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O sofisma agronegócio x agricultura familiar


Decio Luiz Gazzoni
A dualidade agricultura familiar x agronegócio é um sofisma que resiste ao tempo. Por incrível que pareça, em pleno século XXI ainda existem defensores desta falsa polarização, como se o muro de Berlim não houvesse caído e as fazendas coletivas da antiga URSS não houvessem falido. Como se no Brasil ainda existissem latifúndios improdutivos, camponeses, casa grande e senzala. Com a cortina de fumaça para provocar um duelo entre o bem (agricultura familiar) e o mal (agronegócio), o lobo e o cordeiro, ou nós e eles, obnubilam-se as discussões que realmente importam.

Em primeiro lugar, e acima de tudo, desafio qualquer um a me provar que existe um único produtor rural que não vise negociar sua produção. Se negocia um produto agrícola, logo trata-se de um agro negócio! Agricultura familiar é um conceito usado para definir que o empreendimento é gerido pela família. A família Maggi, que possui centenas de milhares de hectares de soja e milho, espalhados pelo Brasil, poderia reivindicar o epíteto de agricultores familiares!
O que deve ser discutido são as condições para bem produzir e para competir. Esqueçamos os grandes, com gestão profissional, visão de negócio, abertos à inovação, com pleno acesso ao mercado, às informações e tecnologias. Foquemos no pequeno. Os seus problemas não estão em ofender e contrapor-se aos grandes empresários agrícolas, mas em dispor de crédito suficiente e na hora certa, a juros exequíveis, seguro agrícola, assistência técnica, acesso ao mercado, possiblidade de agregação de valor, entre outros. Em especial o dueto acesso a inovações e competitividade no mercado são cruciais: ou o produtor dispõe destes meios, ou estará fora do mercado no curto ou no médio prazos.

Acrescente-se três outros problemas bem reais: escassez e alto custo da mão-de-obra, dificuldade de automação (comparativamente aos grandes empresários agrícolas) e enormes dificuldades na sucessão familiar, eis que os filhos dos pequenos e médios produtores já se foram para a cidade e não querem mais saber do negócio agrícola, de alto risco e com rentabilidade não proporcional a este risco. Esses são os reais problemas dos pequenos agricultores que, se não resolvidos, os eliminarão do campo em uma geração.
 
O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja.

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