Cientistas demonstraram que a inoculação de sementes de alfafa, com um micróbio retirado das raízes de uma planta do deserto, os ajuda a tolerar condições de seca. Trata-se da cepa SA190 de Pseudomonas argentinensis, extraída dos nódulos radiculares de Indigofera argentea, uma planta arbustiva encontrada em desertos e matagais secos do Saara à Índia (bit.ly/3QonmAc).
O grupo de cientistas pertence ao programa “Iniciativa do deserto” da King Abdullah University of Science and Technology (KAUST). A descoberta é parte de um projeto iniciado há 10 anos para isolar e analisar micróbios do deserto, identificando os que possam transmitir às plantas cultivadas características de tolerância ao calor, ao sal e/ou à seca. Já foram isoladas mais de 10.000 cepas microbianas de raízes de plantas do deserto.
O SA190 modifica o status epigenético de importantes genes de estresse hídrico, que são expressos exclusivamente quando as plantas são expostas à seca. Foi observado que o rendimento das culturas não foi afetado quando os genes foram ativados, um efeito colateral indesejado observado em alguns estudos de mitigação do efeito da seca. A cepa SA190 mudou ativamente a arquitetura da raiz da planta e, assim, melhorou a eficiência do uso da água pela mesma.
A cepa da bactéria pode ser facilmente produzida em grandes quantidades em fermentadores. Após formulado, torna-se um produto comercial para ser usado no revestimento das sementes. Assim que a plana germina, a bactéria associa-se às suas raízes, evitando a competição com outros microrganismos do solo.
Aumento da imunidade
A demonstração de que uma proteína reguladora, ligada às respostas ao estresse hídrico nas plantas, também melhora a imunidade, pode ajudar a desenvolver culturas mais resistentes a pragas, ao mesmo tempo em que suportam as vicissitudes do clima (bit.ly/44SbZVr).
A equipe da KAUST identificou um gene modulador molecular de imunidade, que oferece a vantagem de também conferir tolerância ao estresse do clima. Assim, ao invés de focar em sinais imunológicos individuais de defesas das plantas, concentraram seus esforços em uma proteína com ação diversificada.
Em 2004, foi identificado o gene chamado OXI1 (1-quinase induzível por sinal oxidativo), que comprovou ser crítico para as respostas das plantas diante de estresses ambientais. Nos 18 anos seguintes, os estudos foram demonstrando que o OXI1 estava associado a vários aspectos da imunidade e do crescimento das plantas, sem ficar claro como a proteína exercia seus efeitos biológicos. Embora a maneira pelas qual três principais metabólitos relacionados ao sistema imunológico - ácido salicílico (SA), ácido N-hidroxi pipecólico (NHP) e camalexina - contribuem para as defesas de patógenos fosse conhecida, sua conexão com a sinalização OXI1 era obscura.
Para elucidar o tema, os cientistas criaram mutantes de plantas de Arabidopsis que não tinham a função OXI1, ou que tinham expressão elevada da proteína reguladora, executando um estudo da metabolômica associada à expressão do gene. Assim, os pesquisadores mostraram como o OXI1 aciona uma série de genes que promovem a síntese de SA, NHP e camalexina. O acúmulo dessas três moléculas promotoras do sistema imunológico confere maior proteção contra patógenos de plantas.
Mas o estudo não para nesse ponto. Foi observado que a imunidade extra trazida pela atividade aumentada do OXI1 tem um custo, que afeta negativamente o padrão de crescimento das plantas, inclusive tornando-as mais propensas à morte celular. Plantas com níveis mais baixos de OXI1, embora ainda suscetíveis à infecção por pragas bacterianas e fúngicas, tendem a crescer mais, com maquinário fotossintético mais ativo. O prosseguimento dos estudos envolve a edição do gene OXI1, de forma que o inconveniente observado nos estudos possa ser superado.
O autor é engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja, membro do Conselho Consultivo Agro Sustentável e da Academia Brasileira de Ciência Agronômica.