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Biodiesel, Brasil x EUA


Decio Luiz Gazzoni

Encontro-me nos EUA, para participar da National Biodiesel Conference e visitar instituições de pesquisa que desenvolvem projetos em Bioenergia. Embora o objetivo final do Brasil e dos EUA seja o mesmo – substituir combustíveis fósseis por derivados de biomassa – há um enorme fosso entre os recursos naturais disponíveis, as rotas tecnológicas e as visões social e ambiental das políticas públicas implementadas para atingir o objetivo.

 

Recursos naturais

Os EUA dependem da soja para produção de óleo vegetal (insumo para o biodiesel) e de milho para a produção de etanol e metanol. Ambos são muito ineficientes para estas finalidades e dependem de subsídios e artificialismos para tornarem-se competitivos. Já o Brasil dispensa o milho, pode utilizar a soja, porém conta com um poço de petróleo renovável chamado cana-de-açúcar e pode cultivar uma dezena de oleaginosas de alto rendimento de óleo ou mesmo obtê-lo por extrativismo, de palmáceas nativas presentes em diversas regiões. Temos até a mamona, adaptada à região árida nordestina.

 

Tecnologia

Enquanto o Brasil pode dedicar-se aos processos finalísticos de obtenção de matéria prima, sofisticando os sistemas de produção de oleaginosas, ou aprimorando rotas de obtenção de biodiesel, por transesterificação ou por pirólise, os americanos dependem do metanol de milho ou de gás natural. No primeiro caso o preço é alto; e, no segundo, está utilizando um combustível fóssil. Sem falar dos riscos de toxidez e de acidentes industriais com o uso do perigoso metanol. No Brasil, estamos investindo no uso do etanol de cana, mais barato, ambientalmente correto, menos tóxico e menos perigoso.

 

Visão social

O programa brasileiro de biodiesel aponta claramente para capturar a oportunidade social (geração de emprego e renda, melhor distribuição de renda, interiorização do desenvolvimento) contida na bioenergia. O próprio incentivo fiscal brasileiro aponta nesta direção, ao privilegiar a pequena propriedade. Esta visão inexiste no caso americano, que busca otimizar a racionalidade econômica, embora tenhamos que reconhecer que o benefício da isenção tributária de US$0,01 para cada ponto percentual de adição de biodiesel ao petrodiesel pode se constituir em um grande incentivo à sua produção descentralizada.

 

Comunidades isoladas

A Embrapa, em particular, possui uma visão clara de sua inserção no processo e está desenvolvendo, em parceria com a UnB, uma rota própria de obtenção de biocombustíveis derivados de óleos vegetais, perfeitamente adaptada à capacidade financeira, operacional e de demanda da pequena propriedade, dos assentamentos de reforma agrária e das comunidades isoladas. Trata-se de uma forma de agregação de valor, que pode significar uma nova etapa na sustentabilidade da agricultura familiar. No caso das comunidades isoladas, a nova tecnologia pode representar a autonomia e a sustentabilidade energética, impossível de ser adquirida com o uso de combustíveis fósseis.

 

Visão ambiental

O Brasil vai mais além dos EUA na captura da oportunidade ambiental da bioenergia. A diferença de visão está na própria base do sistema pois, enquanto o Brasil ratificou o Protocolo de Quioto na primeira hora, os EUA se recusam a subscrevê-lo, apesar de serem o maior poluidor da atmosfera, contribuindo com mais de um quarto das emissões totais de gases de efeito estufa. Em nosso país, tanto o programa do álcool, como o recém lançado programa de biodiesel, tem esta preocupação como fundamental, sendo uma diretriz governamental abraçada pela iniciativa privada e com larga aceitação na sociedade.

 

Mercado

Ao final da viagem, sinto-me enriquecido e volto com a certeza de que o Brasil está no caminho correto. Estamos lançando, nesta década, as bases para um grande negócio que movimentará o mercado interno e o comércio internacional, na próxima década. Quanto mais conheço outros países, mais me convenço que o Brasil reúne todas as condições para ser o líder da Agricultura de Energia, em escala mundial, detendo a maior parcela deste mercado, já para a próxima década.

 

O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja. Homepage: www.gazzoni.pop.com.br

 

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