O milheto é um cereal cultivado em cerca de 26 milhões de hectares em regiões tropicais, concentrando-se no continente africano e na Índia. No Brasil, o milheto foi rapidamente adotado pelos produtores como a cultura de cobertura ideal para sistemas de produção em plantio direto da soja, apresentando hoje uma área cultivada de mais de 2 milhões de hectares.
O uso do milheto nesses sistemas explora o rápido crescimento vegetativo da planta, sua adaptação a solos ácidos e de baixa fertilidade e a habilidade de explorar o subsolo, reciclando nutrientes. Essas características, somadas à boa capacidade de rebrote e boa qualidade de forragem fazem do milheto ainda uma opção para uso como forragem em sistemas de integração lavoura-pecuária e na recuperação de pastagens degradadas. O grão pode ainda ser utilizado na alimentação humana e animal.
# Uso como cobertura
A cultura do milheto passou a ter destaque no Cerrado quando começou a ser utilizada no sistema de semeadura direta (SD) como planta de cobertura. Sua utilização como planta de cobertura explora a grande produção de massa e o rápido crescimento vegetativo e sua palhada tem sido fundamental para o sucesso da semeadura direta. A geração de grande quantidade de matéria verde proporciona vantagens expressivas no sistema agrícola como um todo, podendo ser citadas a diminuição das variações de temperatura e umidade do solo, a manutenção da matéria orgânica do solo em sistemas com soja, a proteção contra erosão e reciclagem de nutrientes.
A produção de palhada melhora ainda a eficiência no controle de ervas daninhas, contribuindo para a diminuição do uso de herbicidas. O milheto tem sido cultivado em duas épocas: após a cultura de verão e no final do inverno/início da primavera.
No final do verão, é cultivado após a colheita da cultura principal, de fevereiro a final de março, dependendo da região. Pode ser cultivado mecanicamente em linhas, com espaçamento entre 40 e 70 cm e com uma densidade de plantas em torno de 300 a 500 mil plantas/ha, o que equivale a aproximadamente de 10 a 15 quilos de sementes/ha. Outra opção é plantar a lanço, incorporando as sementes com uma gradagem leve, gastando-se, nesse caso, cerca de 30 quilos de sementes/ha. Nesse tipo de sistema, geralmente, deixa-se a cultura completar o seu ciclo, podendo-se colher sementes para uso na safra seguinte ou deixando-se cair as sementes para, nas primeiras chuvas, em setembro/outubro, essas sementes germinarem para formação da palhada.
Outro sistema consiste no plantio no final do inverno/início da primavera, antes do cultivo da cultura principal. Nesse caso, o plantio é realizado “no pó” ou logo após as primeiras chuvas, em setembro/outubro, dependendo da região. Nesse sistema, o milheto é dessecado logo após a emissão das primeiras panículas, aos 40-45 dias, cultivando-se assim a cultura principal, normalmente a soja. Deve-se usar uma dosagem de 1 a 1,5 litro/ha de herbicida glyphosate. A produção de palhada tem alcançado valores de 5 a 15 t/ha de matéria seca, dependendo da região e do nível de fertilidade do solo, pois, em geral, não se aduba o milheto no plantio, ultilizando-se a adubação residual da cultura principal.
# Uso como forragem ajuda a recuperação de pastagens
O milheto é também uma opção para uso como forragem, tendo em vista seu excelente valor nutritivo, podendo atingir em torno de 24% de proteína bruta sob pastejo, boa palatabilidade e digestibilidade (60 a 78%). Tem um alto potencial produtivo de forragem, podendo alcançar até 60 t/ha de massa verde e 15 t/ha de matéria seca. Quando utilizado como forragem, pode proporcionar ganhos de peso substanciais para animais.
Como planta forrageira, o milheto é cultivado após a colheita da cultura principal, para ser utilizado em pastejo do outono até o início do inverno, possibilitando a vedação de parte das pastagens perenes da fazenda para serem utilizadas de julho a setembro, quando ocorre a maior deficiência de forragem no Brasil Central.
O plantio e a população de plantas são similares aos utilizados como planta de cobertura e o pastejo deve ter início na emissão das primeiras panículas ( em torno de 45 dias), quando o milheto apresenta boa massa e qualidade de forragem. Deve ser pastejado por um período de 40 a 60 dias até quando houver rebaixamento para 20 a 30 cm do solo, devendo-se dar um período de descanso de 18 a 24 dias. No início do pastejo, deve-se utilizar maior carga animal, variando de 3 a 5 animais/ha, e, no fim do período de pastejo, a carga animal será menor, em torno de 1 a 2 animais/ha.
O tempo de utilização do milheto em pastejo no Brasil Central pode variar de 30 a 150 dias, dependendo principalmente da época de semeadura, manejo, estado nutricional e condições climáticas.
Outra excelente opção de uso do milheto é na implantação e recuperação de pastagens, principalmente para forrageiras do gênero Brachiaria, tais como B. brizantha e B. decumbens. Nesse sistema, faz-se a semeadura da braquiaria consorciada com o milheto no início do período das águas, o que proporcionará um período de pastejo que poderá variar de 80 a 120 dias. Após o ciclo vegetativo do milheto, a pastagem estará formada ou recuperada.
# Alimentação animal e humana
Os resultados de experimentos com ração indicam que o milheto é pelo menos equivalente ao milho e, de um modo geral, superior ao sorgo, em teor e qualidade de proteína, além de ter um melhor perfil de aminoácidos do que o milho e também razões de eficiência relativa da proteína (ERP) e níveis de energia metabolizável (EM) superiores.
A maior parte do potencial do milheto como grão para ração é para uso como ração para aves. Embora seu uso como grão, no Brasil, ainda seja pequeno, devido a aspectos relacionados à estabilidade na oferta de grãos, o grão do milheto apresenta boa qualidade, o que demonstra seu grande potencial de uso. Quanto à sua utilização na alimentação humana, apesar de ser largamente utilizado em países da Africa e na Índia, ainda é muito pouco utilizado em nosso País.
As variedades de milheto mais utilizadas no Brasil são a BRS 1501 e a BN-2. Ambas apresentam bom potencial de produção de palhada e boa qualidade de forragem, com ciclo de cerca de 45 dias até a emissão das primeiras panículas. As pesquisas vêm sendo realizadas pela Embrapa Cerrados e Embrapa Milho e Sorgo e, futuramente, novas variedades estarão disponíveis no mercado.
Austeclínio Lopes de Farias Neto é Agrônomo. Fone (61) 388 9954. E-mail: [email protected]