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Uma nova agricultura


Opinião Livre

Cole Genge, Oficial da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura  (FAO) – Doutor em Políticas e Administração e Mestre em Desenvolvimento Rural pela Universidade de Massachusetts e Engenheiro Florestal pela Universidade Estatal de de Washington.
  
É hora de imaginar uma agricultura ideal.

Neste agricultura, a monocultura e a produção insustentável são substituídas por práticas que cuidam do solo e mantém sua cobertura de forma permanente, fazendo a rotação de culturas para não esgotar os nutrientes do solo. Nesta agricultura, os benefícios  da terra alcançam todos aqueles que trabalham com suas mãos, e não caem nas mãos de um pequeno grupo de grandes empresas.

Neste agricultura, a produção rentável coexiste com a proteção do ambiente e dos recursos naturais, alterando minimamente o solo por meio do plantio direto e do cultivo mínimo e protegendo a sua cobertura com material orgânico.

O que descrevo são os princípios básicos que inspiram a agricultura de conservação e que a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) promove não apenas como um exercício de imaginação, mas como uma nova maneira de fazer as coisas. E, este modo de operação não é apenas uma opção, tornou-se uma necessidade urgente.

Este tipo de agricultura é o que precisamos para enfrentar as mudanças climáticas e aumentar a renda dos pequenos agricultores. É também a que nos permitirá alimentar as 800 milhões de pessoas que sofrem de fome no mundo e nutrir de forma equilibrada mais de 600 milhões de pessoas que vivem com a obesidade.

Avançar para uma forma holística de produção de alimentos requer vontade política e trabalhar de maneira muito próxima aos milhões de pequenos agricultores, mas requer, acima de tudo, a responsabilidade moral. Devemos ter sabedoria necessária para avançar em direção a um modelo de desenvolvimento que não favoreça o benefício imediato, mas que insira-se de maneira harmoniosa no mundo, em seus tempos e ciclos naturais.

Exige, da mesma maneira, desfazer os danos que fizemos, já que mais da metade das terras utilizadas para a agricultura no mundo estão degradadas. Recuperá-las não é apenas uma prioridade para o desenvolvimento rural e agrícola. É um dever humanitário porque 40% da população mundial depende diretamente da agricultura para a sua subsistência.

Seguir no caminho que temos percorrido até agora não é simplemente uma opção, já que nos levou à beira de um abismo.  Hoje, a agricultura familiar é uma das maiores emissoras de gases de efeito estufa, ocupa até 70% da água doce e expande-se à custa dos próprios recursos dos quais se baseia nossa sobrevivência e bem-estar.

Mas ainda temos tempo para gerar mudanças. Temos o conhecimento necessário para adotar uma forma de produção que faz a gestão dos recursos naturais de forma integrada, e que não somente produz, mas que também conserva e melhora.

Entretanto, estas mudanças devemos fazer hoje, não quando a população mundial chegue aos 9 bilhões de habitantes e as mudanças climáticas tornem-se uma catátrofe mundial, já que gerar uma mudança na forma como produzimos alimentos não afetará apenas os agricultores. Pelo contrário, tem o potencial de revolucionar a forma como os seres humanos se relacionam com o meio ambiente, restaurar os danos causados aos recursos naturais e considerar os efeitos do nosso modelo de produção ao longo de toda a cadeia alimentar, desde o plantio de sementes até a chegada dos alimentos às nossas casas e, mais além, já que um terço da comida que produzimos acaba no lixo.
 
A América Latina e o Caribe têm condições necessárias para desenvolver esta nova agricultura. A região possui uma biodiversidade e riqueza que a tem permitido contribuir em 5% do crescimento da produção mundial de alimentos ao longo dos últimos 30 anos. No mesmo período, é a região que tem feito os maiores progressos na redução da fome.

Se a região muda a sua maneira de produzir e adota práticas da agricultura de conservação, os efeitos podem ser sentidos em todo o mundo. Mas fazer isso não é fácil. Exige sistemas de inovação adaptados às condições locais e, também, requer muita técnica e científica e sistemas de apoio público aos pequenos agricultores.

Mas quando são feitas as mudanças, os benefícios se sobressaem. Na América Latina e no Caribe, a FAO apoia inúmeras iniciativas nacionais que desenvolvem sistemas integrados de rotação de cultivos, que plantam leguminosas para incorporar nitrogênio ao solo.

Outros desenvolvem cultivos adaptados localmente e incorporam gado, árvores, polinizadores e formas naturais de realizar controle de pragas e doenças. Os incentivos econômicos sempre buscarão manter o status quo. Por isso, depende de nossa geração lutar contra a inércia e gerar a agricultura que o mundo atual necessita. Uma agricultura que não somente nutre as pessoas mas, também, o planeta.

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