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O AGRONEGÓCIO NO PANTANAL E A NECESSIDADE DE DIVERSIFICAÇÃO AGROPECUÁRIA


Luiz Marques Vieira

A sobrevivência das fazendas no Pantanal e entorno está muito relacionada com a sua localização geográfica, volume de negócios, produtividade, competitividade e potencial de diversificação da produção em bases ecossustentáveis.

 

No passado recente, a grande extensão das unidades de produção, apesar da baixa produtividade, garantia a manutenção de um bom nível de renda aos proprietários rurais e a sobrevivência de famílias numerosas de empregados. É claro que, atualmente, a unidade de produção para ser competitiva deve, além de área suficiente e eficiência compatíveis com os produtos ofertados, deve ser capaz de gerar produtos de boa qualidade e de baixo custo. Para que isso se torne realidade, a unidade produção deve contemplar, preferencialmente, abundância e diversidade de recursos naturais, principalmente de fitofisionomias.

 

Além da pecuária de corte, é preciso viabilizar alternativas econômicas para melhorar o fluxo de caixa e, se possível, atender as despesas correntes de custeio. Não estou me referindo à pecuária tradicional até então praticada na região, pois tudo indica que ela esteja com os dias contados. Além disso, a sobrevivência da atividade pecuária, mesmo a inovadora, com a oferta de produtos de qualidade, como por exemplo a produção do vitelo pantaneiro, está muito relacionada, a médio e longo prazos, com a sustentabilidade de seus recursos naturais, principalmente pastagens nativas de elevado valor nutritivo para atender às demandas dos bezerros em fase ativa de crescimento e que demandam dieta com teor mais elevado de proteína. Para que essas duas premissas se concretizem, torna-se necessário modernizar os conceitos e adotar modelos de gestão que sejam mais eficientes que os atualmente em uso pelos pecuaristas. Além disso, os sistemas de produção devem incorporar tecnologias que sejam de baixo impacto ambiental. E será isso possível? Com isso não estou dizendo que os atuais pecuaristas Pantaneiros são agressivos ao ambiente. Tudo indica que a adoção de tecnologias de produção compatíveis com a realidade regional deve constituir a base do agronegócio no Pantanal.

 

Técnicas de administração e gerência geral, se aliadas às práticas simples de manejo nutricional, reprodutivo e sanitário, sem dúvida alguma, incrementarão os índices de produtividade do sistema sem grandes investimentos e sem onerar de maneira significativa o custo de produção. Entretanto, a implementação desse modelo depende da sensibilidade, vontade, criatividade e capacidade do pecuarista para eleger e ajustar as tecnologias que irão compor os novos agrosistemas. É preciso que elas sejam ecossustentáveis, esteja validada e disponível. Nessa etapa a Embrapa Pantanal poderá contribuir muito. É claro que a sustentabilidade dos novos sistemas de produção demanda técnicas de manejo dos recursos naturais sem perder de vista a sua dinâmica temporal produtiva. Para que a tecnologia esteja validada e disponível, implica, muitas vezes, em meticuloso processo de geração e transferência dos resultados da pesquisa para os produtores. Está implícita a necessidade de recursos humanos bem treinados e disponibilidade de recursos financeiros para custeio e investimentos. Será que as instituições responsáveis pela promoção do desenvolvimento harmonioso dessa região estão contando com a infra-estrutura indispensável para gerar e transferir os conhecimentos e tecnologias que a sociedade regional tanto demanda? Ou estamos adequando a demanda regional à nossa efetiva capacidade de fazer pesquisa e ajustando-a aos parcos recursos públicos que se dispõe atualmente?

 

É preciso refletir e avaliar se o que estamos gerando está efetivamente atendendo aos anseios da comunidade. Se essa premissa não estiver sendo satisfeita, que sejamos humildes e corajosos para procedermos os ajustes na nossa agenda de pesquisa. O nosso foco não pode perder de vista que a pesquisa deve promover o desenvolvimento regional em bases ecossustentáveis. É esta a nossa grande e nobre missão enquanto intitulados pesquisadores atuando numa Empresa Pública como a Embrapa Pantanal. Entretanto, constatamos que algumas linhas de pesquisa não conseguem sair dos conhecimentos básicos. Esses, na verdade, são necessários para viabilizar aspectos relevantes que nortearão o funcionamento dos novos sistemas de produção e que por ocasião da demanda não se encontravam disponíveis na literatura. E isso também se aplica para área ambiental, pois não se pode excluí-la do enfoque de sistema de produção, pois também é parte integrante do ecossistema.

