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PANTANAL: RISCO DE CONTAMINAÇÃO POR BIOCIDAS


Luiz Marques Vieira

A crescente demanda por pesticidas, face à expansão desordenada da agropecuária nos planaltos da Bacia do Alto Paraguai, constitui uma das principais ameaças à sustentabilidade do Pantanal pelo risco de alterar a estrutura dos ecossistemas, e consequentemente a biodiversidade. Os pesticidas podem contaminar o solo, a água, a fauna e a flora, além do próprio homem. Essa situação é preocupante e também não pode ser descartada, pelas inúmeras possibilidades de contaminação e amplificação através das cadeias alimentares.

A partir da década de 70, através de incentivos do governo federal, matas e cerrados do Centro-Oeste brasileiro foram rapidamente substituídos pela agropecuária, transformando-os em grandes unidades de produção de bovinos de corte e grãos. Em Mato Grosso, os pecuaristas, inicialmente, cultivaram arroz para viabilizar a formação das pastagens. As grandes agropecuárias, após desmatamento, vem cultivando soja há alguns anos. Atualmente, constata-se principalmente, o crescimento dos cultivos de soja e algodão, além de milho, feijão e outras culturas. Em Mato Grosso do Sul, nos planaltos adjacentes ao Pantanal, principalmente na Bacia do Alto Rio Taquari (BAT), Miranda, Aquidauana e Negro, o panorama é praticamente o mesmo, exceto quanto ao cultivo de algodão.

Sabe-se que os pesticidas (herbicidas, inseticidas e fungicidas) constituem um largo espectro de produtos químicos com estruturas e princípios ativos diferentes, sendo ainda uma das principais tecnologias para combater invasoras de culturas e pastagens, controlar insetos e doenças de plantas e animais para garantir a produtividade do agronegócio.

O macrozoneamento de Mato Grosso do Sul, evidenciou que a Microrregião Homogênea do Alto Taquari na sua bacia, se destacou em segundo lugar quanto à utilização de pesticidas na agropecuária no triênio 1985/86/87. Levantamento da Embrapa Pantanal, referente ao emprego de biocidas na agropecuária da BAT de 1988 a 1996, mostrou que os herbicidas são os mais empregados, seguidos pelos inseticidas e fungicidas. A cultura da soja foi a que mais usou pesticidas, principalmente herbicidas. O município de São Gabriel D’Oeste, que possui a quase totalidade de sua área (88,94%) na BAT, foi onde mais se expandiu a cultura da soja e o que mais empregou pesticidas, em relação aos demais municípios da bacia do alto Taquari.

Os grupos químicos dos herbicidas mais empregados na agropecuária na BAT, de 1988 a 1996, foram as dinitroanilinas (base da trifluralina), difeniléteres, imidazolinonas, imidazolinas, benzotiazinas, bipiridilios, derivados da glicina, fenoxiacéticos, acetanilidas, aril oxi fenoxi propionatos, triazinas, triazinonas, entre outros. Com relação aos inseticidas, os grupos mais usados foram os organofosforados, éster do ácido sulfuroso de um diol cíclico, carbamatos, triazinas + triazinas, piretróides sintéticos, organoclorofosforados, atrazinas + acetanilidas, tiocarbamatos, isoxazolidinonas, organoclorados, triazinonas e outros. Entre os fungicidas, os grupos mais utilizados foram os ditiocarbamatos, ftamidas, benzimidazóis, ditiocarbamatos, triazóis, benzimidazóis, ftaminas e outros. Além disso, a literatura evidenciou o emprego de pesticidas das classes toxicológicas I e II e de contaminação do leite materno, em 1996, por organoclorados, inclusive DDT, em Mato Grosso, acima do limite recomendado pela Organização Mundial de Saúde.

Os resultados do Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai, mostraram relação entre a qualidade de sedimento dos rios e os princípios ativos cloropirifós, ciclodienos e triazinas. Esses resíduos foram detectados em níveis elevados no sedimento dos rios São Lourenço, Negro e Taquari, evidenciando que os pesticidas utilizados na agropecuária dos planaltos da BAP estão, efetivamente, atingindo os ecossistemas aquáticos do Pantanal.

O Pantanal possui fauna e flora abundante e diversificada. No entanto, percebe-se que está ocorrendo redução dos estoques de determinados peixes nobres, em algumas bacias hidrográficas. No entanto, é interessante constatar, que, o governo brasileiro, através da constituição federal de 1988, legitimou o Pantanal como patrimônio nacional e as Nações Unidas como Reserva da Biosfera. Será que as sociedades brasileira e internacional vêem efetivamente o Pantanal como tal? Então, porque nas últimas décadas o Pantanal vem sofrendo tantas ameaças? Tudo indica que a legislação ambiental existente contempla as questões básicas inerentes à preservação e conservação de fauna e flora. Mas, em que aspectos estamos efetivamente pecando? Quais são as principais causas desse “status quo”? Será que se trata de falta de educação ambiental de base? Ou estamos interessados no imediatismo e muito pouco preocupados com as futuras gerações?

O fato é que a planície pantaneira, desde o final da década dos anos 70, vem sendo ameaçada pela efetivação da agropecuária no planalto. E até quando os mecanismos naturais de defesa do Pantanal ainda resistirão a tanta agressão?

Bibliografia Consultada

MATO GROSSO DO SUL. Macrozoneamento de Mato Grosso do Sul quanto ao uso de agrotóxicos. Mato Grosso do Sul-SEMA/MINTER. Campo Grande. 1989.

Oliveira, M. A. G.; Dores, E. F. G. de C. Níveis de praguicidas organoclorados no leite materno de uma população de Cuiabá - Mato-Grosso. Pesticidas. Revista de Ecotoxicologia e Meio Ambiente. Curitiba. V. 8, p. 77-90. Jan/dez. 1998.

Marques, D.; Cybis, L. F. Qualidade das águas e dos sedimentos. In: BRASIL. Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai (Pantanal) – PCBAP: DIAGNÓSTICO DOS MEIOS FÍSICOS E BIÓTICOS. HIDROSSEDIMNTOLOGIA DO ALTO PARAGUAI. Brasília, v. 2, t. 2-b, p. 387-462 il. 1997.

Vieira, L. M.; Galdino, S.; Padovani, C. R. Utilização de pesticidas na agropecuária dos municípios da Bacia do Alto Taquari de 1988 a 1996 e risco de contaminação do Pantanal, MS, Brasil. Corumbá: Embrapa Pantanal, 2001. 53p. (Embrapa Pantanal. Circular Técnica, 27).

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Luiz Marques Vieira, ([email protected]) é Eng. Agron., MS (Zootecnia), Doutor (Ecologia), atuando na área de Qualidade Ambiental e Sérgio Galdino ([email protected]) é Eng. Agron., MS, na área de Recursos Hídricos, são pesquisadores da Embrapa Pantanal.

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