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Considerações sobre o Setor Agropecuário no Brasil em 2024



Vinicius Romeiro Ferreira

A atividade agropecuária no Brasil representa um dos pilares fundamentais da economia nacional, ocupa uma vasta área do território e contribui significativamente para o PIB do país, com valor de R$2,5 trilhões em 2024, cerca de 22% do PIB, calculado pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, em parceria com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Neste artigo, analisaremos a extensão da área produtiva brasileira, comparando-a com a de outros países, e discutiremos as áreas preservadas em território nacional em relação a outros contextos internacionais, bem como a produtividade de determinados produtos e o investimento governamental no setor. Também exploraremos como a vasta área total do Brasil influencia os riscos climáticos em comparação com países menores.

O Brasil possui uma das maiores áreas produtivas do mundo, com cerca de 283 milhões de hectares dedicados à agropecuária no último estudo realizado pela Embrapa em 2023. Entre as principais atividades está a pecuária, que ultrapassa os 164 milhões de hectares, 60% do total, e a agricultura com aproximadamente 120 milhões de hectares, tendo como principais culturas a soja, com 40 milhões de hectares e cana-de-açúcar com 9 milhões de hectares, produtos exportados para várias partes do mundo, consolidando a posição do Brasil como um dos maiores exportadores agrícolas globais.

Em comparação, os Estados Unidos possuem 160 milhões de hectares destinados à agricultura, sendo 34 milhões destinados a soja, enquanto a China, com uma população significativamente maior, utiliza aproximadamente 120 milhões de hectares para a produção agrícola, com apenas 10 milhões destinados a soja. Em termos de produção de soja, o Brasil lidera como o maior produtor e exportador mundial e supera os Estados Unidos, produzindo, em 2024, 148 milhões de toneladas de soja, contra 120 milhões dos Estados Unidos.

Além disso, o Brasil que sempre ocupou a segunda posição em maior exportador de milho do mundo, acabou caindo uma posição, ficando atrás da China, que obteve colheita recorde de 295 milhões de toneladas de grãos, após os investimentos agrícolas realizados pelo governo chinês e dos Estados Unidos que produziu 390 milhões de toneladas dentro do ano de 2024. O Brasil na terceira posição teve uma produção de 115 milhões de toneladas, conforme dados da CONAB. Já com a cana-de-açúcar, o Brasil se manteve o maior produtor mundial, com uma produção de aproximadamente 713 milhões de toneladas em 2024.

Considerando todos os números acima, o Brasil ainda é um dos países com maior quantidade de áreas preservadas no mundo. Aproximadamente 66% do território brasileiro é coberto por vegetação nativa, incluindo a Amazônia, que é a maior floresta tropical do mundo. Com isso, o Brasil é o país que mais preserva vegetação nativa no planeta. Além disso, cerca de 25% do território nacional está legalmente protegido sob formas de conservação, como parques nacionais e reservas ecológicas.

A legislação ambiental brasileira impõe que os produtores rurais preservem uma porcentagem significativa de suas propriedades como reserva legal. No bioma Amazônia, essa exigência é de 80% da propriedade, enquanto nas outras regiões do país a reserva legal deve ser de 20% a 35%, dependendo do bioma. Em comparação, a legislação ambiental em países como os Estados Unidos e na Europa é menos rigorosa. Por exemplo, nos Estados Unidos, a legislação de conservação é mais flexível e não há uma exigência nacional uniforme de reserva legal para produtores rurais. Na Europa, a Política Agrícola Comum (PAC) incentiva práticas de conservação, mas também não impõe percentuais de reserva legal tão elevados como os brasileiros.

E em termos gerais, a grande produção da atividade agropecuária aliada ao grande percentual de preservação, o Brasil sendo o quinto maior país do mundo em termos de área total, com mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, tem ainda uma diversidade climática e ecológica única, e que apresenta desafios significativos quando comparado a países menores.

Como maior país da América do Sul, o Brasil enfrenta uma variedade de riscos climáticos que afetam não apenas suas regiões internas, mas também têm implicações para os países vizinhos. A Amazônia, por exemplo, desempenha um papel crucial na regulação do clima global e regional. Desmatamentos e incêndios florestais na Amazônia podem alterar os padrões de chuva, não só no Brasil, mas também em países como Bolívia, Paraguai e Argentina, impactando negativamente suas produções agrícolas.

No nordeste do Brasil, a seca é um fenômeno recorrente que afeta severamente a agricultura e a segurança hídrica. Este problema não se limita às fronteiras brasileiras e pode influenciar o clima de regiões vizinhas, exacerbando a escassez de água em países como o Peru e a Colômbia. As mudanças nos padrões de precipitação e temperatura também podem propiciar a migração de pragas e doenças agrícolas entre os países da região, aumentando a vulnerabilidade das lavouras sul-americanas.

Com efeito e o mais conhecido dos fenômenos climáticos que atingem o Brasil está o La Niña, levando seca para a área Sul do país e levando chuvas em excesso para Nordeste e Amazônia.

