O potencial agrícola e as limitações do Brasil
Dante Scolari1
A partir da década de cinqüenta a produção agrícola mundial aumentou em função do uso de novas tecnologias como sementes melhoradas geneticamente, calcário, produtos fitossanitários, irrigação, maquinaria agrícola mais desenvolvida, maior profissionalização dos produtores, melhores canais de comercialização e apoio mais intenso dos governos e foi suficiente para atender a demanda mundial. Mas a partir de 1985 a produtividade mundial per capita ficou estabilizada para vários cultivos importantes, o que sinaliza uma certa “exaustão tecnológica” dos meios de produção. Em 2005 a população mundial foi de 6,453 bilhões de pessoas e para 2.025 a FAO estima uma população de 7,851 bilhões. Nos próximos 20 anos a humanidade precisa alimentar, dar moradia, vestir e ofertar fontes de energia para esta população adicional de 1,398 bilhões, a maioria com renda per capita baixa e com forte demanda por carbohidratos, que em grande parte estará residindo em países pobres ou em desenvolvimento.
Existem poucos países no mundo que ainda possuem áreas aptas não cultivadas para a agricultura e noventa por cento (90%) estão na América do Sul e África. Mas a maioria destes países não possui recursos humanos e econômicos nem dominam tecnologias para produção agropecuária. O Brasil é a grande alternativa. Usa apenas 284 milhões de hectares (34% da sua área de terra de 835,56 milhões) na agropecuária: 64 milhões em agricultura e 220 milhões em pastagens e ainda mantém 49% da área total do país sob vegetação de florestas ou como áreas protegidas. Participa com apenas 4% do comércio mundial do agronegócio e tem reais possibilidades de suprir uma parcela importante desta demanda adicional futura de fibras e alimentos a preços competitivos.
O agronegócio brasileiro possui pontos fortes que garantem competitividade: recursos humanos profissionais e qualificados, boa capacidade de gestão na produção e comercialização, oferta ambiental favorável, bom nível de desenvolvimento tecnológico, alta capacidade de produção de maquinaria agrícola, colheitadeiras e tratores e custo de produção competitivo. A produtividade dos principais cultivos e explorações pecuárias pode ser aumentada com o aporte de novas tecnologias. O apoio efetivo dado ao setor agrícola é uma parcela muito pequena do PIB, de apenas 0,5%, o que significa que o setor é altamente desprotegido. O país possui uma fronteira agrícola inexplorada de 103,32 milhões de hectares que pode ser parcialmente incorporada ao processo produtivo. O potencial de produção agrícola, incorporando na agricultura menos de 50% desta área de reserva, é de 270 milhões de toneladas (t) de grãos (90 milhões de t de soja e 125 milhões de t de milho), 900 milhões de t de cana de açúcar, 16 milhões de t de óleos vegetais (dendê, girassol e mamona), 450 milhões de m³ de madeira e quase 40 milhões de t de carnes. Pode se tornar o maior produtor e o maior exportador mundial de madeira, soja, carnes e biocombustíveis.
Mas, existem limitações. Os baixos investimentos em pesquisa e desenvolvimento limitam a inovação tecnológica e a competitividade. A situação precária das estradas, condições de armazenagem e capacidade operacional dos portos aumenta os custos de comercialização. A carga tributária de 38%, os juros médios de mais de 18% e os encargos sociais de mais de 100% precisam ser rapidamente reduzidos. As políticas agrícolas setoriais além de dispersas e pouco integradas estão sob responsabilidade de diferentes órgãos, o que impede um planejamento racional. Falta uma política de seguro de produção e de renda. Falta ousadia e maior qualificação profissional nas negociações internacionais. A abertura do mercados de insumos deve ser agilizada, para diminuir os custos de produção e melhorar a competitividade. O poder judiciário precisa de modernização, rapidez e maior capacitação técnica, para fazer valer o cumprimento de contratos e o respeito integral ao direito de propriedade. As cadeias produtivas devem ser integradas e orientadas para agregar valor. O investimento total no setor ainda é uma parcela pequena do PIB do agronegócio. A concentração de poder econômico que gera distorções econômicas em vários setores deve ser combatida. Se esses pontos fracos não forem eliminados o crescimento da produção agropecuária brasileira ficará limitado e o país poderá perder uma excelente oportunidade de crescimento, gerando renda e emprego nas cidades e nos campos, a uma taxa muito maior do que 2,3% do PIB observados em 2005.
1Pesquisador e ex-diretor executivo da Embrapa. Assessor Técnico da Presidência da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados. E-mail: [email protected].