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O difícil manejo da resistência aos pesticidas


Amélio Dall’Agnol
O problema da resistência de plantas, insetos ou micro-organismos a herbicidas, inseticidas ou fungicidas é antigo, mas apenas recentemente, com a chegada dos cultivos transgênicos resistentes ao herbicida glifosato (soja, milho e algodão RR), o problema assumiu, aparentemente, maior relevância para o agricultor. A resistência da buva e do amargoso ao glifosato é um bom exemplo do problema, cuja ocorrência pode comprometer a sustentabilidade da tecnologia, se medidas de controle não forem manejadas adequadamente.

A percepção do problema da resistência das plantas daninhas ao glifosato está sendo mais evidente do que a resistência de insetos aos inseticidas ou de doenças fúngicas aos fungicidas, porque existem pesticidas alternativos para controlar insetos e doenças, o que não acontece com a soja RR, visto inexistir, ainda, soja transgênica comercial resistente a outro herbicida. Se existisse, a solução estaria na alternância do cultivo de sementes de soja RR com sementes de outra soja transgênica. Assim, as plantas daninhas resistentes ao glifosato seriam eliminadas pelo herbicida que controla as plantas daninhas dessa outra soja, de vez que, dificilmente uma mesma planta seria resistente a dois produtos com princípios ativos diferentes.
É preciso entender que, na natureza, qualquer população de seres vivos da mesma espécie, sejam eles humanos, plantas ou animais, embora tendo uma constituição genética (DNA) muito parecida, eles não são idênticos. Podem parecer iguais, mas não o são. Qual a diferença visível, por exemplo, de uma planta de buva ou de amargoso resistente ao herbicida glifosato, das demais plantas suscetíveis da mesma espécie? Nenhuma.
E o que acontece quando uma planta daninha, num universo de bilhões de indivíduos da mesma espécie, resiste à aplicação de dose letal de determinado herbicida? Respondo: a partir dessa geração, se essa planta não for eliminada, ela será a única daquela população a ter descendentes, sinalizando que, nas próximas gerações, só os descendentes desse indivíduo sobreviverão à aplicação de doses letais desse produto, fazendo com que futuramente eles predominem na lavoura onde ocorreu a seleção, além de, com o tempo, disseminarem-se, infestando lavouras vizinhas. Fique claro que plantas daninhas não resistentes continuarão a aparecer nessa lavoura, oriundas de sementes suscetíveis presentes na lavoura de infestações passadas ou introduzidas de lavouras próximas pela força do vento.

A resistência de plantas daninhas ocorrida em lavouras cultivadas com soja RR deverá repetir-se com a soja Intacta (Bt), se o agricultor não cumprir com a recomendação de deixar uma área cultivada com soja convencional (pode ser RR, mas não Bt), próxima às áreas semeadas com soja Intacta. Essa área, denominada de refúgio, serve como criatório de lagartas suscetíveis ao controle da soja Intacta, que, cruzando com as eventuais lagartas resistentes surgidas nas lavouras cultivadas com essa soja, produzirão indivíduos suscetíveis, os quais continuarão sendo controlados pelos mecanismos de resistência da soja Intacta. Eventualmente, poderá acontecer de uma mariposa resistente cruzar com outra mariposa resistente e produzir indivíduos igualmente resistentes, o que é muito raro dado a raridade de tal ocorrência.
Pretendendo facilitar o entendimento do problema, podemos afirmar que, se fosse possível testar a resistência de toda a população humana à dose letal de determinado veneno (nem Hitler faria isso), certamente que alguns humanos sobreviveriam, igual acontece com as pragas dos nossos cultivos. Neste caso, os humanos das gerações futuras seriam imunes à dose letal do veneno que eliminou os indivíduos suscetíveis da geração anterior, visto que as pessoas oriundas a partir dessa geração seriam descendentes dos poucos indivíduos resistentes que sobreviveram.
As plantas daninhas que resistem aos herbicidas, assim como as bactérias que resistem aos remédios, são produtos do mesmo processo de seleção.

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