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Picanha light


Decio Luiz Gazzoni

Ômega 3 é um tipo de ácido graxo farto em peixes como o salmão, o arenque e o bacalhau. Em baixas quantidades também pode ser encontrado nos óleos de soja e canola e nas castanhas. Embora tenha funções muito importantes, ele não é produzido pelo organismo humano, devendo ser obtido por meio dos alimentos.

Gordura boa

Alimentos ricos em ômega 3 reduzem os níveis de colesterol e triglicéridos no sangue e regulam a pressão arterial, mitigando os riscos de acidentes vasculares e cardíacos. Já as carnes vermelhas não possuem gordura do tipo ômega 3, razão pela qual o churrasquinho nosso de cada fim de semana constitui-se no terror dos cardiologistas. Além da carne de gado, também a carne de frango ou porco, os ovos e o leite não contêm ômega 3, sendo suas gorduras do tipo ômega 6. Conquanto tenha diversas funções no organismo, o ômega 6 é considerado o responsável pelo “pecado da carne”, ou seja, pelos problemas causados às artérias e ao coração, em especial pelos elevados teores de LDL-colesterol e triglicéridos que apresentam riscos ao sistema circulatório.

Salvo pela minhoca

Da cornucópia dos cientistas surgem novidades encorajadoras a todo instante. Desta vez foi o grupo do Dr. Jing Kang (Harvard University) que publicou na revista Nature (janeiro 2004) um estudo demonstrando a possibilidade de produzir ômega 3 em ratos. O gene fat-1, responsável pela produção do ômega 3, foi extraído do DNA de um nematóide chamado Caenorhabditis elegans. Como minhocas não constam do nosso hábito alimentar, os cientistas transferiram a capacidade de produzir ômega 3 do nematóide para o rato. Absolutamente sugiro substituir a picanha por ratos assados, mas a possibilidade de produzir a boa gordura em um mamífero é auspiciosa, sendo um indicativo de possível sucesso com outros animais ou plantas.

Como funciona?

O gene fat-1, extraído do nematóide e introduzido nos camundongos, produz uma enzima responsável por transformações nas moléculas do ômega 6, através da redução dos átomos de hidrogênio e a formação de ligações duplas nas moléculas. Assim, os ratos que antes produziam apenas lipídios do tipo ômega 6, passaram a produzir ômega 6 e ômega 3 em proporções quase idênticas. Foram necessários diversos arranjos genômicos até atingir essa proporção que, segundo o Dr. Kang é a mais adequada, porque o ômega 6 desempenha algumas funções orgânicas importantes e não pode ser completamente eliminado.

Pesquisa básica

A pesquisa ainda é embrionária. Apesar de o estudo haver sido bem-sucedido durante quatro gerações de camundongos - demonstrando a estabilidade genética e a capacidade de produção de ômega 3 - ainda há muito trabalho pela frente. Estudos profundos de fisiologia, anatomia e bioquímica, em especial de longo prazo, serão necessários para que todos os impactos dessa mudança possam ser avaliados, entendidos e ter os seus riscos mensurados. Posteriormente, o mesmo processo poderá ser aplicado a outros animais.

Desenvolvimento tecnológico

Uma vez assegurado que os benefícios superam, por larga margem, eventuais malefícios da produção de ômega 3 por animais transgênicos, será necessário introduzir o processo nas cadeias produtivas. De imediato vislumbra-se um espetacular nicho comercial na produção de gado bovino, tanto de corte quanto de leite, de frangos (de corte ou postura) e na criação de suínos. O mesmo pode ocorrer em outras fontes de lipídios, como os óleos vegetais. Do sucesso da pesquisa científica pode decorrer uma brutal redução nos riscos de acidentes cardíacos, decorrentes da baixa ingestão de ômega 3. E, como bônus, você poderá saborear tanto a picanha quanto a costela com aquela gostosa manta de gordura – que faz qualquer gaúcho lamber o bigode! – livre do sentimento de culpa que hoje nos acomete. Melhor ainda: sob as bênçãos do seu cardiologista!

O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja. Homepage: www.gazzoni.pop.com.br

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