Países menores, como os Países Baixos ou Israel, enfrentam riscos climáticos de forma mais concentrada devido à suas áreas limitadas. No entanto, o Brasil, com sua vasta área, precisa gerenciar riscos climáticos diversificados, que variam desde secas no Nordeste até inundações na Amazônia. A administração eficiente desses riscos é crucial para garantir a estabilidade da produção agropecuária e a proteção das áreas preservadas.

Outro ponto importante relacionado a atividade agropecuária é o financiamento da atividade rural, e este tema no Brasil é um dos fatores críticos para o desenvolvimento do setor, diferentemente dos outros países mencionados acima. O país utiliza uma variedade de fontes de financiamento, incluindo bancos públicos e privados, cooperativas de crédito e programas governamentais. O crédito rural é essencial para a aquisição de insumos, maquinários e para investimentos em tecnologia e infraestrutura.

Em base de comparação, nos Estados Unidos, o financiamento agrícola é amplamente suportado por programas federais, como o Farm Credit System, que oferece crédito acessível e a longo prazo aos produtores rurais. Em 2024, os financiamentos agrícolas nos Estados Unidos totalizaram cerca de 420 bilhões de dólares. A China, por outro lado, conta com um sistema bancário robusto onde os bancos estatais desempenham um papel crucial no fornecimento de crédito aos agricultores. Em 2020, o financiamento agrícola na China somou cerca de 1,5 trilhão de yuan (aproximadamente 230 bilhões de dólares), sendo que em 2022 houve investimento ainda maior para reestruturação do setor, sem valores divulgados, mas que resultaram em safras recordes nos anos subsequentes.

Além disso, a União Europeia subsidia significativamente seu setor agrícola através da Política Agrícola Comum (PAC), que alocou e alocará cerca de 95 bilhões de euros de 2021 a 2027 para apoiar os agricultores europeus. Embora o Brasil também possua programas de apoio, como o Plano Safra, que oferece crédito subsidiado aos produtores rurais, muitos agricultores ainda enfrentam dificuldades para acessar financiamento a taxas competitivas. Em 2024, o crédito rural no Brasil totalizou cerca de 400 bilhões de reais (aproximadamente 60 bilhões de dólares). A burocracia e a volatilidade econômica são obstáculos adicionais que impactam negativamente o setor.

Comparado aos anos anteriores, 2024 foi marcado por um cenário econômico desafiador, com os produtores rurais enfrentando altos custos de insumos, aumento das taxas de juros, preços baixos das commodities, problemas climáticos e uma demanda volátil no mercado global, além da seca severa no Nordeste e as inundações na Amazônia que também contribuíram para a redução das safras e, consequentemente, para a dificuldade de cumprimento das obrigações financeiras.

Outro fator crucial foi o endividamento crescente dos produtores rurais, que muitas vezes recorreram a empréstimos de curto prazo com taxas de juros elevadas para financiar suas operações. A falta de políticas públicas eficazes para apoiar a renegociação de dívidas e a modernização das práticas agrícolas agravou ainda mais a situação, e nesse ponto inclui-se a própria Lei de Recuperação Judicial e toda a sua flexibilização trazida pelas decisões de juízes, tribunais e instâncias superiores, relativizando pontos importantes relacionados diretamente a possiblidade de reestruturação do produtor como gerador de empregos, pagador de impostos e, principalmente, como gerador de valor ao país dentro da cadeia do agronegócio.

Nos últimos anos, houve um aumento significativo nos pedidos de recuperação judicial por parte dos produtores rurais no Brasil. Em 2023, o número de pedidos já havia apresentado um crescimento expressivo em relação aos anos anteriores, mas foi em 2024 que os pedidos de recuperação judicial atingiram seu ápice, com cerca de 500 pedidos apenas envolvendo produtores rurais, sendo que o número de pedidos envolvendo empresas da cadeira produtiva, como o caso de revenda de insumos, agroindústria e agrosserviços, foram mais 230 pedidos. Esse aumento pode ser atribuído aos diversos fatores já mencionados, refletindo a deterioração das condições econômicas e políticas enfrentadas não só pelos produtores rurais. Essa situação evidencia a necessidade urgente de reformas estruturais que ofereçam suporte financeiro e técnico adequado aos agricultores e demais participantes do setor, promovendo a resiliência e a sustentabilidade do setor agropecuário no Brasil.

Portanto, o Brasil destaca-se tanto pela sua vasta área produtiva quanto pelo compromisso com a preservação ambiental. A comparação com outros países revela a importância estratégica da agricultura brasileira no cenário global, bem como os desafios únicos impostos pela diversidade climática e ecológica do país. No entanto, é fundamental abordar a falta de planejamento governamental com políticas que melhorem a situação do produtor rural e de todo o setor agropecuário. Investir em infraestrutura, pesquisa, e inovação, juntamente com políticas de apoio financeiro e técnico, é essencial para garantir a sustentabilidade e a competitividade da agricultura brasileira no cenário mundial. A gestão sustentável desses recursos é essencial para manter o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental.

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