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O perigo das narrativas dominantes


Decio Luiz Gazzoni
Lysenko era um agricultor, militante do Partido Comunista Soviético e defensor do Lamarckismo, o qual prega ser a evolução das espécies fruto de modificações adquiridas em vida: As girafas, animais lentos, só sobreviveriam alimentando-se no alto das árvores, devido à competição ao nível do solo. Seus pescoços alongar-se-iam e o caráter seria transmitido às gerações futuras, sem variabilidade genética anterior para “pescoço longo”.

Darwin propôs existir variabilidade genética que, postas as pressões de seleção do ambiente, fazem o organismo expressar uma característica. Se a pressão se mantiver, essa característica será dominante na descendência. Tudo indicaria que os Marxistas prefeririam o Darwinismo por seu conceito da seleção natural mecanicista, materialista e determinista. Entrementes, a visão apoiada pelos líderes da União Soviética foi a lamarquiana. Explico: o Lamarckismo confrontava a visão dominante da Ciência do resto do mundo, do qual os dirigentes da URSS precisavam se diferenciar, para demonstrar que outro mundo era possível.
Em uma conferência em 1948, Lysenko denunciou Mendel como "reacionário e decadente" e declarou que cientistas que acreditassem na genética eram "inimigos do povo soviético." Como o seu discurso havia sido aprovado pelo Comitê Central do Partido Comunista, os cientistas que compartilhavam as teorias de Mendel dispunham de duas alternativas: ou escreviam cartas públicas confessando os seus erros e reconhecendo a sabedoria do Partido Comunista (narrativa dominante), ou seriam sumariamente demitidos. Alguns dissidentes foram enviados para campos de trabalho forçado, de outros não se tornou a ouvir falar.

Resultado: atualmente, os países da antiga URSS dependem de tecnologia genética de países cuja Ciência seguiu Mendel, como a Europa, o Canadá, os Estados Unidos ou o Japão. São bilhões de dólares anuais transferidos dos países da ex-URSS para os países detentores de tecnologias avançadas, baseadas na genética mendeliana. Que este episódio clássico nos sirva de farol para refutar qualquer ingerência meramente ideológica na Ciência, pois as narrativas dominantes, sem contrapontos, são o caminho mais curto para impedir a chegada do futuro.

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