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Inovação no Brasil: Por Que as Grandes Ideias Morrem?



Augusto Ichisato

Inovação no Brasil: Por Que as Grandes Ideias Não Chegam ao Mercado de Massas?

Uma análise crítica sobre os entraves à inovação e ao empreendedorismo no Brasil com base em Schumpeter


Introdução: O motor emperrado da inovação brasileira

O economista Joseph Schumpeter definiu a inovação como o verdadeiro "motor do capitalismo". Em sua visão, o crescimento econômico depende fundamentalmente da chamada "destruição criativa", em que produtos e processos antigos são continuamente substituídos por novos e mais eficientes.

Porém, no Brasil, dados recentes revelam que esse motor parece ter perdido força. Segundo a Pesquisa de Inovação (Pintec 2023), divulgada pelo IBGE em 20 de março de 2025, apenas 64,6% das indústrias brasileiras realizaram algum tipo de inovação em produtos ou processos, uma queda significativa em comparação aos 70,5% registrados em 2021.

A pergunta que surge é clara: por que tantas inovações promissoras ficam restritas a nichos, sem alcançar escala no mercado de massas?


Inovação para Schumpeter: lucratividade e escala como essenciais

Para Schumpeter, a inovação só é relevante se gerar lucro e conseguir difundir-se amplamente na sociedade, impulsionando transformações econômicas e sociais. Porém, no contexto brasileiro, três grandes obstáculos impedem essa escalabilidade:

1. Regulamentação Excessiva e Lentidão Burocrática

O processo regulatório no Brasil é frequentemente apontado como um dos maiores entraves à inovação. Setores como alimentos e medicamentos ilustram claramente esse cenário: a aprovação de novos ingredientes alimentícios pela Anvisa pode levar até cinco anos, enquanto países como Estados Unidos e União Europeia têm processos muito mais ágeis, muitas vezes aprovando produtos similares em poucos meses.

Exemplos recentes mostram startups brasileiras de proteínas alternativas (como carne cultivada e alimentos à base de cogumelos) enfrentando enormes barreiras regulatórias. Esses atrasos impedem o rápido acesso ao mercado e afastam investidores interessados em inovação, prejudicando a competitividade nacional.

2. Baixo Poder Aquisitivo e Dificuldade de Escala

Outro grande fator que limita a inovação no Brasil é o baixo poder aquisitivo da população, que dificulta a adoção em massa de produtos inovadores, geralmente mais caros em suas fases iniciais.

Por exemplo, alimentos "plant-based" e proteínas alternativas têm preços frequentemente três vezes superiores aos produtos convencionais. Dados do Euromonitor apontam que apenas cerca de 8% dos brasileiros consomem regularmente esses produtos, enquanto na Europa esse percentual já ultrapassa 25%. Dessa forma, muitos produtos inovadores acabam restritos a nichos socioeconômicos específicos e têm dificuldade em escalar suas vendas.

3. Falta de Apoio às PMEs e Dificuldade de Crédito

As pequenas e médias empresas (PMEs), responsáveis por aproximadamente 70% dos empregos no Brasil, têm grande potencial inovador. Entretanto, frequentemente enfrentam dificuldades para obter financiamento e apoio institucional suficiente para levar suas inovações do laboratório ao mercado.

As grandes empresas (com mais de 500 funcionários) inovam mais frequentemente (73,6%), segundo a Pintec. Porém, suas inovações tendem a ser incrementais, ou seja, melhorias pontuais em produtos já existentes. As inovações disruptivas, aquelas capazes de criar novos mercados e redefinir setores inteiros, geralmente surgem em startups ou pequenas empresas, que no Brasil raramente recebem o suporte necessário para atingir o mercado de massas.


Casos práticos: Exemplos de inovação estagnada

  • Carne cultivada: Apesar de grandes investimentos da JBS e outras empresas brasileiras na ordem de centenas de milhões de reais, o produto ainda não possui regulamentação clara no Brasil, enquanto já é comercializado em Cingapura e nos Estados Unidos.

  • Bebidas funcionais (kombuchas e águas enriquecidas): Apesar de um crescimento anual médio de 20%, ainda são consumidas regularmente por menos de 5% da população brasileira, permanecendo presas a um nicho reduzido.

  • Agtechs (startups do agro): Cerca de 40% das startups de agricultura digital brasileiras fecham as portas antes de atingir escala devido à falta de conexão com grandes distribuidores e problemas de acesso a crédito.

Esses exemplos revelam claramente as dificuldades que as inovações enfrentam ao tentar saltar da fase inicial para uma escala realmente significativa no mercado brasileiro.


Propostas para Destravar a Inovação no Brasil

Embora Schumpeter defenda que o mercado tende a se autorregular, no Brasil a intervenção estratégica pode ser necessária para superar os obstáculos existentes. Algumas possíveis ações são:

1. Regulatory Sandboxes:
Implementar ambientes regulatórios controlados (como feito no Reino Unido e Cingapura) permitiria testar novos produtos rapidamente, sem a necessidade de uma regulamentação completa prévia. Isso aceleraria o ciclo de inovação e permitiria ajustes rápidos com base no feedback do mercado.

2. Incentivos fiscais e financeiros:
Criar incentivos específicos para empresas inovadoras que consigam escalar produtos. Por exemplo, isenções fiscais para empresas que superarem determinado volume de vendas anuais, ajudando a reduzir o preço dos produtos inovadores e aumentar sua acessibilidade.

3. Conexão com grandes varejistas:
Desenvolver programas públicos e privados (como parcerias com grandes redes supermercadistas) para que pequenas empresas e startups consigam distribuir seus produtos em larga escala, facilitando o acesso do consumidor final e permitindo o teste real do mercado.


Conclusão: Inovação sem venda é apenas curiosidade acadêmica

Schumpeter tinha razão: para que uma inovação seja realmente inovadora, ela precisa gerar vendas e lucro, promovendo crescimento econômico. Ideias que permanecem restritas ao meio acadêmico ou pequenos nichos não conseguem transformar a economia nem gerar riqueza em escala.

O Brasil possui criatividade e capacidade técnica em abundância. No entanto, precisa urgentemente de um ambiente regulatório mais ágil, melhores condições econômicas para consumo de produtos inovadores e mecanismos de incentivo claros para que suas startups possam finalmente transformar grandes ideias em negócios lucrativos e sustentáveis.

Para isso, é essencial que o país supere os desafios burocráticos e econômicos, permitindo que a inovação volte a ser o motor do crescimento econômico, como Schumpeter já havia vislumbrado há quase um século.

 

Augusto Ichisato - FoodBrasil | O Seu Engenheiro de Alimentos

@_FoodBrasil

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