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O que os agricultores mais REIVINDICAM nem sempre é o que eles mais NECESSITAM


Polan Lacki
Se os agricultores me pedissem sugestões para resolver seus crônicos problemas eu lhes diria algo muito diferente do que eles estão acostumados a ouvir. Em primeiro lugar lhes recomendaria que não continuem esperando que os problemas da agricultura serão solucionados pelos seus governos através de créditos abundantes e baratos, subsídios, redução de impostos e pedágios, melhor cotação do dólar e garantias oficiais de comercialização de suas colheitas; e lhes insinuaria que se o crédito rural fosse tão eficaz não teríamos tantos agricultores tão endividados. Em segundo lugar lhes sugeriria que considerem como muito remotas as probabilidades de que os governos dos paises ricos deixarão de subsidiar e proteger os seus agricultores; porque eles têm poderosas razões internas, além de muitos dólares, euros e yens, para continuar fazendo-o. Em terceiro lugar mencionaria que estas duas ajudas externas às suas propriedades, embora desejadas, não são tão imprescindíveis como os agricultores imaginam; pois existe uma outra ajuda, ou melhor dizendo, uma auto ajuda, que produz resultados econômicos muito mais eficazes com a vantagem de que não são efêmeros nem esporádicos e sim permanentes e até definitivos.

Concluiria as minhas sugestões dizendo que eles necessitam tornar-se tão eficientes e profissionalizados a ponto de prescindirem das ajudas paternalistas dos seus governos e de serem menos vulneráveis aos subsídios e às medidas protecionistas adotados pelos países ricos. Afirmaria, com extrema honestidade e franqueza, que os próprios produtores rurais terão que solucionar os seus problemas e que deverão fazê-lo, corrigindo ou eliminando as suas próprias ineficiências. Diria categoricamente que a globalização dos mercados (estejamos de acordo com ela ou não) está impondo aos nossos agricultores os seguintes desafios, reais e concretos:

a) os produtores rurais ineficientes simplesmente não sobreviverão na agricultura; e não sobreviveriam mesmo que lhes fossem proporcionadas as duas ajudas externas analisadas no primeiro parágrafo deste artigo;

b) sobreviverão economicamente apenas os agricultores muito eficientes. Assim considerados como aqueles que sejam capazes de adotar de maneira correta a maioria das seguintes medidas tecnológico-produtivas, gerenciais, organizacionais e comerciais:

1) Incrementar os rendimentos por unidade de terra e de animal para reduzir os custos por quilo produzido;
2) Diversificar as espécies cultivadas e integrá-las com a produção pecuária para reduzir a excessiva e às vezes desnecessária dependência do crédito rural; e também para evitar riscos de pragas, de clima e incertezas de mercado; o milho, o sorgo, a soja, a mandioca e a alfafa que eles colhem nas suas propriedades não deveriam vendê-los ao primeiro intermediário e sim deveriam "vendê-los" às suas próprias vacas, galinhas, frangos e suínos com a finalidade de reduzir os custos das rações balanceadas;

3) Realizar a reconversão produtiva substituindo espécies menos rentáveis por outras mais rentáveis (diferenciadas, mais sofisticadas ou de maior densidade econômica): devido à globalização dos mercados é difícil que um pequeno agricultor possa sobreviver economicamente produzindo mandioca, algodão, milho, batata, feijão ou arroz;  especialmente se os vende tal como os colheu (sem adicionar valor) e se o faz ao primeiro intermediário que lhe compra diretamente na propriedade;
4) Melhorar a qualidade dos bens produzidos e, sempre que possível, submetê-los a um mínimo processamento inicial (limpeza, classificação, secagem/desidratação, fracionamento, etc.) visando obter melhores preços na comercialização e, especialmente;
5) Organizar-se com os seus vizinhos para realizar em conjunto e com menor intermediação a aquisição dos insumos, a comercialização das colheitas e a realização daqueles investimentos que, devido ao seu alto custo e baixa freqüência de utilização, economicamente não se justifica fazê-los individualmente.
Infelizmente muitos agricultores, mesmo que quisessem, não poderiam adotar estas medidas "eficientizadoras" do seu negócio agrícola porque não foram formados nem capacitados para saber e poder fazê-lo. Por esta razão, os produtores rurais deverão abandonar definitivamente as ingênuas utopias paternalistas que os mantém esperando por humilhantes migalhas governamentais; e, em substituição, deverão adotar uma atitude mais construtiva de organizar-se para exigir e participar ativamente na adoção e implantação de algumas medidas mais concretas, eficazes e definitivas que os emancipem das dependências e vulnerabilidades às quais estão submetidos na atualidade. Entre outras, as descritas a seguir:

