ANTONIO CARLOS MOREIRA*
Após a Índia conquistar sua independência perante a Inglaterra, em 1947, seu líder Mahatma Gandhi passou a defender a produção científica como forma de o país suprir as demandas sociais de uma superpopulação carente de condições mínimas de sobrevivência. Questionado, sob a alegação de retornos demorados da pesquisa, o pacifista Gandhi respondeu com veemência. “A Índia é muito pobre para deixar de investir em ciência”. Este fato foi narrado em 1997, por Alberto Portugal, então presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa, vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Hoje, a Índia ostenta o sétimo maior PIB, US$ 2,3 trilhões, à frente, nessa ordem, de Itália, Brasil, Canadá, Coréia do Sul e Rússia. Ghandhi tinha razão.
Decisão semelhante, em 1974, no Brasil, foi um dos fatores que contribuiu para elevar nossa agricultura ao patamar das maiores do mundo, nos dias atuais: a criação da Embrapa – que completa nesta quinta-feira, 26, os 45 anos.
Naquele ano, os índices médios de produtividade no campo eram irrisórios. Daí a necessidade de o país então importar diversos alimentos para completar a mesa dos brasileiros – como carne, frutas de clima temperado, milho, feijão, arroz e quase todo o trigo que consumia.
A modernização tecnológica da agropecuária se concretizou de forma sustentável. Sobretudo se enfatizar-se que sustentabilidade deve ser compreendida sempre em seus três âmbitos: econômico, ambiental e social.
No vértice econômico, o noticiário cotidiano já demonstrou o peso decisivo do agronegócio. Mas são poucos conhecidos os avanços nos vértices ambiental e social da sustentabilidade proporcionados pela ciência.
A partir dos anos 1980, gestores de empresas privadas passaram a incorporar em seus planejamentos de produção as iniciativas de responsabilidade social empresarial, RSE. Nas esferas governamentais, o aumento dos recursos à pesquisa e políticas de estimulo às inovações tiveram papel fundamental. A presença da comunidade acadêmica completou o tripé de uma nova visão: mitigar os efeitos sociais do crescimento desordenado do capitalismo brasileiro.
Entre diversos outros, o melhor exemplo dos resultados é descrito, anualmente, no Balanço Social da Pesquisa, da Embrapa. Nesta quinta-feira, 26, quando celebra seus 45 anos, a instituição divulga a décima sétima edição do relatório, lançado pioneiramente em 1997.
Balanço social são os impactos positivos que resultam do conhecimento e das tecnologias geradas pela Embrapa. Quando relaciona os benefícios econômicos com a sua receita operacional líquida, a instituição obtém o chamado lucro social. Segundo a metodologia – reconhecida pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, OCDE – para cada R$ 1 investido pela Embrapa, em 2017, retornaram para a sociedade R$ 11,06. A adoção pelo setor agropecuário de 113 tecnologias e de cerca de 200 cultivares geraram o lucro social de R$ 37,18 bilhões.
Além dos impactos diretos na produção agropecuária e na vida das pessoas no campo e nas cidades, há ainda os benefícios à economia brasileira, como um todo – entre eles, o saldo na balança comercial, o aumento na arrecadação de impostos e empregos adicionais gerados nas cadeias produtivas. “A ciência seria omissa e irresponsável se não se dedicasse à proteção dos recursos naturais e ao desafio da produção sustentável”, pondera Maurício Antônio Lopes, presidente da Embrapa.
Somados os resultados dos dezessete anos do Balanço Social – o relatório passou a ser calculado a partir de 1997 – seus impactos são extraordinários: o lucro social totaliza R$ 336,7 bilhões. Ou seja, eis sustentabilidade na prática: reconhecer as necessidades ambientais e as desigualdades socioeconômicas para minimizá-las, por meio do aumento da riqueza produtiva e tecnológica.
*Antonio Carlos Moreira é consultor de Comunicação, especializado em Economia Agrícola pela Fundação Instituto de Administração, FIA, associada à USP-SP, e autor e organizador de livros sobre o tema, entre os quais Ciência da Terra (IAC, 2008).