 

Muito embora haja crescente demanda no mercado nacional e internacional para produtos naturais de qualidade comprovada, muito pouco ou quase nada tem sido efetivamente realizado no Pantanal. Esse é ainda um dos segmentos muito pouco explorados e que pode oferecer boas perspectivas no campo empresarial regional. As preferências desses mercados por produtos agropecuários com padrão de qualidade certificada, tanto em termos zootécnicos quanto sanitários, constitui-se numa das grandes alternativas sócio-econômicas para muitas propriedades rurais localizadas no Pantanal e entorno. A criação de animais silvestres, em cativeiro, talvez se constitua numa excelente fonte adicional de renda, pois existem solos de boa fertilidade com topografia adequada e com potencial para produzir grande parte dos alimentos necessários à alimentação dos animais. O potencial é ainda maior no caso de propriedades localizadas nas bordas do Pantanal, pois, atualmente, há maiores facilidades de transporte dos insumos e comercialização da produção. Há informações de que os restaurantes finos, frequentados pelas elites das metrópoles brasileiras e do exterior, privilegiam esses produtos, comercializando-os a preços bem mais elevados em relação a outros tipos de carnes como a bovina, suína, caprina, ovina e de aves Será que os pequenos fazendeiros, se organizados em cooperativas, não poderiam vislumbrar essa alternativa como factível? Entendo que essa é outra linha de investigação que a Embrapa Pantanal poderá contribuir muito. Entretanto, há necessidade de equipes multidisciplinares atuando com enfoque em sistema de produção, o que muitas vezes demanda treinamento específico.

 

Uma outra alternativa que pode se tornar muito interessante no Pantanal é a produção de mel de abelhas, considerando que as dificuldades, detectadas inicialmente pela Embrapa Pantanal, sejam equacionadas. Entende-se que a organização de associações de classe regionais e cooperativas sejam algumas das formas de se organizar os produtores e viabilizar a comercialização dos produtos e subprodutos em bases mais econômicas.

 

Tudo indica que a diversificação da produção nas propriedades rurais no Pantanal, constitui-se numa alternativa inteligente para viabilizar a sua sobrevivência, principalmente nos períodos críticos, quando o preço mínimo estabelecido para determinado produto agropecuário se posicionar abaixo do custo de produção. As políticas de preços mínimos, nem sempre ajustadas às realidades e peculiaridades regionais. Em regiões onde ainda predomina a pecuária de corte com baixo nível de tecnologia, de modo geral os produtores se encontram descapitalizados e desestimulados. Eles acabam abandonando o campo dirigindo-se para os grandes centros urbanos. E para que essa situação não se intensifique no Pantanal é preciso nos despertarmos. Estamos assim, passivamente assistindo o crescimento e a intensificação do êxodo rural em muitas regiões brasileiras e a descontrolado crescimento de enormes favelas nas periferias das grandes cidades. Os sem terras procedentes da zona rural, aliados aos desempregados das áreas urbanas invadindo as propriedades particulares e a reforma agrária, desintonizada da realidade sócio-econômica brasileira, continua proliferando sem resultados palpáveis em muitas regiões do pais, como por exemplo nos assentamentos rurais existentes nas bordas das cidades de Corumbá e Ladário, em Mato Grosso do Sul.

 

Muito embora a pecuária bovina de corte, desenvolvida em sistemas de produção extensivos tenha se perpetuado por mais de 200 anos no Pantanal e adjacências e que ainda se mantém como a principal atividade econômica, há fortes indicativos de que o panorama terá que mudar nos próximos anos. Caso contrário, aqueles que insistirem, provavelmente serão obrigados a vender suas terras e provavelmente mudar de atividade. Talvez a criação de pequenos animais se constitua numa das alternativas econômicas para se incrementar a rentabilidade das pequenas propriedades e assentamentos rurais localizados nas bordas do Pantanal. Vários autores têm sugerido que a criação de capivaras em regime semi-intensivo, como alternativa econômica adicional interessante e rentável, se integrada às atividades de pecuária de corte nas bordas do Pantanal.

 

Além disso, tudo indica a existência de boas condições ambientais na região e perspectivas de mercado favoráveis à implementação de sistemas de produção de ovinos e caprinos para carne de boa qualidade sanitária e nutricional. No entanto, há necessidade adaptação e validação de tecnologias de produção à realidade do Pantanal e adjacências. É provável que os pequenos produtores e assentados rurais possam se beneficiar de um programa com esse enfoque. Entende-se que as grandes propriedades também apresentam potencial para tal diversificação na produção pecuária. Acredita-se que com essas opções, pode-se visualizar melhores perspectivas na performance sócio-econômica das unidades de produção da região do Pantanal e periferia. Também nesse aspecto os resultados da pesquisa gerados pela Embrapa Pantanal poderão em muito contribuir.

 

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Luiz Marques Vieira ([email protected]), Engenheiro Agrônomo, MSc. em Zootecnia e Doutor em Ecologia. É Pesquisador da Embrapa Pantanal na área de Qualidade Ambiental.

 

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