Nas últimas décadas, a pecuária de corte e leite tem experimentado um extraordinário crescimento na Amazônia. Atualmente, o rebanho da região é superior a 30 milhões de cabeças. Apesar de ser uma exploração típica de abertura de áreas da fronteira agrícola, a pecuária continua desempenhando papel de destaque na economia regional, já que outras atividades agrícolas - mais dependentes de capital e tecnologia, porém com maiores taxas de rentabilidade econômica - que normalmente a substituem no processo de consolidação do agronegócio, até o momento não lograram uma efetiva implementação. Neste contexto, as culturas industriais (café, dendê, seringueira, cacau, pimenta-do-reino, urucum), os cereais (milho, arroz, sorgo), as oleaginosas (soja, algodão, amendoim), a fruticultura (coco, acerola, abacaxi, banana, cupuaçu etc.), as palmáceas (açaí, pupunha) e as essências florestais (mogno, cerejeira, teca etc.), ainda participam de forma cíclica ou errática na geração de emprego e renda e na composição do produto interno bruto da Amazônia. A pecuária brasileira, particularmente na Amazônia Legal, cresceu muito nos últimos 40 anos, o que coloca o Brasil, com um rebanho bovino de 183 milhões de cabeças, explorados em 198 milhões de hectares de pastagens em 2002, como um dos principais países produtores e exportadores de carne do mundo, o que determina grandes desafios e oportunidades socioeconômicas e ambientais. O Brasil exportou, em 2002, cerca de 580.000 toneladas de carne bovina, com valor de aproximadamente US$ 994 milhões. As cadeias produtivas da pecuária de corte e de leite envolvem 2 milhões de propriedades, 7 milhões de trabalhadores e significando um agronegócio de matéria prima de US$ 30 bilhões/ano. O consumo de carne per capita no Brasil é de 38-40 kg/ano, o que representa uma alta elasticidade de renda. Se houver um aumento no PIB de 2% a.a o consumo aumentará em 1 kg/hab. Se o aumento for de 6% a.a. o consumo de carne per capita chegará a 50 kg/hab, projetados para 2020. Se o Brasil atingir o consumo per capita da Argentina (70 Kg/ano) a pecuária teria o desafio de aumentar a oferta de carne em 80%.
O rebanho bovino da Amazônica Legal tem crescido com taxas elevadas de até 22% nos últimos 10 anos, atingindo mais de 50 milhões de cabeças, transformando-se em fator principal de desenvolvimento econômico e social. A área desmatada na Amazônia Legal chegou a 63,14 milhões de hectares em 2002, ou 12,4% da área total, tendo sua área de pastagens atingido cerca de 52 milhões de hectares, em 2002, de floresta densa que foram derrubadas. Entretanto, grande parte desse desenvolvimento tem acontecido em função do desmatamento das florestas densas, o que tem causado grandes impactos ambientais. No período de 2001/2002 o desmatamento na Amazônia Legal foi da ordem de 25.500 km2, podendo ter como causas principais as alterações climáticas favoráveis, o avanço da agricultura para a produção de grãos em áreas tradicionais de pecuária, causando o deslocamento desta atividade para novas áreas recém-desmatadas, o ano eleitoral, a disponibilidade de crédito bancário, a deficiência de fiscalização e a incompatibilidade de políticas públicas, federal e estaduais.
A pecuária de carne e de leite da Amazônia Legal apresenta baixos índices de produtividade, expressos em baixos investimentos em tecnologias, equipamentos e insumos, o que reflete nos índices de lotação de 0,5 a 0,7 UA/ha e baixas produtividades de leite por animal, em torno de 3 litros/dia/animal, segundo dados coletados pela Embrapa. Também se estima que aproximadamente 60% das pastagens exibem algum tipo de degradação. Principalmente na pecuária de corte, observa-se que, apesar do baixo uso de tecnologia na maioria das propriedades, encontra-se algumas com alto nível tecnológico. Segundo a Embrapa, os custos de produção da carne na Amazônia Legal são extremamente baixos, o que permite sua competitividade nos mercados mundiais e oferece oportunidade de grande expansão se for implementada a rastreabilidade e a certificação de qualidade da carne. A receita líquida da pecuária na Amazônia tem sido calculada em R$ 132-138 /ha/ano (US$ 49-51/ha/ano), o dobro da receita obtida em São Paulo, sob condições similares.
A produção de leite apresenta-se extremamente favorável, com taxas de crescimento de 6%a.a. e baixos custos operacionais totais de produção em 9 centavos de real/litro, no caso de produtores com menos de 50 litros e que utilizam mão-de-obra familiar. A produção de leite aparece como a terceira mais importante no País, atrás apenas da avicultura de corte e da soja. Entretanto, a produção é realizada sob condições de baixos níveis de tecnologia na Amazônia Legal é caracterizada por pequenos investimentos em equipamentos. No caso dos pequenos produtores os problemas são agravados devido aos baixos volumes de produção. Apesar disso, a atividade leiteira é competitiva, alicerçada na produção a pasto, mão-de-obra familiar e facilidades de comercialização do bezerro para a pecuária de corte.
O segmento da pecuária de corte e de leite, ocupa de forma parcial e integral mais de 50% do pessoal que trabalha na área agropecuária, significando uma importante fonte de geração de renda e emprego para a região. Particularmente a produção de leite é uma atividade com grande conteúdo social, pois é desenvolvida principalmente nas pequenas propriedades familiares rurais, o que determina a necessidade de constante apoio de crédito, assistência técnica e tecnologias. Só em Rondônia a pecuária de leite envolve cerca de 44 mil famílias, com produção de 1,8 milhão de litros diários. A declaração de Rondônia e, mais recentemente do Acre, como Zona Livre de Febre Aftosa com Vacinação, significa um reconhecimento internacional aos esforços dos Governos Federal, Estadual e Municipal para promover o desenvolvimento da pecuária com qualidade e tecnologia apropriada. Isto se reflete em melhores preços da carne com relação às regiões não livres da Febre Aftosa.
O promissor mercado do couro determina a necessidade de melhorar o manejo animal, no sentido de elevar a qualidade, para abastecer a indústria de estofados, automobilística, de tapetes, de calçado e de produtos correlatos. Existe a preocupação com o avanço da soja na Amazônia Legal, o que poderá deslocar a pecuária das suas atuais áreas de produção, se simultaneamente não ocorrer um processo de intensificação da mesma, o que se traduzirá em novos desmatamentos.
Newton de Lucena Costa – Chefe Geral Embrapa Amapá
Waldo Espinoza - Secretário Executivo IICA/PROCITRÓPICOS