Já tentou lavar a louça do almoço com o sabão em pó de lavar roupa?
E a roupa, já lavou com o detergente lava-louça?
Já tentou tomar banho com algum desses dois?
Um produto de limpeza deve ser escolhido em função da natureza da sujeira, e de onde ela se encontra. Sim meus amigos, existe química por trás do processo de limpeza, seja do que for.
Os agentes ou produtos de limpeza podem ser classificados quanto à sua natureza química e sua formulação, pois é exatamente essa combinação que confere a capacidade de limpar a sujeira que se quer remover. Com base nesse critério (natureza química), os principais agentes de limpeza são divididos em tensoativos, solventes, produtos ácidos e alcalinos.
Os solventes são empregados na remoção de óleos e graxas. São em sua grande maioria produtos inflamáveis, e devem por isso ser armazenados e manuseados com todo devido cuidado. Todo mundo deve se lembrar da boa e velha querosene ou mesmo do “thinner” quando falamos nesse tipo de produto.
A soda cáustica é o produto alcalino mais conhecido, sendo muito utilizada com água quente para remover gorduras ou mesmo desentupir pias e até tubulações residenciais. Extremamente corrosiva e tóxica, deve ser usada em diluição adequada e com todo o cuidado e proteção adequados. Dos produtos ácidos, o mais comum é o muriático, que é uma solução de ácido clorídrico, muito empregada para remover cimento e limpar calçadas e pisos e mesmo para tirar manchas em mármore. Assim como a soda cáustica, muito cuidado e proteção são necessários no seu manuseio.
Os detergentes tem em sua composição os chamados tensoativos, que são substâncias químicas capazes de interagir com substâncias polares e apolares. Esqueceu das aulas de química do segundo grau? Sem problema. Esta interação é a base da química dos tensoativos, pois faz com que as substâncias apolares (orgânicas) sejam emulsionadas em água (polar), e com isso a sujeira é removida da superfície a ser limpa.
Quer visualizar na prática? Pegue um copo, coloque água e um pouco de óleo de cozinha, adicione um pouco do detergente e agite. Pronto! Você vai obter uma emulsão (líquido branco leitoso) do óleo na água. A qual será lavada com mais água e descartada pelo ralo da pia.
Completam o grupo substâncias que não atuam diretamente na limpeza mas que potencializam a mesma: sequestrantes e coadjuvantes. Os primeiros “sequestram” metais provenientes de sais dissolvidos na água que podem interferir na formação da emulsão pelos detergentes. Os segundos ajudam a “umedecer” a sujeira orgânica facilitando a combinação com o detergente e a formação da emulsão e consequentemente a limpeza da superfície.
Os produtos de limpeza empregados desde ambientes domésticos a industriais possuem em sua maioria formulações complexas (tensoativos, sequestrantes, coadjuvantes, agentes acidificantes ou alcalinizantes), pois a combinação das propriedades de cada um dos ingredientes potencializa a capacidade do produto final em remover toda a sujeira. Essa associação de agentes é feita pelos fabricantes, após pesquisa e desenvolvimento de formulações seguras que sejam capazes de limpar a sujeira sem deixar resíduos no ambiente ou mesmo causar efeitos adversos em quem esteja usando os produtos.
E é infelizmente nesse aspecto que a criatividade e o “jeitinho” associados às “lendas urbanas” trazem sérios riscos de acidentes pela mistura de produtos feitas em casa ou onde quer que alguém resolva “dar um grau” na limpeza a ser realizada. A velha e errada imagem de que misturar os produtos de limpeza em um balde com água vai produzir uma solução que limpa até banheiro de rodoviária!
E aí, na maioria absoluta dos casos, entra em cena uma velha conhecida de todos, de quem falei no meu artigo anterior: a água sanitária. Quem nunca viu ou ouviu falar de alguém que mistura a água sanitária com o desinfetante multiuso para dar aquela caprichada na limpeza do piso de casa? Pois é.
NÃO FAÇA ISSO!!!!!
A água sanitária reage com os componentes dos produtos de limpeza liberando gases que, dependendo da intensidade, podem causar ardência nos olhos, crises de tosse e até mesmo queimaduras nas mucosas e no trato respiratório, que em último grau podem gerar asfixia.
Que fique claro, nada tenho contra a água sanitária (ao contrário, uso em casa, mas da forma adequada)! Acontece que a água sanitária é um SANITIZANTE (como seu próprio nome já indica), isto é, serve para eliminar microrganismos, e não para remover sujeira de nenhuma superfície. Após limpar a sujeira com produto o adequado, a aplicação da água sanitária é feita, EM SEPARADO, para sanitizar o ambiente e livrá-lo de microrganismos nocivos à nossa saúde.
Mas o que isso tem a ver com o campo?
Após dezenas, as vezes centenas de aplicações ao longo do ano, tanques de mistura, tubulações e bicos de equipamentos de pulverização devem ser limpos para a nova safra que se aproxima.
A sujeira nesses equipamentos é digna de uma tese de doutorado: terra proveniente da água utilizada no preparo da calda, óleo vegetal, borras provenientes de reações incompatíveis entre defensivos e entre defensivos e metais presentes na água, etc. Sendo essa sujeira uma verdadeira “gororoba”, que muitas vezes forma crostas nas paredes de tanques e tubos e entope os bicos, nada melhor do que usar água sanitária na sua limpeza. Certo?
ERRADO!!!!!
Além de não ser um agente de limpeza, conforme expliquei acima, a água sanitária ataca o aço inox, que muitas vezes é um dos materiais encontrados nos equipamentos de pulverização agrícola. E se houver resíduos de compostos nitrogenados (ex: MAP, Uréia, Glifosato, Glufosinato) nos equipamentos, a água sanitária vai apresentar reações com essas substâncias, formando gases que causarão os mesmos problemas que quando misturada com produtos de limpeza.
Nesse caso, o que fazer então?
Usar detergentes alcalinos com formulação específica para utilização agrícola.
Estes produtos possuem em sua composição tensoativos, sequestrantes de metais, coadjuvantes de limpeza e agentes alcalinizantes, os quais atuam sobre toda a “borra” grudada nos tanques e no circuito hidráulico dos pulverizadores, dissolvendo as incrustações de difícil remoção e inativando os resíduos dos defensivos aplicados, evitando contaminações nas aplicações futuras.
Detalhe muito importante: imagine que seu equipamento de pulverização não foi limpo corretamente e resíduos de herbicidas permaneceram no seu circuito hidráulico. Imagine agora que estes resíduos serão aplicados junto com a próxima calda, que não necessariamente será do mesmo herbicida....
Mas a água sanitária é tão barata?
Sim, muito barata.
Mas ela vai limpar corretamente os equipamentos, removendo toda a sujeira? NÃO!
Porque então é recomendada a utilização da água sanitária para a limpeza de equipamentos agrícolas?
Talvez com o intuito de dar um excelente exemplo do ditado “o barato que sai caro”.
Marcelo Hilário
Químico Responsável – Pesquisa e Desenvolvimento
Pesquisa e Desenvolvimento – SELL AGRO