Introdução
Os ruminantes, entre os quais bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos apresentam sistema digestivo, composto por rúmen, retículo, omaso, abomaso e intestinos delgado e grosso. Os três primeiros compartimentos funcionam como uma câmara fermentativa, na qual os alimentos grosseiros, porção fibrosa das plantas e subprodutos diversos são digeridos, com posterior metabolização, dando origem a alimentos de elevado valor nutritivo, como leite e carne (Costa et al., 1996). Desta forma, estes animais exercem importante papel no aproveitamento de resíduos e subprodutos da agricultura na sua alimentação, que não seriam de grande utilidade para outros fins, fazendo com que estes sejam reciclados, além de reduzir a demanda por alimentos mais nobres (cereais) voltados à alimentação humana e de outras espécies animais, como aves e suínos.
Os resíduos e subprodutos agrícolas podem apresentar mercados já definidos, representando significativo aporte financeiro à agroindústria, como são os casos das tortas de oleaginosas, melaço e farelos de trigo e arroz. Mas a grande parte destes são materiais lignocelulósicos, que requerem tratamentos a fim de romperem a fração fibrosa e melhorar seu valor nutritivo. Isto, muitas vezes implica em elevados custos, que pode inviabilizar o seu aproveitamento (Burgi,1986). Na criação intensiva de ruminantes, os gastos com alimentação representam um dos principais componentes do custo de produção; com gado leiteiro podem oscilar entre 30 a 60% dos custos, dependendo do tipo de exploração. A busca de alimentos alternativos e de baixo valor comercial, como os resíduos e subprodutos agrícolas, representa uma forma de minimizar os gastos com alimentação. Entretanto, Buschinelli (1992) alerta para o risco da contaminação química e biológica que estão sujeitos os resíduos e subprodutos da agricultura. Esta contaminação pode atingir a cadeia alimentar, inicialmente pelos animais e, posteriormente alcançar o homem. Dentre os vários fatores a serem considerados na escolha de um subproduto a ser utilizado na alimentação de ruminantes, Carvalho (1992) destaca os seguintes: a quantidade disponível; a proximidade entre a fonte produtora e o local de consumo; as suas características nutricionais; os custos de transporte, condicionamento e armazenagem. A viabilidade da utilização de resíduos e subprodutos agroindustriais como alimentos para ruminantes, requer trabalhos de pesquisa e desenvolvimento, visando a sua caracterização, aplicação de métodos de tratamento, determinação de seu valor nutritivo, além de sistemas de conservação, armazenagem e comercialização.
A cultura da soja (Glycine max) em Rondônia teve uma grande expansão durante a década de 80, quando atingiu mais de 9.000 ha plantados. Mas em função de várias dificuldades, ocorridas no início dos anos 90, como: custo de transporte, queda de preço, planos econômicos, endividamento dos produtores; muitos sojicultores viram-se obrigados a abandonarem a atividade, havendo um decréscimo em mais de 50% da área plantada neste período. Segundo a Embrapa, na safra 2004/2005, a área utilizada com o plantio da soja em Rondônia foi superior aos 84.000 ha. Com a recente abertura da hidrovia do Rio Madeira para o transporte de grãos, investimento de grupos privados, e elevação dos preços internacionais, a sojicultura rondoniense apresenta novas perspectivas, principalmente nas regiões de Vilhena, Pimenta Bueno e Ariquemes, podendo vir a ocupar posição de destaque na agricultura do estado (Oliveira, no prelo). Vários resíduos e subprodutos obtidos com a cultura e o beneficiamento da soja podem ser utilizados na alimentação de ruminantes, representando excelentes fontes de proteína e energia (farelos e grãos), fibra (resíduos de beneficiamento, casquinha, restos culturais).
1.Casca do grão de soja (CGS)
A remoção do tegumento do grão de soja, separando a casca do embrião durante o processamento, possibilita a obtenção de farelos de soja com elevado teor de PB (48 a 50%), resultando como subproduto a CGS. Tambara et al. (1995) determinaram o valor nutritivo da CGS em ensaio de digestibilidade in vivo com ovinos. Concluíram que embora este subproduto apresente alto valor em fibra (33,8%), possui alto valor nutritivo para ruminantes, com coeficientes de digestibilidade aparente de 65, 66, 61 e 68% para MS, MO, PB e FB, respectivamente. Por suas características, pode ser considerado um alimento concentrado-volumoso. Como fonte de fibra em rações altamente energéticas para vacas em lactação, a CGS não deve exceder a 28% da dieta, pois níveis mais altos podem reduzir a digestibilidade da ração. Observando-se este limite, a CGS pode substituir o milho sem comprometer a produção de leite (Silva, 1995).
