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DOHA, a quem doer


Amélio Dall’Agnol

Já faz cinco anos que a Organização Mundial do Comércio (OMC) iniciou a "Rodada Doha" de negociações, no intuito de liberalizar o comércio mundial. Os resultados foram pífios e as negociações estão suspensas desde julho. O impasse corre por conta dos produtos agrícolas, igual aconteceu com a Rodada Uruguai do GATT (hoje OMC), que durou oito anos e transferiu o problema para Doha. As diferenças parecem intransponíveis e sinalizam para um fracasso total da Rodada.

Não está para amadores o jogo bruto do intercâmbio comercial mundial. O mais delicado dos competidores chuta a canela do concorrente e finge que foi acidente. O Brasil, enquanto desempenhava um papel secundário no jogo desleal do comércio agrícola mundial, não sabia da maldade que rola entre os jogadores desse time. Agora, finalmente convertido em importante player desse jogo, sofre as conseqüências do seu novo status.

Vocês se lembram do jogo de cena da China, em 2004? Rejeitou centenas de milhares de toneladas de soja brasileira, porque estariam contaminadas com resíduos de fungicidas. Isso ocorreu no justo momento em que o mercado da soja estava em queda e a compra havia acontecido na alta. Estivesse o mercado em alta e nenhum grão contaminado teria sido encontrado.

E para provar que o jogo não está para brincadeiras, no final de junho daquele mesmo ano de 2004, a Rússia, a Indonésia e até a vizinha Argentina decidiram aproveitar a notícia da existência de um foco de Febre Aftosa no longínquo Estado do Pará, para impor restrições à importação de carne bovina brasileira. Esse Estado não exporta carne para esses países, mas e daí?

Para ganhar mercados, qualquer coisa serve, incluindo a calúnia e a difamação, como a falsa acusação feita pelo Canadá contra o Brasil, em 2002. Inconformado com a perda de mercado de carnes e de aviões para o Brasil, aquele país falsamente acusou o nosso de ser um potencial foco da doença da Vaca Louca, que, qual castigo divino, acabou, posteriormente, aparecendo por lá.

"O livre comércio é o melhor atalho para a prosperidade global" diz Alan Greenspan, ex-Presidente do Banco Central Americano. O que ele finge desconhecer, é que o livre comércio só existe no discurso. Na prática, meu irmão, o que vale mesmo é a lei do mais forte. "Nas relações comerciais entre os povos não há lugar para amigos nem para inimigos: só para negócios" afirmava o conterrâneo de Greenspan, John Foster Dulles, deixando clara a estratégia de negociação dos norte-americanos.

Se bem é verdade que a globalização do comércio mundial é um processo irreversível, pelos inquestionáveis benefícios que trouxe e traz à humanidade - inclusive para as nações subdesenvolvidas e em desenvolvimento, como o Brasil - o que se questiona não é o mecanismo, mas a desigual distribuição dos seus benefícios.  Com a abertura dos mercados, as nações ricas passaram a vender mais às nações pobres e delas comprando menos, valendo-se de ridículas barreiras não alfandegárias, assim como de subsídios e de protecionismos descarados em favor dos seus mercados, resultando numa sociedade mais injusta e iníqua, hoje, do que a existente há 50 anos, quando teve início a explosão do comércio entre os povos.

Precisamos reagir contra a arrogância e prepotência com que os países industrializados nos impõem as regras do "livre intercambio comercial", que, ato contínuo, eles próprios não as cumprem, numa típica atitude do "faça o que eu digo, não faça o que eu faço".

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