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O governo eleito e os riscos ao agronegócio - parte II



Sandro Schmitz dos Santos

Dando sequência ao artigo iniciado na semana anterior irei analisar algumas falas do então candidato Luis Inácio Lula da Silva quando o mesmo falou de forma direta sobre o agronegócio. As falas, além de temerárias denota um severo comprometimento com políticas econômicas que já provaram ser fracassadas sempre que foram implementadas em algum país.

Em 10 de setembro de 2022, em Taboão da Serra afirmou que: “Eu quero é que vocês possam entrar no açougue e comprar carne. Por isso nós vamos ter que discutir o preço da carne nesse país. Nós vamos discutir se vai continuar só exportando ou se vai deixar um pouco para nós comermos”. Em mais de um momento o candidato fez referência a possibilidade de taxar a exportação do agro, uma medida totalmente danosa a economia do país sob vários aspectos.

Nosso país possui o Imposto sobre Exportação [IE] que possui natureza extrafiscal e é utilizado como instrumento de controle sobre a venda de produtos ao exterior. Ao afirmar que: “nós vamos discutir se vai continuar só exportando ou se vai deixar um pouco para nós comermos”, o Presidente eleito afirma o interesse em implementar tal imposto ao agronegócio. Essa afirmativa denota não apenas desconhecimento do agronegócio brasileiro, como também o total desconhecimento da extrema nocividade dessa medida na economia.

Em um primeiro momento é preciso notar o efeito nocivo mais gravoso sobre a economia: a perda de área plantada. Nosso vizinho, a Argentina adotou essa medida e os efeitos foram desastrosos, pois apenas no primeiro ano após a adoção dessa iniciativa sua produção agrícola e na pecuária caiu em torno de 30%, causando mais restrição alimentar e aumento de preços por redução da oferta.

Todavia, houve um efeito secundário não percebido pelos dirigentes do país. Ao exportar o vendedor dos produtos recebe em dólares dos Estados Unidos que, em função da entrada desses dólares reduz o preço interno da moeda. Ao reduzir a oferta de dólares, sendo que a demanda permanece a mesma temos um aumento substancial do preço do dólar em território nacional. Ocorreu na Argentina, se aplicada aqui irá ocorrer no Brasil também.

Mas, existe um outro efeito na redução de oferta de dólares dos Estados Unidos, e, consequente aumento de preços: o efeito Pass-through. O denominado efeito Pass-through é o tamanho do repasse das variações cambiais para os preços. Em síntese, havendo o aumento do preço do dólar esse aumento é repassado para todos os produtos que sejam importados, resultando em um aumento de custos, e, por consequência aumento de preços.

Em sentido contrário, caso a variação cambial reduza o preço da moeda, irá ocorrer a redução de custos, e, como resultado irá provocar a redução dos preços dos produtos. É necessário observar que, por ser um efeito direto na moeda, esse efeito provoca inflação, o que não ocorre na oferta/demanda de produtos que provoca aumento ou redução de preços por elasticidade.

A inflação é provocada pelo fato que o governo tende a interferir na relação cambial, pois havendo uma queda brusca por falta de dólares o governo irá tender a vender dólares para o mercado para tentar equalizar a relação cambial. Ao tomar essa atitude torna a posição das reservas mais vulnerável a choques externos. Outra opção, é comprar dólares no exterior para venda no mercado interno, o que gera dívida para União e aumenta a dívida pública. As formas mais usuais para se financiar pode ser de três formas: a venda de títulos de dívida, aumento de impostos ou impressão de moeda. Todas geram inflação.

Além de afetar diretamente o agro, visto que cria incentivos a redução de produção e possíveis redução de áreas plantadas, promovendo um êxodo rural acentuado. Em outras palavras, a medida só irá provocar mais fome e aumento de preços. Quando afirmo que essa proposta denota desconhecimento do agro ao afirmar se vamos exportar ou deixar um pouco para nós.

A exportação do agro brasileiro responde por 48% das exportações totais brasileiras, sendo que utilizamos, em média, 86% do arroz produzido fica no país, sendo exportado apenas 14%, no caso do café exportamos 22%, ficando no país 78%, e, apenas a soja exportamos mais do que mantemos, pois exportamos 52%, e, ficamos com 48%, ainda assim, é uma diferença muito pequena. Qualquer conhecedor mediano dos números sabe que a esmagadora maioria da produção fica no país. Todos esses dados são da EMBRAPA.

Em relação a tão comentada carne o número de exportação de carne em nosso país é de 22.7%, ou seja, foi destinada ao consumo interno 87.3% da produção no país. E, para aqueles que afirmam que o agronegócio brasileiro sacrifica excesso de animais é preciso ressaltar que, de acordo com o IBGE, hoje o rebanho bovino do país é de 224,6 milhões de cabeças, sendo que são abatidos apenas 6.95 mil cabeças/ano, ou, em outras palavras, são abatidos 4.31% do rebanho nacional. Assim sendo, existem vários fatores que provocam o aumento de preço dos alimentos, mas esses não são provocados pelo agronegócio.

