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Mais lei, menos emprego, menos técnica, menor sustentabilidade


Cons. Científico Agricultura Sustentável
Por Ciro Antonio Rosolem
As relações de trabalho no campo são regulamentadas pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), da mesma forma que na cidade. Mas, além da CLT, existe a NR 31 (Norma reguladora 31), de março de 2005, tem por objetivo estabelecer os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de trabalho em áreas rurais. Ali são definidos uma série de procedimentos, cuidados e normas. Por exemplo, a distância entre colchões de beliche deve ser de, no mínimo, 110 cm, ou ainda, devem ser considerados 0,60 m de mictório para cada trabalhador. A falta de observação deste conjunnto de normas caracteriza o tal “trabalho escravo”, que tanto temos visto na mídia. A punição normalmente é severa, indo desde a imposição de pesadas multas até detenções temporárias e boqueio de crédito. Essa legislação é tida como um transtorno no meio rural.

Após 7 anos de vigência desta norma, quais as consequências nas fazendas? É fato conhecido há muito tempo que, na maioria dos casos, a melhor técnica recomenda que o fertilizante seja colocado no solo, abaixo e ao lado das sementes. Mas, ao contrário disso, qualquer pessoa que viaje pelas áreas agrícolas mais importantes do País notará que, na maioria dos casos, se coloca todo o fertilizante na superfície do solo. Isso leva, muitas vezes, a aumento de risco da atividade, menor eficiência do insumo e enfim, perda de produtividade. O caso mais clássico é o do fósforo, elemento caro e finito, em boa parte importado. Outro problema muito comum é uso de máquinas distribuidoras de corretivos e fertilizantes em velocidade e espaçamentos maiores que os ideais, o que tambem resulta em menor eficiência do insumo, terreno manchado, lavoura irregular, aumento de risco e perda de produtividade e de qualidade. Essas falhas por certo diminuem a sustentabilidade do sistema.

Bem, e porque, sabendo disso, os agricultores não adotam o que seria o certo? Porque a indústria de máquinas acaba, em função da demanda, por oferecer máquinas que não seriam as mais adequadas para a agricultura brasileira? Um exemplo dessas máquinas são as semeadoras sem espaço para fertilizante. A resposta de 100% dos agricultores quando colocados frente a este questionamento é dizer que o aspecto operacional acaba prevalecendo. Ou seja, as máquinas precisam ter um altíssimo rendimento de campo, mesmo que em detrimento da melhor tecnologia. Por quê? Porque de outro modo seria necessário mais máquinas e, consequentemente, mais operadores. As máquinas existem, assim como existe financiamento favorecido para sua aquisição. Mas, e os operadores? Outra resposta unânime: quanto menos gente, melhor! Melhor porque as leis são inadequadas, porque há pouca gente treinada, porque os riscos de gerar empregos, treinar pessoas acaba sendo maior que o risco de usar tecnologia inapropriada. Gente, alguma coisa está errada. O agricultor assume o risco de fazer uma agricultura pior para escapar do risco de trabalhar com funcionário mal preparado, amparado por uma legislação exagerada.

Uma legislação que resulta em desemprego, desestimula treinamento, aumenta o risco da atividade e compromete a sustentabilidade do sistema precisa ser modificada. Mas, enfim, de quem é a responsabilidade? Não é mesmo interessante? Onde o governo exige dos outros, sobra governo. Onde o governo deveria esta presente com educação e treinamento, falta governo. Soa familiar?
*Membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e professor titular da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu).

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