1) A agricultura brasileira necessita, em caráter de prioridade e urgência, de algo que os agricultores quase nunca reivindicam: um renovado serviço de assistência técnica e/ou extensão rural - SATER. Renovado no sentido de que seja ágil, "desburocratizado", descentralizado em suas decisões e operações, "despolitizado" e, especialmente, muito eficaz na solução dos problemas concretos e cotidianos dos produtores rurais. Com tal fim deverá ser capaz de manter os seus extensionistas permanentemente no campo e dotá-los de conhecimentos e habilidades para que tenham real capacidade de ensinar aos agricultores algo tão elementar como o seguinte: o que e como os produtores rurais deverão fazer para que possam solucionar os seus problemas de maneira mais autônoma ou autárquica. Isto é, que possam resolvê-los sem depender das cada vez mais improváveis ajudas dos seus empobrecidos, burocratizados e inoperantes governos. No entanto, para que tal autonomia/emancipação seja possível, os extensionistas deverão estar realmente aptos a ensinar-lhes, em primeiro lugar, a identificar e a utilizar plena e racionalmente os recursos que os produtores rurais realmente possuem e, em segundo lugar, a aplicar de maneira correta tecnologias de baixo custo a fim de que sejam compatíveis com os escassos recursos que estão disponíveis nas suas propriedades. Muitos dos atuais extensionistas têm baixíssima produtividade porque permanecem burocratizando nos escritórios e nas poucas vezes que vão ao campo, difundem "receitas" para cuja adoção os agricultores não dispõem dos "ingredientes" necessários. Este renovado SATER deverá ser co-financiado pelo Estado e pelos integrantes das cadeias produtivas da agricultura; e deverá ser administrado por uma organização privada e sem fins de lucro, pertencente aos próprios integrantes das mencionadas cadeias. Deverá ser privado e "despolitizado" para que esteja imune às mudanças de governos e às perniciosas interferências político-partidárias na designação dos seus dirigentes e na execução dos seus programas. Entretanto, a fim de que este novo serviço seja realmente eficaz será necessário;

2) Capacitar os milhares de profissionais e técnicos em ciências agrárias, que estão desempregados ou trabalhando com baixíssima eficiência e produtividade, porque não possuem os conhecimentos nem as habilidades necessárias para corrigir os erros mais freqüentes que a maioria dos agricultores normalmente comete. É inaceitável que tenhamos tantos extensionistas desempregados ou improdutivos enquanto os produtores rurais não conseguem fazer uma agricultura rentável, exata e coincidentemente, porque lhes faltam os conhecimentos agronômicos, zootécnicos e veterinários que os referidos profissionais e técnicos deveriam proporcionar-lhes. Felizmente esta incoerência pode ser atenuada, através de uma medida emergencial de fácil execução e baixo custo, proporcionando-lhes uma capacitação eminentemente prática, a fim de que dominem as técnicas fundamentais de produção, administração rural e comercialização; e também os métodos e meios de extensão rural para que adquiram maior eficiência na difusão das suas recomendações aos agricultores e consigam que eles as adotem de maneira correta. Os capacitadores destes extensionistas deverão partir da premissa de que a grande maioria dos produtores rurais dispõem de recursos financeiros muito limitados para adquirir insumos de alto custo e para realizar investimentos. Devido a estas restrições, a capacitação deverá ser gradual ou paulatina, iniciando com aquelas medidas corretivas de baixo custo e mínima dependência de ajudas externas às suas propriedades. Através de cursos intensivos com 2 ou 3 meses de duração, eminentemente práticos, realizados diretamente nas propriedades eficientes, nas comunidades organizadas e nos mercados rurais, e adotando o método de "ensinar e aprender fazendo", será possível transformar profissionais desempregados e improdutivos em extensionistas eficientes e altamente produtivos. Depois que os agentes de extensão rural receberem esta capacitação gradual, as suas recomendações iniciais serão tão elementares e de tão baixo custo, que poderão ser adotadas por todos os agricultores, por mais escassos que aparentemente sejam os seus recursos produtivos. Estes extensionistas tecnicamente auto-suficientes, devidamente "renovados" e "energizados" dificilmente continuarão desempregados porque encontrarão muitos empregadores ávidos de contratar os seus úteis e produtivos serviços de assessoramento técnico. Entretanto, não é razoável que o SATER seja obrigado a corrigir, ano após ano, as ineficiências de formação das faculdades de ciências agrárias, tendo que capacitar os profissionais já formados em conhecimentos e habilidades que eles deveriam ter adquirido enquanto estavam realizando seus estudos universitários. Por este motivo se recomenda "cortar o mal pela raiz" adotando a sugestão descrita no próximo item;

