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Os Terroristas do Mercado


Amélio Dall’Agnol
Oportuna a manifestação do Presidente Lula feita em 15/7/2005, em pleno território francês e diante das mais altas autoridades locais, contra o protecionismo e os subsídios com que aquele governo brinda os seus produtores rurais. Intervenção semelhante havia sido feita em 2002 por Fernando Henrique Cardoso, em uma das suas últimas viagens ao velho continente como Presidente do Brasil, quando, visitando a Espanha e a própria França, falou contra “os que pregam o livre comércio, mas praticam o protecionismo”, salientando os Estados Unidos, mas querendo, sem dúvida, também atacar os Europeus, que são, até, mais protecionistas que os norte americanos. Barbárie, disse ele, não é somente a covardia do terrorismo, mas, também, a intolerância ou a imposição de políticas unilaterais em escala planetária.

Estamos nos preparativos para mais uma rodada de negociações entre os 148 membros que integram a Organização Mundial do Comércio (OMC), a realizar-se no próximo mês de dezembro, em Hong Kong, China, dando seqüência à rodada de Doha (a quem doer). Certamente, mais uma vez teremos os “desenvolvidos” defendendo a abertura ampla e irrestrita dos mercados, mas somente aos produtos para os quais eles detêm amplas vantagens competitivas. Paralelamente, continuarão defendendo o direito de proteger os seus mercados contra a entrada de produtos agrícolas do Terceiro Mundo e de promover a produção agrícola em seus territórios à custa de mais subsídios.
Neste encontro, como nos anteriores e nos próximos, vencerá a vontade dos poderosos, já que o argumento do mais forte é sempre o melhor, segundo afirmou certa vez um diplomata canadense na OMC. A proposta desses encontros é sempre a mesma: ampliar o intercâmbio comercial mundial e disciplinar a sua implementação. O grande enrosco da OMC são os produtos agrícolas, com os quais o Brasil canta de galo: o Brasil está para a agricultura como China está para os manufaturados: é uma potência agrícola a cujo tamanho e eficiência poucos competidores são capazes de igualar (Financial Times).
Todos sabem como terminaram propostas semelhantes feitas no passado. A abertura aconteceu, mas de parte de quem menos podia: os países pobres. O Primeiro Mundo fechou-se ainda mais, embora pretendam que acreditemos no contrário. O que eles realmente gostariam de propor, mas não podem dizê-lo, é escancarar o mercado para os produtos industrializados de alta tecnologia, com os quais são imbatíveis e deixar o comércio dos produtos agrícolas como está, já que não têm condições de competir com países em desenvolvimento, como o Brasil. Lutemos por uma ordem mundial que reflita um contrato entre nações realmente livres e não apenas o predomínio de uns Estados sobre outros, de uns mercados sobre outros (FHC).
 Terrorismo não é apenas o vandalismo praticado por Bin Laden e seus asseclas, que matam explodindo prédios, trens ou ônibus. Também o é a superganância das nações poderosas que matam de fome e de doenças cidadãos indefesos de nações pobres, quitando-lhes uma renda que acabam não tendo por obra dos subsídios e do protecionismo das nações ricas.

A propósito de Bin Laden, talvez valha a pena refletir sobre os reais motivos que impulsionam um cidadão rico e culto como ele, a levar uma vida de fugitivo e a gastar a sua fortuna pessoal em abomináveis atos contra a humanidade. Em boa medida, a revolta desse homem e de muitos outros cidadãos mundo afora - brasileiros no meio - poderia ser atribuída à inconformidade contra a opulência das sociedades “desenvolvidas”, construída, em parte, com a exploração do trabalho e das riquezas de nações pobres, o que trouxe mais pobreza aos já pobres e acumulou mais riquezas nas mãos dos já ricos.
É uma falácia a proposta de livre mercado patrocinada pelos países industrializados, que, impondo regras unilaterais de intercâmbio comercial decidem o preço a pagar pelo que adquirem das nações menos desenvolvidas e, também, o quanto estas deverão pagar pelo que compram deles. Isto não é livre comércio, é terrorismo de mercado.
A propósito de opulência: sempre houve o suficiente no mundo para todas as necessidades humanas; nunca haverá o suficiente para a cobiça humana (Mahatma Ghandi).

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