Em comício realizado em Porto Alegre/RS em 16 de setembro o candidato disse: "(Eles) sabem que vai acabar essa história de invadir a Amazônia, que vamos preservar aquele território, que não dá pra deixar invadir os biomas brasileiros. Sabem que a gente não vai deixar mais ter garimpo em terra indígena, não vai deixar mais desmatar e cortar madeira para vender de forma ilegal. A gente vai cuidar da questão climática com muito mais carinho que cuidamos da outra vez". No primeiro artigo já falei da relação agronegócio/meio ambiente, nesse momento irei analisar essa fala.

Aqui o presidente eleito estabelece uma relação espúria entre o agronegócio e quem desmata, realiza garimpo e corta ilegalmente madeira. O verdadeiro agronegócio de nosso país é um dos maiores agentes de preservação ambiental do planeta, até mesmo porque o produtor rural depende diretamente da terra para produzir, e, portanto tem o maior interesse em cuidar e preservar sua terra.

As pessoas a que o então candidato se referiu, não são produtores rurais, são criminosos e devem sofrer a mais severa persecução criminal, assim como serem punidos exemplarmente. Não há qualquer apoio do agronegócio nacional a este tipo de atividade ilegal. Este tipo de discurso, além de mentiroso, é claramente populista, induzindo a população a erro e servindo apenas para ocultar os verdadeiros criminosos. É essencial que esse tipo de mentira seja elucidado o mais rápido possível e os verdadeiros criminosos sejam levados a justiça.

Na primeira e única versão registrada do Plano de Governo do presidente eleito consta uma frase preocupante para o agronegócio, a saber: “Agregar valor à produção agrícola, com regulação e a constituição de uma agroindústria de primeira linha”. Poucas frases são tão assustadoras quanto essa, pois engloba dois grandes males históricos dos governos anteriores do PT: regulação, e, política de campeões nacionais.

A primeira parte da frase é risível, pois fala em agregar valor a produção agrícola do país. Existem dois fatos que surgem as claras nesse tipo de afirmação: primeiro, nosso agronegócio já agrega muito valor a seus produtos, não por acaso nos tornamos o maior produtor mundial do agro; e, segundo, nunca na história de governos tecnocratas governamentais conseguiram agregar valor a produção, o máximo que fizeram foi agregar custos.

É simples explicar isso, jamais um grupo de tecnocratas irá conseguir ter o arcabouço de conhecimento necessário para atender as demandas do agronegócio como um todo. Adicionamos a isso que muitos que pretendem agregar valor ao agro jamais entraram em uma propriedade rural, e, tampouco imagina o trabalho realizado pelo produtor, sendo impossível conseguirem agregar qualquer coisa ao agronegócio.

E, neste caso sempre é bom lembrar Hayek quando afirma que o conhecimento é disperso, portanto nenhum grupo pode ter melhor resultado que o conhecimento que o mercado pode buscar em todos os seus agentes. Apenas o desconhecimento de economia pode justificar essa primeira parte da frase. Mas, não contentes com esse péssimo início, continuaram a redação.

Na sequência falam em regulação como meio de agregar valor. Não existe hipótese disso acontecer, pois ao aumentar a regulação se aumentam os custos com consequência direta ao consumidor. Além disso, a depender da regulação podemos ter duas consequências possíveis: o abandono de certas culturas ou o aumento de risco operacional. A segunda lição de economia é que a economia vive sobre incentivos, ao retirarmos um incentivo positivo ou ao criarmos um custo significativo estamos induzindo o produtor a buscar alternativas que lhes sejam mais lucrativas ou menos onerosas.

A propósito, a primeira lei da economia é que trabalhamos com recursos escassos para necessidades infinitas, mas como já foi dito anteriormente, essa lei é sempre ignorada por políticos. Já o aumento de risco operacional provoca um aumento de custos, pois ao gerar essa nova exigência se cria uma nova barreira a comercialização do produto o que irá onerar o produtor ao buscar recursos para plantar sua safra. Isso pode levar a redução ou abandono da cultura a ser plantada.

A última parte da frase fala em constituir uma agroindústria de primeira linha. Parece muito com o discurso de campeões nacionais. Além de ignorar o fato de que nossa agroindústria já é de alta qualidade e vem melhorando a cada ano. Também não podemos esquecer que esse discurso aplicado a outros setores promoveu os campeões nacionais, destruiu a concorrência, criou grupos específicos junto ao governo e favoreceu a corrupção. Em síntese, não trouxe qualquer benefício ao país. A história recente comprova que esse tipo de política trouxe apenas prejuízo e perda de credibilidade a nosso país.

Com essa última análise realizada chegamos ao fim desses dois artigos sobre os riscos detectáveis até o momento para nosso agronegócio. Apesar do discurso de que pretendem reduzir a fome no país e com base em uma sequencia de atos de desinformação divulgadas durante a campanha fica evidente a qualquer pessoa minimamente racional que qualquer das medidas ditas em campanha irá provocar um severo dano ao agronegócio no país e a economia como um todo. Mas, o pior é que no médio e longo prazo irá apenas agravar a fome para a população e aumentar os preços dos produtos. Exatamente o contrário do que foi prometido.

 

 

 

 

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