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A medida provisória 609/2013 trouxe (des)oneração tributária da cesta básica e alguns tons de inconstitucionalidade


Opinião Livre
Em louvável iniciativa, o Governo Federal editou a Medida Provisória n. 609 e o Decreto n. 7.947, com publicação no Diário Oficial da União em edição extra no dia 08 de março de 2013, objetivando desonerar a tributação incidente sobre diversos produtos essenciais e vinculados à cesta básica, entre eles, carne (bovina, suína, aves, peixe, caprinos e ovinos), café, manteiga, margarina, açúcar, sabonete, produtos de higiene bucal e papel higiênico. A desoneração se deu por meio da redução das alíquotas de PIS/PASEP e COFINS e IPI em tais produtos para zero (0%).
Muita embora esta medida governamental deva ser naturalmente objeto de comemoração e incentivada, infelizmente, alguns pontos merecem maior reflexão, sobretudo, quando se notam vícios que levam à inconstitucionalidade a ponto da desoneração preconizada se transformar em aumento de tributos.
Neste aspecto, temos as alterações realizadas pela Medida Provisória n. 609 que, ao impedir a aplicação dos arts. 8º e 9º da Lei n. 10.925/2004 (art. 2º da MP) ou revogar o art. 4º da Lei n. 12.599/2012, geraram, na etapa anterior àquela que fará a comercialização de produtos com alíquota zero, o retorno da venda de insumos sem suspensão do PIS/COFINS, como, por exemplo, na cana-de-açúcar ou do café.
Portanto, a partir da alteração realizada em 08 de março de 2013 pela Medida Provisória n. 609, para as pessoas jurídicas que vendem no mercado interno insumo destinado à fabricação dos produtos desonerados mediante alíquota zero de PIS/COFINS, em verdade, houve um aumento imediato em sua carga tributária, pois, ao invés de comercializarem com suspensão farão com tributação por tais contribuições às alíquotas de 3,65% (lucro presumido) ou 9,25% (lucro real).
Como sabemos, a Constituição Federal impõe como garantia a todo e qualquer contribuinte a chamada anterioridade prevista nos arts. 150, III, “c” e 195, § 6º, de maneira que qualquer aumento de tributo, de forma direta ou indireta, somente poder surtir efeitos após 90 dias de sua publicação (STF, ADI 2.325). A Medida Provisória exclui de forma imediata a venda com suspensão para pessoas jurídicas que não se beneficiarão da comercialização com alíquota zero de PIS/COFINS, na medida em que estão na cadeia produtiva anterior, sofrendo, portanto, imediato aumento de carga tributária, sem a observância dos 90 dias a partir da publicação, o que torna neste ponto inconstitucional referida alteração legislativa.
Este não é o único vício constatado, uma vez que temos ainda equívocos ligados ao setor do açúcar tanto para PIS/COFINS como para o IPI.
Isto porque, tanto a Medida Provisória n. 609 quanto o Decreto n. 7.947 tiveram sua vigência iniciada no momento da publicação, ou seja, dia 08 de março de 2013. Neste momento, tais atos normativos desoneraram inicialmente o açúcar com classificação fiscal NCM 1701.14.00 (açúcar de cana bruto), olvidando-se de também incluir NCM 1701.99.00.
Com a finalidade de corrigir o equívoco, no dia 13 de março de 2013, publicaram novamente parte da Medida Provisória n. 609 e do Decreto n. 7.947, com a informação “retificações”, reduzindo para zero a alíquota de PIS/COFINS e IPI do açúcar NCM 1701.99.00, porém, exclui-se da desoneração aquele de classificação fiscal NCM 1701.14.00. Equivale dizer, este último açúcar sofreu uma redução da alíquota para zero no dia 08 e voltou a ser tributado (9,25% de PIS/COFINS; 5% de IPI) em 13 de março de 2013.
Segundo dispõe o art. 1º, § 4º, da Lei de Introdução das Normas (DL n. 4.657/42), de forma clarividente, “as correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova”. Portanto, as alterações realizadas posteriormente à Medida Provisória e Decreto citado, mediante “retificações” publicadas em 13 de março do corrente ano, devem ser apreciadas como lei nova. Equivale dizer: tínhamos a partir de 08 de março uma legislação vigente que desonerava o açúcar com alíquota zero para PIS/COFINS e IPI, porém, houve uma “lei nova” que, de forma imediata, implicou em majoração de tais tributos mediante alíquotas de 9,25% (PIS/COFINS) e 5% (IPI).
Bem por isso, temos aqui mais um tom de inconstitucionalidade ao realizar o aumento imediato de tais tributos sem observar, mais uma vez, a anterioridade tributária, que exige expressamente em tais situações que a majoração somente produza efeitos após 90 dias da publicação (STF, ADI 4.661).
Assim, além de problemas vinculados ao próprio repasse da desoneração fiscal em virtude de dificuldades de fluxo de caixa causado aos contribuintes em geral, em especial, com possível acúmulo de créditos a serem recebidos após longo tempo e sem atualização, infelizmente, tais alterações geraram em alguns pontos, deveras, oneração da carga tributária e de forma inconstitucional.
* Sócio do Brasil Salomão E Matthes Advocacia. É advogado Membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) do Ministério da Fazenda. É Membro titular do Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Mestre e Doutorando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica – PUC/SP, especialista em Direito Tributário Internacional pela Universidad de Salamanca – Espanha, e também pelo IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Na área acadêmica, atua como professor de graduação e pós-graduação na UNISEB-COC, como professor convidado na Fundação Álvares Penteado (FAAP), PUC/SP, IBET, na Universidade Estadual de Londrina (UEL), entre outras. O advogado ainda é autor das obras “Limites ao Poder de Reforma da Constituição: o embate entre gerações” e “O Princípio da Razoabilidade: um limite à discricionariedade administrativa”, ambos publicados pela Editora Millennium, bem como é co-autor dos livros "Processo Adminitrativo e Judicial Tributário", PIS e COFINS e o regime da não-cumulatividade, "Processo Judicial Tributário", Parcelamento Tributario, Direito Tributario Cooperativo, Mandado de Seguranca em Matéria Tributária. É sócio do Brasil Salomão E Matthes Advocacia.

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