Embora prevista inconstitucionalidade na Lei Geral do ICMS, a cobrança ainda prevalece há décadas nos Estados. Os proprietários podem recorrer dos valores pagos.
Até hoje, o pecuarista que desejar transportar 50 cabeças de gado de uma fazenda em São Paulo à outra no Paraná, por exemplo, pagará o ICMS sobre o transporte. Isso em todo o país. Até aí, tudo bem, mas, e se as propriedades pertencerem ao mesmo dono? É correta a incidência deste imposto?
Se você respondeu que não, então, pensa igual aos pecuaristas de todo Brasil, que pagam o ICMS a cada viagem que fazem com seu gado, mesmo que a intenção seja apenas “reforçar” a criação em outra fazenda de sua propriedade.
O que diz a lei, afinal?
Desde abril deste ano, o debate vem tomando conta das discussões no STF entre os ministros, que passaram a entender a incidência do imposto nestas circunstâncias como inconstitucional.
Pela Lei Geral do ICMS 87/1996, apelidada como Lei Kandir, a incidência deste imposto sobre o transporte de gado para as propriedades do mesmo dono é inconstitucional.
Afinal, se o gado será levado de uma propriedade à outra, sendo ambas do mesmo dono e sem comercialização, por que tem que ser cobrado o ICMS?
O ICMS é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Se não se trata de uma mercadoria - porque não houve transação e nem tão pouco uma prestação de serviço, o pecuarista está isento.
A incidência do imposto, no entanto, sempre aconteceu sobre os deslocamentos de gado entre propriedades do mesmo dono, em razão de haver a possibilidade de cobrança nas leis estaduais. Nestes casos, então, o fisco permanecia cobrando o imposto de pecuaristas em todo o país - o que gerava diversas reclamações e manifestações de protesto.
O que diz o Supremo?
O Supremo entende que, para que haja a incidência deste imposto, é preciso que a mercadoria tenha o sentido de ser comercializada de um Estado para outro. Nesta situação, a incidência de ICMS estaria de acordo com a lei. Porém, quando se trata de propriedades do mesmo produtor rural, não existe relação mercadológica e portanto, a incidência é ilegal.
Contudo, não basta apenas “dizer” que vai transferir o gado para a propriedade e “está tudo bem!”. É preciso que o produtor apresente documentos comprovando ser realmente o dono da propriedade; que comprove que nesta propriedade há atividade relacionada ao agronegócio e que apresente também a finalidade para a qual está levando o gado de uma região à outra - por exemplo, obter uma performance melhor da propriedade.
Isto, para que também não haja o risco de uma simulação de imposto (visando taxas menores) ou fraude.
E os Estados, aceitam a decisão?
Não, os Estados, por sua vez, entraram com pedido de “embargos de declaração”, ainda pendentes de julgamento. No entanto, a probabilidade é de que o STF não leve em consideração o pedido e mantenha sua posição diante do exposto pela lei Geral.
A pecuária no Brasil é um importante fator econômico no agronegócio do país, que já corresponde a 26% do PIB. As margens de lucro e investimento na área, no entanto, já são bem apertadas, sendo necessário que todo pecuarista lesado com incidência de ICMS procure um escritório contábil e jurídico, fazendo valer o seu direito de reaver os valores pagos - de abril até o momento.
Só assim, o agronegócio poderá se desenvolver mais e melhor.
Dr. Caius Godoy (Dr. Da Roça) é sócio na AgroBox Agronegócios e Mariadita Senepol Jaguariúna.
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