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Prece do feijão


Climaco Cezar de Souza
Sou a planta menos conhecida, não falo inglês e até já fui considerado vulgar, embora alimento fundamental e sadio daqueles que lutam e que muito batalham pela vida.

Certamente, não freqüentei altares e nem participei do alimento simples dos justos cristãos iniciais, embora sendo mais antigo do que eles. Contudo, muito me orgulho de ser a salvação dos pobres cristãos da América latina e da África e outros, ou seja, sou a caridade real e constante de Deus.

 
Nos ricos: Sul, Sudeste e Centro-Oeste me vêem como dinheiro e como oportunidade, mas nos pobres: Norte e Nordeste sou o maná de Deus e o milagre das chuvas de São José, “o humilde e obediente”; do paizinho Padre Cícero, “o pai dos pobres”; de São Bartolomeu e de outros protetores dos famintos.

Os que são pobres e os que têm fome, primeiro se refugiam em mim e, na ocasião dos seus plantios, sou o primeiro a ser lembrado e isto até 3 vezes por ano. Produzo até a “cem por um” e faço isto sem reclamar e sem criticar os grãos nobres, apenas anuais.

Tenho muitas cores, e até gosto, mas me sinto mais prestigiado com as cores dos pobres e dos humildes, ou seja, a marrom e a preta.

Não freqüento muito terras caras, mas faço mais parte do dia-a-dia de todos os quintais, beiras de corguinhos, de laguinhos e de riozinhos e quase sempre das cercas dos animais humildes e até dos cultivos “chics”.

Exijo apenas um pouquinho de chuva no momento certo e cuidado no trato, mas sou o mais rápido do mundo em premiar e em mitigar a fome dos que de mim dependem. Posso premiar com muito e bom alimento em até 60 dias.

Meus amigos constantes são ferramentas humildes como enxadas e foices e sou adubado diariamente, mas apenas pelo suor dos pobres e pelo esterco humilde dos animais, também humildes e famintos como seus donos. Não sou prioridade para nenhum governo, mas me orgulho de sê-lo para os de mãos calejadas, de chapéu na testa e de pés descalços.  

Meu conteúdo já é considerado um alimento perfeito e, por isso, por muitos anos sou considerado o alimento inteligente daqueles menos brindados com estudos e conhecimentos.

Também sou o alimento preferencial daqueles que não puderam nascer brancos, nem ricos, nem patrões, mas pretos, pobres e escravos.

Não freqüento festas, comemorações e alegrias, verdades ou mentiras, dos ricos. Contudo, freqüento todos os dias de alegria da “feijoada” dos mais pobres, do “acarajé” dos alegres e religiosos, do “tutu” dos torresmeiros. Em parceria com os também humildes arroz, carne de porco e ovo, faço milagres no “casadinho” de cada almoço ou no “mexidinho” requentado do final de noite.


Só recente, com o tal do “naturismo”, das doenças do coração, da diabetes e de outras, passaram a me dar mais valor, pois já estão percebendo que os grãos mais nobres, ou seus destinatários, não colaboram como eu para uma alimentação saudável e equilibrada.

Sem modéstia, até os grandes cientistas já consideram minha parceria com o arroz e a carne de porco (também, como eu, vindos dos mais humildes da Ásia) como o alimento ideal para todo o Mundo, sobretudo para os ricos e obesos. Chic né? Quem diria né? Viva eu, né?

SOU O FEIJÃO

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