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Irrigação agrícola: desafios e oportunidades de crescimento


Tiago Piassum

Por Tiago Piassum* e Cristiano Oliveira**

A irrigação é um componente crucial da agricultura moderna, vital para garantir a segurança alimentar e a sustentabilidade agrícola. Ao fornecer um suprimento confiável de água, a irrigação permite que os agricultores mitiguem os riscos associados a padrões de chuva erráticos e períodos prolongados de seca. Essa prática aumenta os rendimentos das culturas, melhora a qualidade dos produtos e possibilita o cultivo de culturas de alto valor que, de outra forma, seriam impossíveis de crescer. Em muitas regiões, a irrigação é a base da produtividade agrícola, sustentando os meios de subsistência rurais e contribuindo significativamente para a economia nacional.

Apesar dos avanços significativos, o Brasil ainda enfrenta desafios para realizar plenamente o potencial dessas tecnologias em comparação com outras nações agrícolas líderes. Abordar essas lacunas por meio de investimentos estratégicos é essencial para manter a competitividade do setor e promover o crescimento sustentável.

Em um contexto global, a cobertura de irrigação no Brasil permanece modesta em comparação com outros grandes produtores agrícolas, conforme demonstrado pelos dados apresentados na Tabela 1. De acordo com as informações anuais mais recentes de 2023, a área irrigada no Brasil constitui 13,2% de suas terras aráveis totais. Esse valor é significativamente menor que o dos Estados Unidos, que é de 19,3%, e da China, que lidera com 21,2%. A União Europeia também supera o Brasil, com 13,4% de suas terras agrícolas sob irrigação. Apesar do crescimento incremental ao longo dos anos — de 12,3% em 2010 para os atuais 13,2% — o ritmo de expansão da infraestrutura de irrigação no Brasil fica atrás desses concorrentes globais.

O desenvolvimento da irrigação no Brasil enfrenta vários desafios significativos. O alto custo de implementação e manutenção dos sistemas de irrigação é uma barreira importante. Pequenos agricultores, em particular, lutam para acessar crédito para financiar esses investimentos. A escassez de água é outra questão crítica. Regiões como o Nordeste e o Centro-Oeste frequentemente experimentam secas, tornando a água um recurso limitado e competitivo. Por exemplo, um grande produtor de soja no Centro-Oeste precisa comprar água de caminhões-pipa durante a estação seca, aumentando significativamente os custos de produção. A infraestrutura inadequada também prejudica o desenvolvimento da irrigação. Muitas áreas carecem de canais de irrigação para transportar água de reservatórios para fazendas, e há insuficiência de reservatórios de água.

Além disso, os sistemas de irrigação frequentemente requerem eletricidade, que pode ser pouco confiável em áreas rurais. Obstáculos burocráticos complicam ainda mais a situação. Obter licenças ambientais para sistemas de irrigação pode ser lento e complexo, desencorajando muitos agricultores. Por fim, a falta de mão de obra qualificada é um desafio persistente. Operar e manter sistemas de irrigação requer habilidades especializadas, muitas vezes difíceis de encontrar em áreas rurais. Por exemplo, uma empresa de irrigação no Nordeste luta para encontrar trabalhadores qualificados, resultando em longos tempos de espera e custos mais altos de instalação e manutenção.

Apesar dos desafios mencionados, investir em irrigação no Brasil é altamente benéfico, com retornos significativos que justificam o desembolso inicial. Vários fatores influenciam o período de maturação de um investimento em irrigação. Sistemas de irrigação mais simples, como a irrigação por gotejamento, normalmente amadurecem mais rapidamente do que sistemas mais complexos, como a irrigação por aspersão, devido principalmente aos seus custos iniciais mais baixos e à instalação e manutenção mais fáceis. O tamanho da área irrigada também desempenha um papel crítico. Áreas maiores requerem maiores investimentos iniciais, prolongando o período de maturação devido aos custos extensivos de equipamentos e mão de obra envolvidos. Além disso, o tipo de cultura cultivada impacta a velocidade do retorno sobre o investimento. Culturas com ciclos de produção mais curtos, como vegetais e frutas, oferecem retornos mais rápidos do que aquelas com ciclos mais longos, como cana-de-açúcar e soja, devido à capacidade de colher mais frequentemente dentro de um ano.

De acordo com estimativas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o tempo de maturação para investimentos em irrigação no Brasil pode variar de 2 a 5 anos. Por outro lado, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) oferece uma previsão mais otimista, estimando um período de maturação que varia de 1 a 3 anos. Quanto aos retornos sobre o investimento, a Embrapa estima que o retorno anual dos investimentos em irrigação pode variar de 20% a 50%. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) fornece números ligeiramente mais conservadores, com retornos variando de 15% a 30% ao ano. Esses retornos são substanciais, destacando a lucratividade de investir em irrigação.