2. Farelo de soja (FS)
O FS resulta da extração do óleo dos grãos. Representa uma excelente fonte de proteína, tem boa palatabilidade com bom balanço de aminoácidos de alta disponibilidade. O conteúdo de PB na matéria seca oscila entre 42,5 a 55,6%, dependendo do método de extração de óleo e processamento, podendo constituir a única fonte protéica na dieta de ruminantes (Silva, 1995). A presença de alguns componentes antinutricionais (inibidores de enzimas digestivas e alergênicos, tais como a sojina) no FS e grãos de soja cru, reduzem a eficiência na utilização da proteína e podem até causar a morte de animais monogástricos , bem como de bezerros na fase na fase pré-ruminante. Tais efeitos não são observados nos ruminantes adultos, como constataram Alves et al. (l997). A proteína oriunda do FS apresenta alta degradabilidade ruminal (0,71 a 0,90%), que pode comprometer o desempenho de animais suplementados com este subproduto. O tratamento por calor (tostagem a 165oC durante 150 minutos para o FS; 146oC durante 30 minutos para o GS) é o processo mais usual a fim de inibir os fatores antinutricionais e reduzir a degradabilidade ruminal da proteína da soja. No entanto, tal processo deve ser bem conduzido, pois se ocorrer super aquecimento, há queda acentuada na digestibilidade e disponibilidade de aminoácidos. O teste de urease monitora o grau de aquecimento dos subprodutos da soja (Silva, 1981; Tafuri, 1984). Sampaio et al. (1997) compararam três fontes protéicas em dietas isocalóricas e isonitrogenadas, ministradas a novilhos Canchim x Nelore em confinamento. A ração contendo FS propiciou ganhos de 1,26kg/animal/dia, conversão alimentar de 6,92kg de MS/kg de ganho, taxa de eficiência protéica de 1,07kg de PB/kg de ganho e consumo de 8,76kg de MS/animal/dia, resultando no melhor desempenho quando comparado ao farelo de algodão e soja integral. A utilização do FS na dieta de ruminantes está limitada ao seu preço, pois trata-se de um subproduto bastante utilizado nas rações de suínos e aves, além de obter boas cotações no mercado internacional que estimulam a exportação, pressionando a elevação da demanda e dos preços no mercado interno.
3. Feno/Rolão de soja
O rolão de soja é obtido através da colheita das plantas após a maturação dos grãos, quando o nível de umidade é adequado para o armazenamento (Burgi, 1986). Já, o feno de soja é colhido quando as plantas encontram-se no estádio de início de formação dos grãos, necessitando passar por processo de desidratação, até atingir níveis de umidade entre 15 e 25% (Canto et al., 1992). Por ocasião do fornecimento aos animais ambos devem ser triturados. O valor nutritivo do feno e rolão de soja está diretamente correlacionado com a percentagem de folhas e grãos existentes no material colhido, sendo considerados alimentos volumosos. A utilização do feno/rolão de soja na alimentação de ruminantes está condicionada ao mercado, que normalmente direciona a cultura da soja para produção de grãos, pois representa maior retorno econômico.
4. Grão de soja (GS)
Segundo Bonnecarrère (1995) o GS pode ser fornecido cru a ruminantes, já que os fatores antinutricionais não agem nesta espécie animal. No entanto, o alto conteúdo de gordura (aproximadamente 18%) pode interferir na fermentação ruminal, diminuindo a digestibilidade da fibra. O nível de gordura insaturada suplementar não deve ultrapassar a 3% da MS da dieta, o que representa menos de 15% de GS. Ao compararem o FS e o GS triturado como fonte protéica na dieta de terneiros confinados, Pelegrini et al. (1993) observaram que os animais alimentados com GS obtiveram os menores ganhos de peso (0,98 x 1,11kg/animal/dia) e pior conversão alimentar (16,4 x 15,2kg de alimento/kg de ganho), os autores recomendam uma avaliação econômica entre as duas dietas, a fim de orientar a recomendação de uma delas. Alves et al. (1997) constataram que o processamento do GS cru através da moagem não alterou o desempenho de bovinos Guzerá em confinamento, que obtiveram ganhos diários de 1,01kg/animal, consumo diário de 8,8kg de MS/animal com conversão alimentar de 8,75kg de MS/kg de ganho.
5. Resíduos culturais da soja (RCS)
Cruz (1983) estima que a proporção de resíduos em relação à planta de soja seja na ordem de 50%, representando uma grande quantidade de material, que normalmente é deixado na lavoura. Os RCS podem representar uma alternativa de alimento volumoso na dieta de ruminantes, principalmente após sofrerem tratamentos físicos/químicos a fim de reduzir a fração indigestível, já que apresentam elevados teores, expressos em % com relação a MS, de: fibra bruta (42,7), hemicelulose (13,9), celulose (44,2), lignina (14,1) e sílica (0,5), que comprometem sua utilização pelos animais (Marques Neto, 1984).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Claudio Ramalho Townsend (Embrapa Rondônia), João Avelar Magalhães (Embrapa Meio Norte), Newton de Lucena Costa (Embrapa Amapá)