3) Em boa medida o pragmatismo recomendado no item anterior para a capacitação dos extensionistas já formados, também deverá imperar na formação dos atuais estudantes das faculdades de ciências agrárias, porque elas estão formando profissionais tão teóricos que, reconhecida e categoricamente, estão sendo rechaçados pelos empregadores. As mencionadas faculdades devem reconhecer que o elevado desemprego dos seus egressos se deve muitíssimo mais a inadequada oferta dessas instituições educativas que à insuficiente demanda do mercado de trabalho; igualmente devem reconhecer que as oportunidades de emprego nos organismos público-estatais são cada vez mais limitadas. Por estas duas razões elas devem formar egressos com um perfil mais criativo, executivo, pragmático e empreendedor, pois são estas as "qualidades" que o grande empregador da atualidade (o setor privado) deseja encontrar nestes profissionais. Para formá-los com este perfil, as referidas faculdades deverão "desurbanizar-se" e oferecer uma formação mais prática e com maior vivência dos problemas cotidianos que ocorrem nos distintos elos do negócio agrícola; conseqüentemente a formação dos profissionais deverá ser realizada muito mais nas propriedades, nas comunidades e nos mercados rurais que nas salas de aula, nos computadores e nos laboratórios urbanos. Elas devem adotar o método de "ensinar e aprender fazendo" com a finalidade de estimular a criatividade e a engenhosidade tão necessárias aos engenheiros; e também com o objetivo de desenvolver as suas habilidades manuais que são necessárias para a eficiente execução (e demonstração aos agricultores) das práticas agronômicas, zootécnicas e veterinárias. Entretanto, não será suficiente formar e capacitar adequadamente os extensionistas se os seus futuros clientes/usuários/beneficiários (os alunos das escolas fundamentais rurais) continuarem recebendo uma educação de má qualidade e com conteúdos curriculares inadequados às necessidades imperantes na agricultura e nas comunidades rurais; pois o processo de ensino-aprendizagem será realmente eficaz e produtivo quando os extensionistas souberem ensinar e os agricultores souberem aprender. Para que ocorra esta sinergia entre educadores e educandos se requer a adoção da medida descrita no próximo item;

