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O sofisma do abastecimento alimentar


Decio Luiz Gazzoni
Algumas informações divulgadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) na década passada causaram-me espécie. Expus minha curiosidade neste e em outros espaços onde escrevo, e não obtive resposta até hoje. A primeira dúvida dizia respeito à produção das áreas de assentamento que, de acordo com o volume de assentados em 2007 deveria ser de, aproximadamente, 193 milhões de toneladas (MT) além do que já produzíamos. Em valores de hoje significaria que o Brasil produziria mais de 400 Mt de grãos, em 2015 (vamos produzir menos de 200). A coluna Cadê a Produção? foi publicada em 08/11/2007 (http://www.gazzoni.eng.br/pagina25.htm#cad).

Em 2009, nova afirmativa do MDA de que a área assentada atingira 63 milhões de hectares (Mha). Como toda a área de grãos do Brasil, à época, não chegava a 50 Mha, fui verificar os números do censo, e a área agrícola total havia diminuído 5% entre 1995 e 2006. Diminuído! Logo alguma coisa estava muito errada: já não havia produção e agora não havia sequer área nova sendo trabalhada, mesmo com produção zero. A coluna Cadê a Área? foi publicada em 12/11/2009 (http://www.gazzoni.eng.br/pagina34.htm).
Agora o Dr. Rodofo Hoffmann, veterano professor da ESALQ/USP chama a atenção para outro fato, novamente relacionado à uma divulgação do MDA em que afirma que 70% dos alimentos na mesa dos brasileiros viriam da agricultura familiar (www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2011/07/agricultura-familiar-precisa-aumentar-vendas-e-se-organizar-melhor-diz-secretario). O Dr. Hoffmann, usando os dados do IBGE, do censo de 2006 (produção agrícola), e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2008/09 (consumo de alimentos pelos brasileiros), chegou a outro número radicalmente diferente: a agricultura familiar contribui com 21,4% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros.

Senhoras e senhores, agricultura familiar, dignidade, justiça, desenvolvimento e progresso no campo, são conceitos assimilados pelo povo brasileiro. Não precisamos usar números que não correspondem à verdade para ressaltar a importância da agricultura familiar. Ou o objetivo dos números distorcidos seria justificar outra coisa, cuja compreensão não alcanço?
 
O autor é Engenheiro Agrônomo. www.gazzoni.eng.br

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