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ABCD e o comércio mundial de grãos



Amélio Dall’Agnol

A fusão de empresas com o propósito de ganhar escala e reduzir os custos operacionais para aumentar os lucros financeiros, não é nenhuma novidade. Acontece desde que o comércio entre os povos existe, embora nunca se tenha processado com a dinâmica das últimas décadas, o que sinaliza para uma realidade futura de mercados sob o domínio de poucas corporações.

Diferentemente do que muitos possam pensar, essas corporações não são propriedade de um ou poucos milionários. São muitos os donos. A bem da verdade, todos podemos ser parcialmente proprietários dessas empresas, comprando suas ações que são comercializadas nos mercados financeiros de todo o mundo e, consequentemente, auferir dividendos com o seu êxito financeiro.

Se a estratégia de unir empresas é para ganhar musculatura e, consequentemente, reduzir o custo dos produtos que compramos, que as fusões sejam bem vindas. O que não se deseja é que essas incorporações conduzam à formação de oligopólios, os quais poderiam estabelecer o preço e as características dos produtos comercializados, em detrimento da população em geral privada dos serviços que eram prestados pelas empresas absorvidas. 

Assim como o comércio da energia fóssil é controlado pelo que se convencionou chamar de as “sete irmãs” (Exxon e Shell, entre outras), o comércio de alimentos e seus insumos de produção também são controlados por poucas empresas. Dez multinacionais controlam 95% dos pesticidas (Bayer, BASF, Corteva...), o mesmo ocorrendo com os fertilizantes, onde 10 corporações (Yara, Mosaic, Potash...) controlam a maior parte do comércio global do produto. 

Com o comércio mundial de sementes, não está diferente. Com o advento dos transgênicos e o elevado custo da exploração do seu potencial via técnicas de engenharia genética, as mesmas multinacionais que controlam o comercio dos agroquímicos, subitamente redirecionaram seus esforços para o domínio da expressão genética das plantas, em detrimento da busca por novas moléculas de pesticidas. Três delas dominam mais de 50% do mercado global de sementes (Monsanto, Dupont e Syngenta). Estas empresas, hoje já com outros nomes, porque se fundiram ou foram absorvidas por outros conglomerados internacionais da China e do Japão, em paticular, começaram incorporando empresas privadas de pequeno e médio porte de melhoramento genético vegetal (soja e milho, principalmente), e posteriormente, iniciaram investimentos bilionários na obtenção de novos produtos geneticamente modificados. 

Com o comércio mundial de grãos acontece a mesma coisa. Quatro corporações gigantes dominam esse mercado, deixando pouco espaço para transações diretas entre pequenos e médios fornecedores e compradores. Conhecidas pelo acrônimo de ABCD (iniciais para ADM, Bunge, Cargill e Dreifuss), essas quatro multinacionais controlam a compra e a venda dos grãos produzidos mundo afora, em boa medida, porque também controlam a logística de armazenagem e de transporte. Empresas menores têm dificuldade para participar desse comércio, dada a falta de infraestrutura em silos e armazéns nos terminais marítimos de origem e destino dos grãos e de navios graneleiros de grande porte para transportar o produto através dos mares.   

Buscando alterar essa rotina de compra, armazenagem, transporte e venda dos grãos pelo mundo, em outubro de 2013, o Banco HSBC reuniu em Pequim, China, empresários do mercado de grãos do Brasil, com empresários do mesmo ramo da China, buscado um espaço para transações diretas entre eles, tendo o Banco como facilitador dessas operações. 

Embora a iniciativa seja louvável, dado o potencial de acrescentar competição nesse mercado quase cativo das quatro irmãs, nenhum negócio foi realizado entre as partes, dadas as dificuldades de logística dos atores envolvidos no processo. Mas o governo chinês avançou sem a parceria do Brasil, fortalecendo empresa estatal COFCO, já com potencial para incomodar as quatro irmãs. 

As grandes empresas atuais já foram pequenas e venceram, unindo suas potencialidades. O Brasil não pode ficar parado se quiser ter participação no comércio dos grãos que produz, igual fez a China. 

Para competir com os grandes é necessário também ser grande, sem pretender afirmar que Davi não possa vencer a Golias. 

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