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Revolta da cidadania


Decio Luiz Gazzoni

Há males que vem para o bem, como a MP 232, que está promovendo um surto de cidadania contra o avanço desmedido dos governos sobre o bolso da sociedade, pela via do aumento de impostos. A gota d´água foi a edição da MP232, ao final do dia 31/12/04, para vigir no dia seguinte. A reação da sociedade, por suas entidades representativas, está sendo vigorosa, objetivando a revogação do aumento de impostos embutido na MP 232. Porém, espera-se que o movimento vá além e questione a alta tributação no Brasil vis a vis os péssimos serviços prestados à população, revivendo o movimento cívico “Diretas já”.

 

Responsabilidade fiscal

É peculiarissima a interpretação da Lei de Responsabilidade Fiscal. O espírito da Lei, com o apoio integral da sociedade, é: “Não pode o administrador público gastar mais do que arrecada, sob as penas da Lei. Já o administrador público interpretou: “Não posso arrecadar menos do que gasto”. Sutil mudança, que suprime os benefícios da Lei. Ao invés de conter gastos, aplicar melhor, ser mais rígido, coibir a corrupção e a sonegação, enfim, administrar, o governante aumenta impostos. Assim até eu, até você leitor, até qualquer brasileiro que cumpra os requisitos constitucionais pode ser Presidente, Governador ou Prefeito.

 

Derrama

A motivação da Inconfidência Mineira foi a derrama da Coroa portuguesa. Os argentinos revoltaram-se ao ver que, além dos tributos, o Governo tomou a sua poupança para a farra da gastança, e agora não tem como devolvê-la. Já, aqui na terra do Carnaval, tudo é festa. O IPTU é fortemente majorado em administrações do PT, do PFL, do PPB ou de qualquer partido que esteja no poder, transferindo para a sociedade o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, e ninguém reclama! Rodovias são privatizadas e o IPVA majorado. O caso do IRPF é didático: a alíquota foi alçada de 25 para 27,5% (10% de aumento) e outros 49% foram confiscados pela não correção da Tabela. De acordo com a Folha de São Paulo (23/1/05), 46,99% do salário da classe média é devorado por tributos diversos. Já o site www.contribuintecidadao.org.br aponta que 62,3% do salário são tungados por tributos. Você trabalha 18 dias de cada mês apenas para pagar impostos!

 

Acinte e falta de visão

O Governo diz que “perde receita” se corrigir a tabela do IRPF. Meu dinheiro pode ser confiscado por impostos que não devo, mas minha inteligência não o será! Como pode ser devido um imposto sobre uma reposição inflacionária, em que o poder aquisitivo não variou ou sequer foi restabelecido? A visão arrecadatória unilateral não analisa o impacto da majoração de impostos nas cadeias produtivas, reduzindo margens e eliminando empresários do agronegócio, ou forçando-os a esconder-se na marginalidade da sonegação, pela impossibilidade da convivência com altos tributos. Nem vê os empregos que são destruídos.

 

Pressão tributaria

A pressão tributária no Brasil ultrapassa a 35% do PIB. No México, com indicadores macro-econômicos semelhantes, ela é de 16% do PIB, sendo de 30% nos países sociais democratas da Europa. Porém lá o ensino e a saúde funcionam muito bem e são gratuitos. Há segurança pública e o contribuinte tem contrapartida para seus impostos, que são usados até para o famigerado subsídio agrícola. Aqui em Pindorama, pagamos um dos mais altos impostos do mundo, mas a saúde é um caos, a segurança pública dispensa adjetivos, a educação deixa a desejar, as estradas estão esburacadas e a divida publica cresceu 300% em 7 anos.

 

Paralelo

Imagine alguém agindo como o Governo. O pecuarista que tivesse seus custos aumentados em 20% cobraria do frigorífico 20% a mais pela arroba do boi? O canavieiro que aumentasse 20% no seu custo cobraria da usina 20% a mais pela cana? O frigorífico e a usina pagariam sem chiar? Pela lógica tributária governamental, o mau produtor de soja poderia cobrar 20% a mais do importador europeu. O empregado diria ao patrão: a minha despesa lá em casa aumentou 20%, portanto meu salário será 20% maior! Dá para imaginar? Se não dá, por que o Governo não gasta apenas o que a sociedade pode pagar, ao invés de arrecadar o que gasta? Se a Lei não prevê punição para tributação excessiva, talvez o eleitor possa se encarregar de punir maus administradores.

 

O autor é engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja. Homepage: www.gazzoni.pop.com.br

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