4) Efetuar uma profunda modificação nos conteúdos curriculares das escolas fundamentais rurais. Se elas são rurais deverão "agriculturalizar-se" e "ruralizar-se". Se recomenda extirpar dos seus programas o ensino "decoreba" dos conteúdos de escassa ou nula relevância para as necessidades de vida e de trabalho imperantes no campo (e também nos centros urbanos), como por exemplo: a história do Império Romano e Bizantino, a história de Luis XIV, Luis XV y Luis XVI, os faraós e pirâmides de Egito, os Jardins Suspensos da Babilônia, a história da Mesopotâmia, as guerras de Napoleão e de outros "heróis" de países longínquos, as altitudes do Everest e das Montanhas Rochosas dos EUA, a extensão do Rio Nilo, etc. Em vez de ensinar sobre o Rio Nilo estas escolas deverão ensinar como proteger as nascentes/vertentes e não contaminar o rio da sua comunidade. Em vez de ensinar sobre os Jardins da Babilônia deverão ensinar às crianças como instalar hortas caseiras e motivá-los a plantar árvores frutíferas nas suas propriedades para melhorar a ingestão de vitaminas e sais minerais das suas famílias. Em vez de ensinar sobre os "heróis" que promoveram guerras em países distantes deverão ensinar às crianças a história dos heróis das suas comunidades que se destacaram como produtores rurais muito eficientes, bons pais e mães de família que outorgaram uma educação exemplar aos seus filhos, que contribuíram ao desenvolvimento da comunidade, etc. As escolas fundamentais rurais deverão incluir nos seus currículos conteúdos utilizáveis pelos futuros agricultores e suas famílias, como por exemplo: conceitos e noções básicas sobre produção agrícola eficiente, administração rural, prevenção contra perdas pós-colheita, incorporação de valor agregado, organização das comunidades para comercializar e solucionar em conjunto outros problemas de interesse comum, educação familiar, higiene, prevenção de enfermidades e cuidados com a saúde, produção e uso de ervas medicinais, primeiros socorros em casos de acidentes rurais, intoxicações com pesticidas, picadas de serpentes, etc. Igualmente deverão formá-los para que adquiram valores de aplicação permanente e universal, como honestidade, disciplina, pontualidade, responsabilidade, desejo de superação para triunfar na vida através do trabalho honesto e bem executado, solidariedade e associativismo, cumprimento dos seus deveres como membros da família e da comunidade, respeito pelos direitos de terceiros, a prática da poupança, do investimento e da previsão para a velhice, etc. Estas escolas deverão advertir as crianças sobre os riscos e perigos das drogas, do alcoolismo, da violência, da delinqüência, das práticas sexuais prematuras, imprudentes e irresponsáveis, etc. Deverão proporcionar-lhes uma educação que eleve o ego, a auto confiança e a auto-estima dos futuros agricultores, ao demonstrar-lhes o quanto eles são importantes para o desenvolvimento econômico e social do município e do país; também deverão demonstrar-lhes que as atividades agrícolas e pecuárias oferecem reais oportunidades de prosperidade econômica e de realização pessoal para quem trabalha com dedicação, eficiência, honestidade, cooperação e profissionalismo. Sempre que possível, as suas atividades educativas deverão ser realizadas fora das salas de aula, em primeiro lugar para que as crianças conheçam, vejam e vivenciem procedimentos, atividades e comportamentos positivos adotados por outras famílias e propriedades existentes na sua comunidade que possam servir de excelentes exemplos a serem seguidos pelos alunos; e em segundo lugar para que possam aplicar e executar na prática os conhecimentos teóricos e abstratos que estão adquirindo na escola.

5) Capacitar e adequar a formação dos professores das escolas fundamentais rurais. A reformulação dos conteúdos curriculares e dos métodos pedagógicos destas escolas exige que os atuais professores rurais também sejam capacitados e que as faculdades de educação/pedagogia passem a formar os futuros professores rurais com conhecimentos e vivências da realidade agrícola e rural. Enquanto esta medida não for adotada os professores simplesmente não saberão o que e como deverão ensinar às crianças rurais. Em outras palavras, é recomendável adotar com os professores das escolas fundamentais rurais, atuais e futuros, medidas de capacitação e formação similares às que, nos itens 2 e 3 deste artigo, se propõe adotar para os extensionistas agrícolas.
Textos gratuitos que descrevem como levar á prática as sugestões deste artigo estão disponíveis nas Páginas Web:
- http://www.polanlacki.com.br
- http://www.polanlacki.com.br/agrobr

As instituições interessadas em organizar um evento destinado a apresentar, adaptar e eventualmente adotar esta proposta poderão comunicar-se com o autor através do e-mail:
- [email protected]

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