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A soja e suas mil e uma utilidades


Decio Luiz Gazzoni
Uma prancha de surfe mais resistente do que as conhecidas por aqui, tendo como matéria-prima básica o óleo de soja? Não é futurologia. Está no mercado, assim como gabinetes de TV, isolantes térmicos, carpetes, colchões, selantes, e outros produtos feitos com poliuretano, resina plástica originalmente petroquímica. Segundo o cientista John Campen, do Bureau Americano da Soja (USB, na sigla em inglês), 2,6% da produção de soja dos EUA - ou 2,2 milhões de toneladas -, já é usada para fins industriais, sobretudo em lugar de petroquímicos. Somado o biodiesel, o percentual chega a 7%.Seminário organizado pela Embrapa, que termina hoje no Rio, está apresentando ao mercado brasileiro as múltiplas aplicações industriais dos óleos vegetais, particularmente o de soja. A iniciativa partiu da pesquisadora da estatal Mercedes Carrão Panizzi, que está concluindo um programa de dois anos no Centro Nacional para Utilização de Produtos Agropecuários do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA). "Nosso objetivo é mostrar possibilidades de agregação de valor à soja brasileira e aumentar as possibilidades de negócios para os produtores", disse Mercedes ao Valor. Em sua avaliação, o Brasil exporta muito farelo de soja "in natura" e há diversas alternativas para agregar valor a esse produto. Embora o uso de óleos vegetais como substitutos do petróleo esteja na infância, a especialista considera que a pesquisa precisa se antecipar às demandas por essas alternativas, que tendem a crescer com as ameaças trazidas pelo aquecimento global. "A questão ambiental não é mais poesia".No seminário, toda uma gama de aplicações não-alimentares da soja está sendo exposta por cientistas de várias partes do mundo. O americano Campen disse que as pesquisas lideradas pelo USB, em parceria com grupos privados como Dow, Chevron-Phillips e Cargill, elegeram produtos petroquímicos, biodiesel, lubrificantes, tintas, adesivos e solventes entre os principais focos para a utilização industrial da soja. Estudos americanos já mostraram que 20% dos solventes podem ser substituídos por soiato de methila, um solvente à base de soja. Em 2010, cerca de 150 mil toneladas de soja deverão estar sendo destinadas à produção de tintas nos EUA. Hoje, diz Compen, dependendo do produto a participação da soja como matéria-prima vai de 5% a 45%.Já o iugoslavo naturalizado americano Zoran Petrovic, pesquisador da Universidade de Pittsburg, calcula que de 300 mil a 500 mil toneladas de espumas de poliuretano, equivalentes a até 10% da produção mundial, já são produzidas com poliol vegetal em sua composição. A presença da matéria-prima vegetal varia de 40% a 70%, dependendo do grau de rigidez da espuma. Petrovic disse que, especialmente nas espumas rígidas, o óleo vegetal é, hoje, altamente competitivo economicamente. O cientista afirmou que não vislumbra problemas para a obtenção de matéria-prima vegetal para a indústria de poliuretano, até porque já está sendo desenvolvida uma matéria-prima a partir da glicerina, subproduto da fabricação de biodiesel cuja utilização é, atualmente, uma dor de cabeça para os cientistas e para os produtores - para cada tonelada de biodiesel, são produzidos 100 quilos (10%) de glicerina. A demanda por óleo para biodiesel é encarada como o grande gargalo do uso industrial dos óleos vegetais, inclusive por Petrovic. O Brasil precisará produzir 800 milhões de litros de biodiesel por ano em 2008 e 2,5 bilhões em 2013, meta que deverá ser antecipada. A União Européia, por sua vez, precisará de 13,45 bilhões de litros anuais a partir de 2010, e certamente terá de importar óleo de soja de países como o Brasil.
Décio Luiz Gazzoni, também pesquisador da Embrapa, afirmou que no Brasil a tendência é de que falte óleo para as múltiplas aplicações. Para ele, faltando no país um planejamento integrado para viabilizar o alcance das metas de produção de biodiesel.

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