
A agricultura sempre foi uma atividade de risco e influenciada por inúmeros fatores, sejam climáticos, de oferta e demanda, cambiais, de insumos, político-econômicos. E o produtor brasileiro vem contabilizando prejuízos há várias safras. Quando não é um, é outro fator que interfere. Vejam que o setor acumula dívidas de cerca de R$ 65 bilhões distribuídos em mais de 2 milhões de contratos de financiamento. Para produzir, o agricultor tomou crédito no banco. E por conta de um ou de vários fatores que interferem na atividade, não deu para pagar o empréstimo.
Agora, prestes a plantar a próxima safra, o produtor ainda espera um aceno do governo para renegociar a dívida e poder tomar novo crédito. E apesar do bom cenário internacional - com as commodities em alta e previsão de aumento acentuado na demanda de alimentos - o produtor segue com a corda no pescoço e tendo de lidar com velhos gargalos, como a infra-estrutura e a carga tributária.
O produtor de cana - sobretudo os pequenos e médios, que são mais suscetíveis às crises porque têm fôlego financeiro curto - encerrou a safra passada com prejuízo e começa a nova com preocupação. Além dos fatores de mercado - principalmente em relação ao preço do açúcar, que deve continuar com alta volatividade -, o fornecedor independente sofre os impactos do aumento do preço dos fertilizantes, insumo dos mais importantes na formação do custo de produção. Em 12 meses até abril, o preço do fertilizante em reais subiu 73% e mais 40% neste ano, segundo a Fundação Getúlio Vargas.
Os fatores para essa escalada dos preços também são muitos. O Brasil nunca foi auto-suficiente na produção de fertilizantes. Em 1990 o país importava 34% dos produtos utilizados na lavoura, hoje o volume é de cerca de 70%. Além disso, com a explosão no consumo de comida nos países emergentes, a produção de alimentos terá de crescer fortemente, demandando mais fertilizantes. Além disso, outro insumo importante também sofreu reajuste nos últimos 15 dias: o diesel, que subiu 15% nas refinarias.
O fato é que, se a renda obtida com a cana não cobriu os custos de produção na safra passada, o cenário para este ano nos parece mais preocupante. O fertilizante representa cerca de 20% do custo total para produzir um hectare de cana e sua aplicação Em uma rápida conta, serão necessárias toneladas de cana para pagar uma de fertilizante.
Não somente o agronegócio da cana, mas todas as demais cadeias arcarão com os custos de produção. Mesmo que as commodities estejam num bom momento, dificilmente seus preços se elevarão na mesma intensidade do que os dos insumos. E o problema na oferta de fertilizante não se resolve do dia para a noite. São necessários anos de investimento nas jazidas dos nutrientes. O que se observa, no entanto, é que não há qualquer iniciativa do governo para tentar amenizar a alta dos preços dos fertilizantes, que ocorreu de forma anormal. E há várias maneiras de interferir.
Vejam que nesta semana o governo anunciou uma série de medidas para reduzir o preço do trigo, da farinha de trigo e do pãozinho, suspendendo a cobrança de PIS e Cofins e reduzindo as tarifas de importação. No caso dos fertilizantes, deveria haver também uma ação rápida. Enquanto isso não ocorre, o produtor brasileiro - especialmente os pequenos e médios - segue no dilema: desistir da atividade ou resistir bravamente, com as contas no vermelho.