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A armadilha da securitização dos financiamentos agrícolas



Luciano Duarte Peres

Dados atualizados revelam que mais de 160 mil produtores rurais estão inadimplentes nos contratos de securitização, com uma dívida que supera a casa dos 7 bilhões de reais em todo o País

Há alguns anos o governo federal criou o programa de securitização dos financiamentos agrícolas, com o objetivo de recuperar o crédito dos produtores. A securitização é uma ferramenta financeira utilizada para obtenção de fundos e divisão de riscos. "Isso significa que a dívida que produtores tinham com bancos foi comprada pela União, que agora é responsável pela cobrança", afirma o advogado Rodrigo Duarte da Silva.

Não é de hoje que os bancos, após verificarem a situação de inadimplência de seus devedores, na maioria das vezes geradas pelos próprios bancos (através da cobrança de juros exorbitantes e taxas ilegais que tornam as dívidas impagáveis) passam a oferecer re-parcelamentos vantajosos, com desconto inicial de valores relativos aos juros e aumento do número de parcelas para quitação da dívida. Mas por trás dessas supostas vantagens escondem-se cláusulas abusivas e ilegais que somente serão percebidas pelo devedor ao longo do período de re-parcelamento oferecido, e, especialmente, quando este tornar a inadimplir.

Esse é exatamente o caso da chamada securitização dos empréstimos rurais oferecidos pelo Banco do Brasil (conhecido como PESA – Programa Especial de Saneamento de Ativos), que foi apresentado como a grande saída aos produtores rurais inadimplentes do País com os pagamentos dos empréstimos contraídos para o financiamento da produção.

As dívidas dos produtores são geralmente contraídas em função de um conjunto de fatores negativos, como adversidades climáticas, câmbio valorizado, pragas e doenças, elevação de custos de produção e deficiência de infra-estrutura. Tudo isso gera um grande impacto sobre a renda e liquidez do produtor rural. Em conseqüência disso, muitos encontram dificuldade em honrar compromissos financeiros, seja com fornecedores, sistema oficial de crédito rural etc e acabam apelando para empréstimos bancários – que por sua vez cobram taxas e juros que tornam a dívida impagável.

A securitização, a primeira vista, pode parecer um negócio vantajoso ao produtor, já que permite o re-parcelamento dos valores devidos com alongamento do prazo de pagamento e uma inicial diminuição da parcela mensal devida. "Porém, com o passar do tempo o produtor rural percebe que, apesar de efetuar os pagamentos na forma acordada com o banco, seu saldo devedor não se reduz – ao contrário, passa aumentar de forma astronômica ano a ano", explica o advogado Luciano Duarte Peres.

A maior armadilha da securitização, segundo Peres, aparece apenas caso o produtor, por dificuldades financeiras, torne a inadimplir com o pagamento da dívida. "Caso isso ocorra, será o produtor rural surpreendido com a inscrição de seu nome em dívida ativa e com ajuizamento de uma execução fiscal contra si", afirma.

O que acontece é que, ao firmar o contrato de securitização, o produtor rural anui com transferência de sua dívida para a União, ou seja, ele deixa de dever ao Banco e passa a dever para a União. "Assim que a União passou a ser responsável pelas dívidas agrícolas, muitos produtores acharam que o pagamento seria mais brando. Mas o que está acontecendo é justamente o contrário. Os empréstimos estão sendo cobrados agora de forma indevida", diz o advogado.

E completa: "isso faz com que as dívidas securitizadas passem a ser calculadas com base nos índices de atualização dos impostos (leia-se incidência da TJLP) e possibilita a incidência das pesadas multas por inadimplemento fiscal, que fazem com que a dívida fique, em geral, até cinco vezes maior do que o valor inicialmente securitizado", esclarece.

Liminares favoráveis aos produtores rurais já vem sendo obtidas em Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo, em ações revisionais de contrato já ajuizadas no Judiciário dos referidos Estados. Em Santa Catarina, principalmente a região serrana, muitos produtores estão passando pelo mesmo problema.

"Cabe aos produtores rurais, de forma individual ou organizados em associações, buscarem seus direitos junto ao Judiciário, fazendo valer os instrumentos legais de proteção ao consumidor não ficando simplesmente a mercê da impositiva e abusiva cobrança pela União de valores que, na verdade, dão oriundos de empréstimos bancários rurais e que não podem ser tratados como débitos fiscais, como vem ocorrendo com os produtores inadimplentes com os pagamentos dos re-parcelamentos oriundos da securitização", diz o advogado Luciano Duarte Peres.

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