Já há algumas semanas o Governo Federal anunciou sua ideia de criação da MULA, Moeda Única Latino-Americana. Existe, no entanto, uma série de considerações a ser feitas em relação a esse projeto anunciado, fatos esses que irão ser apontados no presente artigo, assim como seus efeitos no agronegócio. Diferente da campanha realizada pelo governo, a implementação dessa ideia teria unicamente efeitos nefastos em nossa economia.
Esse tipo de proposta deriva da Teoria das Areas Monetárias Ótimas, criada em 1961 pelo economista Robert Mundell cuja definição é: “região geográfica em que a eficiência econômica é maximizada por uma moeda comum”. Contudo, essa teoria tem uma série de falhas quando transposta para a realidade, pois desconsidera uma série de fatores que provocam desestabilização no sistema monetário de um país.
A teoria parte da premissa que uma moeda única favorece o comércio exterior entre os países da área, tendo como consequência o enriquecimento dos países envolvidos. Essa, sem dúvida, é a única grande vantagem da implementação dessa teoria. Porém, seus defeitos são imensamente maiores, pois os seus efeitos nefastos são muito mais amplos e nos diversos setores.
Logo em sua implementação temos um poderoso efeito inflacionário, pois ao adotar uma moeda única é necessário equalizar as taxas de inflação dos países que irão integrar a área comum. Olhando os índices atuais dos países que criaram o MERCOSUL iremos ter os seguintes índices de inflação anualizada: Argentina 104%, Brasil 5.79, Paraguai 8.26%, e, Uruguai 8.2%. Dessa forma ao considerarmos os quatro países do bloco iremos ter 126.09% de inflação ao ano. Ao calcularmos a média cada país teria 31.52% de inflação ao ano.
Considerando os números acima, excetuando a Argentina que iria se beneficiar, todos os outros países do bloco iriam ter um aumento em sua taxa inflacionária entre quatro e cinco vezes seus valores atuais. Porém, tendo todos os países do bloco em índices tão altos iriam demandar um aumento exponencial da taxa de juros, tendo em vista a enorme expansão monetária.
No caso exposto, iríamos ter um aumento unificado de taxa de juros a algo em torno de 40% anual. Novamente, apenas a Argentina iria se beneficiar se considerarmos que sua taxa de juros anualizada hoje é de 78%, razão pela qual o país não consegue controlar sua inflação, tendo em vista que o aumento de juros reduz a moeda disponível e dessa forma reduz o processo inflacionário que ocorre devido ao excesso de moeda na economia.
O segundo grande defeito dessa proposta se refere ao controle de política monetária. Isso se deve pelo fato de que os países perdem a autonomia em definir sua política monetária tendo como resultado a contaminação em todo o bloco na ocorrência de crises ocorridas em qualquer dos países individualizados. Novamente, usando a Argentina como exemplo: o aprofundamento da crise Argentina iria provocar uma crise sistêmica nos outros países que utilizem a moeda única.
O terceiro defeito é o fato que sua aplicação iria provocar a perda de competitividade do bloco em nível de comércio exterior. Isso se deve ao fato que a moeda de maior conversabilidade internacional é o dólar dos Estados Unidos da América, assim sendo a criação de uma moeda única não teria qualquer efeito positivo em comércio exterior.
Em sentido contrário, porém o efeito é bem diferente, pois ao aumentar as taxas de inflação a moeda perderia muita força em nível internacional tornando o dólar ainda mais caro para o processo de importação/exportação. Também não é válido o argumento de aumentar as negociações intrabloco, pois existem diversas outras maneiras para provocar esse aumento, dentre elas a redução de burocracia no comércio intrabloco.
O argumento de que a criação de uma moeda única, ou ainda um sistema de moeda escritural para a facilitação do comércio intrabloco é totalmente falacioso, pois o MERCOSUL já possui o Sistema de Pagamentos em Moeda Local, mais conhecido como SML e criado em 2008. Desde sua criação já foram operados R$ 863 milhões de reais, sendo que a Argentina operou oitenta vezes mais que o Brasil. Os valores não são maiores pois o sistema é pouco divulgado no Brasil, assim como não é obrigatório. Em outras palavras, é mentira que não exista meios de facilitação comercial no MERCOSUL em relação as moedas locais.
Frente a tudo que foi exposto, fica evidente que não há qualquer necessidade de criarmos a MULA, pois sistemas de compensação em moedas locais existe em toda a América Latina, tais como: o Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR), criado em 1965, o Fundo Latino-americano de Reservas (Flar), criado em 1978, o Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), criado em 2008; e, o Sistema Único de Compensação Regional de Pagamentos (Sucre), criado em 2009.
A defesa de um novo sistema é apenas a tentativa de se apropriar de algo já criado e causar desestabilização nos sistemas já existentes, ou seja desfazer o que já existe e criar mais problemas aos importadores/exportadores que integram o bloco. Enfim, mais uma ideia que beneficia apenas os políticos e prejudica quem efetivamente opera em seus países.