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Os mitos amazônicos


Richard Jakubaszko

A Amazônia está na ordem do dia e é tema predileto da mídia. Por sua importância como reserva florestal global, pela depredação irregular e sem controle, o debate é emocional, bate nas raias da histeria e assume foro de verdade, quase mítico, de que deveria ser intocável, quiçá eternizada. Para a sociedade brasileira é intangível a sustentabilidade e a biodiversidade do gigante, e se desconhece o que lá existe.

Paradoxalmente vivem hoje na Amazônia 23 milhões de pessoas, num ambiente inóspito à vida humana moderna.

Desconhecem os ambientalistas, e também a mídia, de que cana-de-açúcar não se adapta ao regime de chuvas e de umidade da região amazônica, pois não produz a sacarose. Desconhecem os europeus, e todos os demais citados, que cana-de-açúcar não suporta transporte superior à distância de 50 km depois de colhida. Desconhecem-se os custos de implantação de lavouras de soja, e de que é economicamente inviável queimar-se floresta e destocar raízes para plantar soja.

Paralelo à barulhenta guerra que se processa na mídia, entre ambientalistas e desenvolvimentistas, a fome espreita a humanidade. Especialistas prevêem que a situação vai piorar: faltam áreas novas no planeta para aumentar o plantio de alimentos. Onde tem terra não tem água. Ou é terra coberta permanentemente por gelo. Será impossível atender os novos consumidores, frutos do aumento demográfico, aos quais se agregam populações asiáticas em acelerado processo de urbanização e inclusão social, que deixam de produzir para consumo próprio no campo e tornam-se consumidores urbanos de alimentos importados, pois seus países – China, Índia, Bangladesh, Paquistão, Indonésia – não têm capacidade de produzir alimentos nos volumes requeridos. Se ocorrer o previsto “aquecimento global”, ameaçado por Al Gore e pelos cientistas do IPCC, comprovando que “há males que vêm para o bem”, com o degelo das capotas polares surgirão imensas áreas hoje cobertas de gelo na Rússia, Canadá, China, Groelândia, e de alguns países nórdicos, aptas para a agricultura, para aplacar a fome. Mas isso é apenas mais uma futurologia. Na futurologia, aliás, deveria haver espaço para a criação de ONGs direcionadas e focadas na questão demográfica, pois estamos indo para o vinagre pelo excesso de gente. Não há porque é uma questão que envolve o debate de uma série de dogmas religiosos e a natureza da sexualidade humana.

Antes da fome, propriamente dita, que também é da natureza humana, haverá a especulação desenfreada dos preços, encarecendo os alimentos, numa previsível carestia planetária. Existe, portanto, a necessidade do plantio de alimentos em novas áreas nos próximos anos, da qual o cerrado brasileiro não terá, isoladamente, como garantir esse suporte, a não ser com a ajuda de novas tecnologias que tragam aumentos substanciais na produtividade. A chamada integração lavoura-pecuária, onde a agricultura recupera áreas degradadas de pastagens chegará ao limite de ocupação em menos de 10 anos, no máximo, em decorrência da necessidade de novas áreas para plantio de alimentos.
O engenheiro agrônomo Fernando Penteado Cardoso, presidente da Agrisus – Fundação Agricultura Sustentável apresentou proposta de se aproveitar áreas amazônicas, terras de floresta para plantio de alimentos. Propõe ele o aproveitamento de 1/3 a 1/4 da floresta para o plantio de alimentos, pois “será incoercível”, como diz ele, essa necessidade diante do aumento demográfico e dos novos consumidores. É uma idéia pra lá de corajosa, devemos admitir. Na ausência de debates em profundidade, seja através da imprensa ou da comunidade científica, entrevistei o Dr. Fernando, e este, debaixo de seus 93 anos de experiência, analisa essa alternativa de forma clara e objetiva nas páginas da revista DBO Agrotecnologia, edição outubro/novembro 2007, matéria que está disponível em arquivo PDF através do site da revista: www.dboagrotecnologia.com.br.
Pelo potencial de polêmica que carregam as afirmações desse também mitológico engenheiro agrônomo, eis que foi fundador da Manah, e presidente da empresa por mais de meio século, decidimos na redação já apresentar um primeiro contraditório, a cargo do também engenheiro agrônomo Odo Primavesi, da Embrapa, um dos 17 brasileiros signatários do relatório do IPCC, portanto, um ambientalista convicto. Acabou se transformando numa entrevista-debate, em profundidade, que irá enriquecer os espíritos sedentos de informação e ao mesmo tempo carentes de opiniões referenciais sobre o tema, lembrando que a mitologia amazônica é tratada de forma emocional na mídia.

O resultado é uma avalanche de informaçõestécnicas travadas entre esses dois especialistas, ambos otimistas, mas preocupados de forma responsável com questões ambientais e com a sustentabilidade da agricultura, além da sobrevivência da humanidade, ainda que em campos opostos na forma de como concretizar o milagre.

Na matéria citada pode-se ler opinião de qualidade à luz das ciências agronômicas, distante da histeria emocional como é praticada através da mídia, que repete erros crassos da história humana. Felizmente, tudo isso sem o perigo de sermos levados às fogueiras como já se praticou no passado. Porém, como registra o Dr. Fernando P. Cardoso, “o manejo sustentável da floresta amazônica, com exploração das madeiras maduras, é uma expressão desiderativa”.

Na mesma edição há um artigo do jornalista e técnico agrícola Milton Pomar, “Encruzilhada perigosa - o consumo asiático de alimentos preocupa”, que hoje ocupa a gerência-geral da BWP S/A na China, uma empresa Brasif. Ele alerta sobre os perigos do alto custo de alimentos no futuro-breve, por conta da imensa legião de asiáticos em processo de urbanização e de inclusão social.
Devemos refletir profundamente sobre os mitos amazônicos. De outro lado, já que brasileiro gosta tanto de leis, dever-se-ia votar e aprovar uma, determinando que opiniões de nonagenários de notório saber devessem, no mínimo, ser discutidas em pleno Congresso Nacional.

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