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Livre Concorrência x Segurança: De que lado está a nova lei dos postos?


Opinião Livre
A promulgação da Lei Municipal nº 6.381/13, que permite a instalação de postos de combustíveis em supermercados e hipermercados de Natal, suscitou enorme debate acerca do impacto que representará essa permissão no cotidiano natalense.
De um lado, os defensores da livre iniciativa bradam suas armas no sentido de que essa modalidade de comercialização de combustíveis atua como um saudável fator de equalização dos preços, já que a concorrência será fomentada com o ingresso de distribuidores vinculados a grandes redes supermercadistas, que normalmente vendem o litro da gasolina e do etanol em seus postos a preços mais baixos do que aqueles praticados pelos revendedores tradicionais.

E o argumento da livre iniciativa - e de seu consequente, a livre concorrência - não é pouca coisa. Ambos possuem status constitucional, expressamente elencados no art. 170 da Constituição Federal, e constituem as bases da ordem econômica em nosso País. Ponto para o consumidor!
Do lado oposto, estão aqueles que vêm nessa permissividade da lei um enorme risco à segurança da população. Segundo ponderam, a atividade de revenda de combustíveis é, por si só, uma atividade econômica de alto risco, e executá-la em locais de grande concentração de pessoas, tais como supermercados e hipermercados, somente maximiza esse risco.
Realmente, não se imagina que a manipulação de milhares de litros de produtos inflamáveis seja das coisas mais seguras do mundo e, tal qual a livre iniciativa e a liberdade de concorrência, a segurança não é fator que passou ao largo do legislador constituinte. É ela valor fundante da ordem constitucional, tanto o é que vem desde logo estampada no preâmbulo da Lei Fundamental e no art. 5º, seu famoso rol de direitos e garantias fundamentais. Outro ponto para o consumidor!
Ora, se de um lado temos aqueles que se preocupam com a livre iniciativa e, de outro, os que voltam os olhos às importantes questões de segurança, é o consumidor que tem de comemorar. Há, em Natal, verdadeiros defensores de seus interesses.
Essa conclusão, a primeira vista, pode não parecer tão lógica ou direta – especialmente quando se considera quem são os protagonistas em cada lado desse embate e suas circunstâncias (principalmente suas circunstâncias).
Com efeito, não podemos acreditar ser possível excluir do debate legislativo as pretensões de grupos econômicos que eventualmente possuam algum interesse na aprovação ou rejeição de determinada lei. São fatores de pressão (alguns os chamam de lobby...) que atuam junto ao poder desde as eras mais remotas da sociedade organizada. E, em sendo assim, não faz sentido qualquer tentativa de afastar esse tipo de influência na criação legislativa.

E não faz mesmo, até porque, ainda que inicialmente essa influência pareça perniciosa, ela permite o necessário conflito de ideias, pontos de vista, justificativas, todos estes aspectos indispensáveis na elaboração das leis. No caso da recente lei dos postos, foi o que se viu em Natal.
Se o trunfo dos defensores da norma é a livre iniciativa, e de seus opositores, a segurança, bem se verá que é possível harmonizar os dois lados. E, exatamente porque se levantou uma e outra bandeira, que os consumidores estarão atentos para garantir que a livre concorrência de preços não se faça em detrimento da segurança, e que, esta segurança, por seu turno, não impeça aquela liberdade de concorrer.
E para tanto, esses consumidores têm em mãos uma série de ferramentas, a começar pela regulamentação do setor de postos de combustíveis que é, de longe, uma das mais restritivas da atividade econômica. Efetivamente, os empresários que pretendem atuar nesse ramo estão sujeitos à fiscalização da autoridade municipal (para expedição da licença de funcionamento relativa ao imóvel); dos órgãos de proteção ao meio ambiente (quanto às licenças ambientais de operação); dos institutos de metrologia (que fiscalizam a adequação das bombas de combustível às normas de padronização quantitativa); e, da Agência Nacional do Petróleo, que por força da Lei nº 9.847/99 detém poderes quase tirânicos na fiscalização dos postos de combustíveis.
Se a nova lei dos postos será um avanço ou um retrocesso na economia da capital potiguar, só o tempo dirá. Mas é possível ter a certeza de que na disputa entre a livre concorrência e a segurança da sociedade, Natal, agradecendo aqueles que levantaram essas questões, já escolheu os dois.

* Carlos Roberto Ibanez Castroé Sócio da R. Cunha Advogados Associados. Professor universitário; Mestre e Doutorando em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Membro Efetivo da Comissão de Direito Constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo; Parecerista do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal.
 

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