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A tributação nos alimentos


Decio Luiz Gazzoni

Em artigo recente, discorri sobre as sete pragas da agricultura, as quais são seis, porque, a derrama tributária, verdugo do emprego e predador da renda e do desenvolvimento do Brasil, vale por duas pragas. Os países ricos da Europa contentam-se com incidências tributárias inferiores a 40% do PIB, os EUA com 30% e o Canadá com 35%. Países de desenvolvimento similar ao Brasil adéquam-se a 18% (México), 17% (Chile) ou 16% (Venezuela). Já o Brasil auto-limita o seu desenvolvimento e a justiça social através de uma elevada incidência tributária que sobrepassa os 40%. Enquanto não entendermos que a formação de poupança para investimento - base do emprego, da renda e do desenvolvimento – é inversamente proporcional à taxação tributária, permaneceremos estagnados, o eterno país de um futuro que se afasta ao invés de se aproximar.

Tributos e pobreza

Graças ao Bom Deus, o Brasil não integra o circuito mundial da fome absoluta, aquela que aleija e mata. Entretanto, o IBGE demonstrou que o comprometimento da renda familiar com alimentação, para famílias com renda de até dois salários mínimos, varia de 40% (Rio de Janeiro) a 65% (Fortaleza), enquanto os extratos superiores de renda destinam somente 7% de sua renda às despesas com alimentação. A face mais iníqua da tributação é sua incidência sobre os alimentos. Quando se discute fórmulas para propiciar acesso à alimentação aos menos favorecidos, atentemos que, parcela ponderável da parca renda que o cidadão destina à compra dos alimentos, necessita ser dividida com o Governo. Reflitamos sobre a ineficiência de um processo que contribui para reduzir o acesso à alimentação e que elimina empregos, arrecadando impostos, que depois precisam ser transformados em programas de ...redução da fome ou de estímulo ao emprego!!!

Reforma tributária

Infelizmente, nem sempre os políticos traduzem em leis o desejo da sociedade. Quando a sociedade pugnava por uma reforma tributária, tinha em mente alguns conceitos essenciais, como:

1. a pressão tributária, medida como um percentual do PIB, deve ser proporcional à riqueza do país. Sociedades ricas possuem um lastro de renda adicional às suas necessidades básicas, o que lhes permite suportar maior incidência tributária, mantendo suas taxas de crescimento;

2. a contrapartida de serviços públicos deve ser proporcional à arrecadação tributária. Alta pressão tributária é prerrogativa de sociedades ricas, com espesso colchão social providenciado pelo governo, em forma de benefícios (aposentadoria, seguro desemprego) ou serviços (educação, saúde, segurança, transportes) de alta qualidade;

3. a tributação deve incidir, mais fortemente, sobre a renda e o consumo final;

4. os tributos devem ser progressivos, ou seja, quem pode mais paga mais;

5. seletividade tributária em função da essencialidade dos bens e serviços. Essa análise ajusta-se à discussão sobre tributação nos alimentos, ao menos àqueles componentes da cesta básica, que deveriam ser desonerados, diferencialmente da incidência sobre o consumo de luxo.

Sem impostos, sem fome

Nos EUA, o imposto sobre vendas incide nos alimentos em apenas 11 estados, sendo a maior alíquota (8,25%) aplicada no Tennessee e a menor (4%) na Virgínia. Em sete estados americanos existe um crédito recebido pelas famílias consideradas pobres, referente à devolução de tributos sobre alimentos. Na UE os alimentos são taxados pela menor das três alíquotas de IVA vigentes. Em tempo: pobre, nos EUA, é o cidadão com renda mensal inferior a US$1.000,00!

Fome Zero

Urge uma profunda reflexão social e uma luta para a taxação seletiva de alimentos no Brasil. Observe a iniqüidade da incidência de impostos em alguns alimentos da cesta básica: pão francês (14,5%), macarrão (18%), óleo (19%), feijão (23%), frango (27%) e arroz (29%). Mal comparando, uma família pobre poderia comprar 23% a mais de feijão, ou 29% a mais de arroz, se esses alimentos fossem desonerados. Com o consumidor comprando mais, o produtor produziria mais, aumentando a renda e o emprego, ao tempo em que a fome diminuiria. Não seria um Fome Zero óbvio, simples e barato? Segurança alimentar e nutrição adequada também dependem de impostos justos, não apenas da generosidade e da caridade dos brasileiros mais aquinhoados, condoídos dos seus concidadãos mais pobres, que precisam repartir a comida com um leão insensível e insaciável.

O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja. Homepage: www.gazzoni.pop.com.br.

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