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Interferência da qualidade sobre o mercado da carne de frango no Brasil


Karina Ferreira Duarte

Introdução

Até recentemente, o foco para seleção de frangos de corte era apenas na taxa de crescimento, todavia, características relacionadas à qualidade da carne vêm apresentando crescente importância, tanto para a indústria processadora como para os consumidores. Presume-se, inclusive, que a intensa seleção a favor da taxa de crescimento das aves gerou problemas relacionados à qualidade da carne destes animais. Desta forma, estas características passaram a ser consideradas como objeto de estudo nos programas de seleção.

Considerando-se os padrões de qualidade, no que dizem respeito à satisfação das exigências sensoriais, os músculos peitorais freqüentemente apresentam variações indesejáveis nos parâmetros de cor e de maciez.

A importância dessas características é observada em momentos distintos. Enquanto a coloração do peito do frango está associada à aceitabilidade no momento da aquisição, a maciez, que constitui um dos principais atributos sensoriais, determina a aceitabilidade global.

As técnicas envolvidas com o manejo de criação, tais como lotação de ave no galpão criatório, dietas, sexo e idade, podem afetar as características de qualidade da carne. Essas alterações podem ser atribuídas ao desenvolvimento do músculo, conteúdo de colágeno ou estar associadas à maturidade sexual.

Considerando-se que essas propriedades são inalteradas no post mortem e que em condições comerciais de criações de aves as técnicas são padronizadas, os fatores lotação, dieta, sexo e idade não causam modificações relevantes sobre a qualidade da carne.

As alterações nos parâmetros de qualidade, entre animais do mesmo lote, idade e sexo, são atribuídas ao estresse pré-abate, que desencadeia transtornos fisiológicos que podem causar alterações bioquímicas anômalas durante a transformação do músculo em carne e, com isso, afetar a estrutura do músculo. Em músculos com desenvolvimento bioquímico alterado, as diferentes velocidades nas reações de glicólise podem determinar alterações nas características de qualidade da carne.

Qualidade da carne

A carne utilizada em produtos processados deve possuir propriedades funcionais excelentes, com padrões de qualidade estáveis, que garantam um produto final de boa qualidade e rentabilidade. Entretanto, um dos maiores desafios para a indústria de carnes é oferecer produtos macios, suculentos e com cor e sabor agradáveis.

Os principais atributos avaliados na carne para determinar sua qualidade são cor, capacidade de retenção de água e textura. A cor é um dos fatores mais importantes na percepção do consumidor quanto à qualidade da carne, pois é uma característica que influencia tanto a escolha inicial do produto pelo consumidor como a aceitação no momento do consumo.

Os parâmetros utilizados na avaliação da cor da carne utilizados baseiam-se no sistema colorimétrico denominado CIELab, sigla composta pelas iniciais da comissão que estabeleceu o sistema (The Commission Internationale de L’Eclairage, em 1976) e suas escalas de cor (luminosidade, representada por L*, teor de vermelho, representado por a* e teor de amarelo, representado por b*).

A capacidade de retenção de água é um termo originalmente usado para descrever a capacidade do músculo e dos produtos cárneos em manter a água ligada a si. A água no músculo é retida em sua maior parte intracelularmente e também entre as miofibrilas. A capacidade de retenção de água está entre as propriedades funcionais mais importantes da carne, pois influencia seu aspecto, sua palatabilidade e está diretamente relacionada às perdas de água antes e durante o cozimento.

A textura é outro fator bastante importante na percepção do consumidor quanto à qualidade da carne. A textura da carne está intimamente relacionada à quantidade de água intramuscular e, portanto, à capacidade de retenção de água da carne, de modo que quanto maior o conteúdo de água fixada no músculo, maior a maciez da carne. A textura da carne é determinada através de sua força de cisalhamento.

Carne pálida, flácida e exsudativa, ou PSE
Um dos maiores problemas enfrentados pela indústria processadora é a questão da carne PSE, cujo termo tem origem nas iniciais das palavras inglesas pale, soft e exsudative, que significam carne pálida, flácida e exsudativa. Os mecanismos fundamentais deste fenômeno ainda não foram bem elucidados em frangos.

A carne PSE apresenta as propriedades funcionais comprometidas face à rápida glicólise post mortem, a qual acelera a queda de pH muscular enquanto a temperatura da carcaça ainda está alta, levando à desnaturação de proteínas musculares.

Com relação à temperatura da carcaça durante o declínio de pH, um aumento de 10ºC aumenta a desnaturação de proteínas musculares em 20 vezes.

A dispersão de luz de uma superfície muscular é diretamente proporcional à sua quantidade de desnaturação protéica, o que interfere na aparência física da carne, influenciando a quantidade de luz que lhe é refletida. Assim, quanto maior o grau de desnaturação protéica, menos luz é transmitida através das fibras e mais luz acaba sendo dispersa, o que leva à palidez da carne.

O pH também influencia a capacidade de retenção de água da carne, pois o declínio de pH post mortem altera a composição celular e extracelular das fibras musculares, resultando em redução de grupos reativos disponíveis para reter água nas proteínas. A ocorrência de PSE está relacionada com acúmulo excessivo de líquido nos produtos embalados, devido à sua menor capacidade de retenção de água, o que diminui a aceitação do produto pelo consumidor. O comprometimento das propriedades funcionais da carne PSE pode resultar em produtos industrializados de pouco rendimento, devido à liberação de exsudato, o que interfere na padronização durante a industrialização. Desta forma, o rendimento após o processamento da carne é altamente relacionado com a velocidade da queda de pH post mortem, de modo que uma diferença de uma unidade a menos no pH aferido aos 20 minutos post mortem corresponde a cerca de 2% a menos no rendimento após o processamento da carne.

A capacidade de retenção de água da carne, por sua vez, exerce grande influência na maciez da carne, já que na carne PSE a capacidade de retenção de água é menor, e quanto menor a quantidade de água no músculo, menor a maciez da carne. A carne PSE possui também menor potencial proteolítico post mortem, o que contribui para a diminuição da maciez da carne.

O rápido declínio de pH, a altas temperaturas da carcaça, inativa o sistema calpaína e reduz o amaciamento post mortem da carne. O fenômeno PSE, portanto, é prognosticado pela combinação de análises de pH, cor e capacidade de retenção de água nos músculos do peito. O fenômeno PSE pode, portanto, ser detectado pela combinação dos valores de pH (abaixo de 5,8) e cor (valor L* acima de 52,0) aferidos em 24 horas após o abate.

Fatores como estresse, tipo de atordoamento e temperatura de resfriamento podem levar ao desencadeamento da condição PSE em aves.

Considerações finais

Apesar dos prejuízos da indústria devido a problemas com a qualidade da carne, pouca atenção vem sendo dada ao problema PSE, especialmente em frangos. O estudo dos parâmetros genéticos das características relacionadas à condição PSE pode favorecer a obtenção de produtos de melhor qualidade sensorial e de maior rentabilidade, fazendo-se necessário um monitoramento dos atributos de qualidade da carne e até mesmo sua inclusão nos índices de seleção em um programa de melhoramento genético. Além disso, deve-se identificar as características associadas à qualidade da carne e também analisar os atributos de qualidade em genótipos utilizados comercialmente, para que se obtenham informações que levem à redução da condição PSE nestas linhagens.

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