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O Último Romântico


Rutinaldo Miranda Batista Júnior
 
Dentro do seu peito, bate aquele coração. Não, um coração qualquer. Mas um coração especial. O coração de um romântico. Que por definição, é um coração sofredor. Sim, meus amigos. O romântico sofre. Nada mais romântico que sofrer. E o seu sofrimento deve ser genuinamente de “amor”. Não vale sofrer de outra coisa. Esqueça a bursite. Dispense a gastrite. Releve a artrite. A doença do romântico é o “amorite”. Já que de amor, ninguém deve sofrer mesmo.

Mas o romântico sofre. E como é bom pra ele esse sofrimento! Tanto, que faz questão de alardear pra todo mundo. “Ai, como eu sofro!”. Seguido daquela cara de coitadinho. Um artigo básico do Romantismo. Indispensável a qualquer candidato a romântico. Fazer uma cara de lambão. Depois ele solta sua frase predileta. “Ela não me ama”. Como se toda mulher tivesse a obrigação de amar essa criatura. Na verdade, o romântico é como pinga de roça. Bonzinho só no começo. Depois... Tudo bem, eu sei que ele realmente impressiona. Aparece com aquele buquê de rosa vistoso. Diz que te ama mil vezes ao dia. Coisa mais fofa do mundo. O problema é que tudo isso, acredite, acaba enjoando. E depois vem aquele pileque horroroso. A verdade nua e crua emerge. Homem carente demais não presta. O romântico vai grudar no pé de sua amada. E não soltar mais. Ser seu pior pesadelo. Um carrapato sentimental.
E depois dessa metamorfose. Já se sentindo um carrapato completo. Sentimentalmente realizado. O romântico vai passar pra “fase 2”. Ou seja, começa mesmo a barbarizar. Fazendo aquilo que mais gosta. Botar um monte de defeito na sua amada. Já que ser feliz no amor é seu sofrimento de verdade. E a meta agora é partir pra outra mulher que o desdenhe muuuuuito. Devolvendo sua inseparável dor de cotovelo. Sem a qual não consegue ser... feliz. Nem romântico.
Tudo começa com uma queixazinha aparentemente ingênua. “Ela não me dá muita atenção”. Depois ele vai pegando pesado. Passa a notar uma minúscula celulite. Implica com os dois quilos acima do ideal. Com aquela cor de batom que não lhe agrada mais. E o motivo que leva o casal à primeira discussão. Ela gosta mais de mpb que de forró. Se a mulher não mandar logo esse mala engolir os CDs de forró nem acabar com a relação. O Romântico entra na “fase 3”. A Fase da Apelação.

Agora, some sem dar explicação nenhuma. Mas pode ser facilmente encontrado nos bares da vida. Escutando suas canções prediletas. Só pra não deixar esfriar aquele espírito romântico. Hinos de um coração incompreendido. Coisas como “Entre tapas e beijos, é ódio, é desejo. É sonho, é loucura...”. Então vai anunciar que sua vida está uma porcaria. Que a alegria acabou. Que vai, sim, tomar veneno de rato. Uma medida extrema para fugir desse mundo cruel. Mas a amada pode deixar o raticida em cima da mesa numa boa. O romântico só tem coragem mesmo pra ser um grande chato. E quando ela não agüentar mais. Terminar com tudo. Mandar esse profissional da infelicidade pras cucuias. O sujeito ainda vai perguntar. “Tem certeza?” E sair choramingando de fininho. Sem saber por que as mulheres lhe desprezam. Por que não lhe dão seu devido valor. Achando que esse mundo é insensível demais. E ele, o último romântico.

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