes, sendo importantes para:

4.2.1. Serviço quarentenário

Com a finalidade de verificar a observância dos padrões fitossanitários estabelecidos pelo país importador, todo o material vegetal propagativo deve ser avaliado no intercâmbio internacional. Essas medidas visam a evitar a entrada de microrganismos indesejáveis (quarentenários) não existentes no país importador ou, se existentes, mantidos sob condições de extremo controle. Para a detecção de fungos, as análises realizadas envolvem testes como em papel filtro e até técnicas mais demoradas, como o método de sintomas em plantas em crescimento. Para a detecção e identificação de viroses e bacterioses, tem-se buscado a utilização, quando possível, de técnicas bastante sensíveis, como métodos sorológicos (ELISA, PCR).

4.2.2. Serviço de certificação de sementes

A adoção de padrões fitossanitários é uma medida que ajuda o serviço de certificação a obter lotes livres de patógenos, com reflexos significativos na redução do potencial de inóculo de determinados patógenos, em vários cultivos. Para o serviço de certificação, os testes a serem utilizados devem possuir um amplo espectro, permitindo a detecção do maior número possível de patógenos, tendo obviamente a sensibilidade necessária para atender os padrões existentes. Testes com inoculação, exame em placas de Agar e teste em papel filtro podem ser utilizados.

4.2.3. Determinação do valor para a semeadura

Quando se busca avaliar o valor das sementes para a semeadura, o teste de sanidade assume o mesmo objetivo do teste de germinação. Em alguns testes, como o de papel de filtro, sintomas em plântulas e em plantas em crescimento, as condições de incubação são favoráveis para o desenvolvimento do patógeno e também para a germinação das sementes. Entretanto, altas correlações entre os dados de laboratório com os de campo nem sempre são obtidas. Isso é devido ao fato da ocorrência de uma série de fatores adversos não controláveis do ambiente. O teste de sanidade a ser utilizado para atender a esse objetivo deve não apenas determinar a presença ou a ausência de patógenos, mas também determinar a influência dos mesmos sobre a germinação e o desenvolvimento das plântulas. Testes como o de papel de filtro, meios de cultura e crescimento de plântulas podem ser utilizados.

4.2.4. Recomendação do tratamento de sementes

Os resultados de testes de amplo espectro, como o teste em papel de filtro, o teste em meio seletivo ou o método de sintomas em plântulas oferecem três alternativas quanto à possibilidade de uso das sementes: semeá-las sem tratamento, semeá-las depois de tratadas ou não semeá-las, destinando-as para outro fim.

4.2.5. Determinação da eficiência do tratamento de sementes

Testes como o de papel de filtro e os com meios seletivos permitem determinar com segurança se o tratamento de sementes foi eficiente ou não na erradicação dos patógenos. Não se deve esquecer de que esses testes não podem ser aplicados para patógenos parasitas obrigatórios.

4.2.6. Determinação da qualidade das sementes armazenadas e do valor nutritivo dos grãos

Métodos que permitam a detecção de patógenos produtores de toxinas, as quais exercem efeito negativo sobre a saúde humana e animal, devem ser utilizados na avaliação da qualidade do material armazenado. Alem da determinação da presença desses microrganismos, o grau de umidade também deve ser monitorado. Teste em meio de cultivo, como o Batata-Dextrose-Agar (BDA), com a adição de 18% de cloreto de sódio, é muito eficiente para a detecção de fungos de armazenamento, especialmente de Aspergillus spp. e Penicillium spp.

5.4.2.7. Determinação da mistura varietal

Testes de sanidade também podem ser utilizados como técnica auxiliar para a determinação da pureza genética de um lote de sementes. A inoculação de plântulas com isolados de microrganismos patogênicos permite a distinção de cultivares resistentes de cultivares suscetíveis, o que poderá contribuir para a determinação de mistura varietal.

 
José Luis da Silva Nunes
Engenheiro Agrônomo, Dr. em Fitotecnia

Bibliografia consultada
PESKE, S.T.; ROSENTHAL, M.D.; ROTA, G.R.M. Sementes: Fundamentos científicos e tecnológicos. 3ª edição. Pelotas: Editora rua Pelotas, 2012. 573p.




 
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