Os ganhos de produtividade com a irrigação podem ser imensos. Dependendo da cultura e das condições climáticas, a irrigação pode aumentar a produtividade agrícola em até 300%. Por exemplo, um estudo da Embrapa mostrou que a irrigação por gotejamento na horticultura pode aumentar a produtividade em até 100%. Esse aumento significativo na produtividade não só acelera a maturação do investimento, mas também melhora enormemente os retornos financeiros, tornando a irrigação uma empreitada altamente atraente e lucrativa, apesar dos desafios iniciais.

Apesar dos retornos atraentes sobre o investimento e do forte interesse dos produtores, o financiamento para projetos de irrigação no Brasil continua inadequado. Alguns estudos fornecem diferentes estimativas das necessidades anuais de investimento em irrigação no Brasil. A Embrapa estima que são necessários R$ 30 bilhões anuais até 2030 para expandir a área irrigada para 30% da área agrícola total do Brasil. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) sugere um valor ligeiramente maior, estimando que são necessários R$ 40 bilhões por ano para atingir o mesmo objetivo.

Para contribuir com a consecução desse objetivo, o governo federal lançou o Plano Nacional de Irrigação (PNI) em 2017, com o objetivo de investir R$ 50 bilhões em irrigação até 2030. Os fundos para o PNI provêm de várias fontes, incluindo o orçamento público, parcerias com o setor privado e linhas de crédito. No entanto, a implementação do PNI tem enfrentado numerosos desafios, como burocracia, escassez de mão de obra qualificada e dificuldade de acesso ao crédito, particularmente para pequenos agricultores. É a principal fonte de financiamento para investimentos em irrigação no Brasil. Além do PNI, bancos públicos e privados oferecem linhas de crédito específicas para irrigação. O Fundo de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) financia projetos de irrigação de pequeno e médio porte. Ao mesmo tempo, agências de desenvolvimento como o BNDES e o Banco do Nordeste também oferecem facilidades de crédito para irrigação.

Apesar dessas fontes, ainda há uma carência significativa nos investimentos necessários para realizar todo o potencial da irrigação no Brasil. Em 2023, o governo federal investiu R$ 8 bilhões em irrigação, um aumento em relação aos anos anteriores, mas ainda aquém das necessidades anuais estimadas para alcançar a meta de 30%, que gira em torno de R$ 30 a 40 bilhões por ano.

Portanto, o investimento em irrigação apresenta um caso convincente para a adoção de crédito privado no Brasil, alinhando-se bem com suas características, incluindo retornos esperados e períodos de maturação. Os retornos potenciais dos investimentos em irrigação são notavelmente altos, com rendimentos anuais variando de 15% a 50% e o período de payback variando entre 1 e 5 anos, dependendo do sistema e da escala de implementação. Esses fatores tornam a irrigação um setor atraente para investidores privados e instituições financeiras.
 

Como é sabido, o crédito privado oferece vantagens distintas sobre os métodos tradicionais de financiamento público. Em primeiro lugar, pode reduzir significativamente a burocracia, permitindo uma liberação mais rápida de fundos e uma implementação mais rápida de projetos. Essa agilidade é crucial em áreas como a agricultura, onde o timing dos investimentos pode impactar criticamente o sucesso de uma safra. Além disso, o crédito privado pode oferecer soluções de financiamento mais flexíveis e inovadoras, adaptadas às necessidades específicas dos agricultores e empresas agroindustriais. Isso inclui termos de reembolso personalizáveis que melhor se alinham aos ciclos agrícolas e fluxos de receita de diferentes culturas. Por exemplo, os termos dos empréstimos podem ser ajustados para acomodar os períodos de maturação mais longos exigidos por culturas como cana-de-açúcar ou soja, ou os ciclos mais curtos de vegetais e frutas. Outra vantagem do crédito privado é seu potencial para alavancar expertise adicional do setor privado em gestão de projetos e inovação tecnológica. Isso pode levar a projetos de irrigação mais eficientes que maximizam o uso da água e os rendimentos das culturas, aumentando a sustentabilidade e a lucratividade.

A oportunidade para o crédito privado no setor de irrigação brasileiro é clara. Ao fornecer o capital necessário com menos burocracia e produtos financeiros mais adequados, os credores privados têm a ganhar retornos significativos e contribuir para o desenvolvimento mais amplo das capacidades agrícolas do Brasil. Esse investimento em irrigação não é apenas uma opção viável, mas uma atraente para investidores e produtores, impulsionando um setor-chave da economia, promovendo a sustentabilidade ambiental e melhorando a segurança alimentar.

*CEO e Founder da Rivool Finance
**Professor associado na Universidade Federal do Rio Grande e head of research na Rivool Finance

 

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