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SENTIREMOS SAUDADES DELE


Amélio Dall’Agnol

No próximo dia 1º de janeiro Fernando Henrique Cardoso deixará o cargo de presidente do Brasil. Sem pretender ser demagogo com falsos elogios, mesmo porque isso se faz com quem está entrando e não com quem está saindo, reservo-me o direito, como eleitor e cidadão deste país que ele governou durante oito anos, tecer alguns comentários sobre este que foi e sempre será lembrado como um dos nossos maiores estadistas.

Reconheço a possibilidade de ser alvo de críticas mordazes de parte dos que injustamente negam a FHC os méritos pelo que fez e apenas enxergam o que deixou de fazer, acusando-o, inclusive, de ter traído a si próprio rasgando o que escreveu.

Não tenho lido o que FHC escreveu antes de tornar-se o político que é, mas mesmo que tenha dito algo diferente do que pratica, isso não o torna um ser estranho no contexto de uma sociedade que muda constantemente, obrigando homens racionais a recuar, rever posições e mudar de lado. "Aqueles que nunca voltam atrás em suas opiniões, amam mais a si mesmos do que amam a verdade", afirmava Joubert, enquanto JK, reconhecido como um dos nossos maiores presidentes, dizia que costumava voltar atrás em seus posicionamentos porque não tinha compromissos com o erro. "Triste não é mudar de idéia, triste é não ter idéias para mudar" (Barão de Itararé).

Um presidente que acabou com a hiper-inflação, que elevou a auto estima do seu povo, que incorporou milhões de cidadãos ao mercado consumidor, que recuperou o respeito, a dignidade e elevou o prestígio do nosso país no exterior, merece consideração. Comete erros, como não, errar é humano. Só Deus é perfeito, mas Ele administra uma outra "sociedade", onde só tem "gente" boa. No nosso planeta só erra quem faz e é preferível errar fazendo do que não cometer erros assistindo as coisas acontecerem. "O progresso é realizado pelos homens que fazem e não pelos que discutem de que modo as coisas não deveriam ter sido feitas" (Franklin D. Rooservelt, presidente americano).

Seria oportuno admitir que todos temos, ademais do dever de acertar, o direito de errar. FHC, também. No entanto, não é justo cobrar deste presidente a solução de todos os males que afligem a nossa sociedade, muitos deles tão antigos quanto o próprio País. Creditemos a ele o mérito pelo fim de alguns desses problemas e pelo encaminhamento para uma quase solução de outros, sem valorizar demasiadamente aqueles que ainda persistem insolúveis.

Se bem ainda não podemos comemorar uma distribuição eqüitativa da renda nacional, ao menos podemos sentir que a economia está crescendo no rumo certo e que um dia chegaremos lá. Já estamos vendo luz no fim do túnel, depois de décadas sem sequer saber se existia um túnel. "O mais importante da economia de uma nação não é a situação em que ela se encontra, mas a direção na qual ela se move" (Raul Prebisch, economista argentino).

Numa democracia como a nossa, a autoridade do presidente é a maior, mas não é a única. Ele não governa o País sozinho. Divide o poder com o Legislativo e com o Judiciário, de quem precisa concordância para implementar as reformas que todos reconhecemos necessárias. Uma coisa é querer fazer o que se disse e bem outra é poder fazê-lo.

Governar é espinhoso, mas bem que poderia ter sido menos desagradável para FHC se os aliados se comportassem como tal, não exigindo tantos benefícios em troca do apoio que lhe renderam. O Presidente foi, até, acusado de omisso por negar-se a bancar o juiz na disputa entre aliados, cada lado pretendendo, naturalmente, que o "juiz" decidisse a seu favor, pois os ilícitos dos outros são sempre muito maiores do que os próprios, de vez que é mais visível um graveto no olho do adversário do que um tronco no próprio olho.

Considerando a dependência que o Presidente teve do Congresso para processar as reformas necessárias à modernização deste país e considerando as dificuldades que teve para aprová-las, pareceria que a sociedade equivocou-se na escolha de um bom número de políticos, mais preocupados consigo mesmos do que com os destinos do País. A presença de delinqüentes no Congresso deve ser encarada como natural - visto que o Congresso é uma amostra fiel da sociedade - mas é inaceitável que essa bancada podre seja maior do que a parcela que ela representa na sociedade.

Para que o Brasil concretize o eterno sonho de ser o país do futuro, precisa começar a ser mudado agora; um trabalho lento e paciente, que começa por uma melhor educação e conscientização das nossas crianças. Enquanto essa nova geração não chega, é nosso dever oferecer aos próximos Mandatários da Nação uma maior representação de bons políticos, deixando sem mandato e aos cuidados da justiça notórios cafajestes, que têm buscado e, muitos vezes encontrado no Parlamento, a impunidade para seus delitos.

A propósito, pelos resultados da última eleição, parece que essa mensagem foi captada pelo eleitor, que rejeitou um bom número de notórios delinqüentes, Brasil afora. "O grande desfecho civilizatório, num futuro não muito distante, será o triunfo da moral e da ética sobre o poder e a política" (Fernand Braudel, historiador francês).

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