Organização aconselha porém uma avaliação caso a caso dos alimentos contendo produtos alterados geneticamente. Os alimentos transgênicos são seguros? A Organização Mundial de Saúde (OMS) faz a pergunta e responde com prudência, num documento de vinte pontos que divulgou ontem, depois que países arrasados pela fome como Zimbábue e Zâmbia recusaram doação desse tipo de alimentação. Além disso, as duas maiores potências, os Estados Unidos e a União Européia (UE), se afrontam sobre a comercialização desse tipo de produto.
Para a OMS, é impossível se pronunciar de maneira geral sobre todos alimentos transgênicos. Daí a necessidade de se fazer avaliação caso a caso. Mas afirma que uma coisa é certa: os produtos geneticamente modificados que estão no mercado externo, como milho, soja, colza, chicória e batata, passaram com sucesso as avaliações científicas "sendo improvável que apresentem o menor risco à saúde humana".
Meio ambiente
A OMS diz ainda que "até agora não se demonstrou que o consumo de transgênicos tenha o menor efeito prejudicial para a saúde das populações nos países onde foram homologados". Mas insiste para que os países continuem a avaliar "cuidadosamente" as tecnologias modernas, examinando simultaneamente, e não separadamente, os efeitos sobre o homem e o meio ambiente.
Até agora, os países que adotaram medidas sobre alimentos transgênicos regulamentaram também os OGMs levando em conta riscos à saúde e meio ambiente e questões sobre controle e comércio (prescrição para testes e etiquetagem).
As inquietações dos consumidores sobre os alimentos transgênicos e os OGMs em geral têm repercussões importantes sobre a comercialização desses produtos sobretudo na UE, onde são chamados de "comida de Frankenstein".
A Comissão Européia, o braço executivo da UE, adotou há anos moratória para a homologação de produtos transgênicos para a comercialização. Planejava anunciar amanhã a suspensão dessa moratória. Em contrapartida, propõe normas rígidas para o acompanhamento e etiquetagem de OGMs nos alimentos.
Mas as discussões realizadas no começo da semana em Luxemburgo entre os 15 países-membros não resultaram em acordo europeu. Os países não se entendem sobre como reagir em caso de "presença fortuita" de OGMs nos alimentos, ou sobre o mínimo de transgênico que deve ter etiquetagem obrigatória para o consumidor identificá-lo.
Presença fortuita
No primeiro caso, com exceção da Bélgica e da Dinamarca, os países defendem a criação de uma agência européia. Quanto à "presença fortuita" de OGMs num alimento, a presidência dinamarquesa da UE propõe que os países tolerem durante um período de transição de três anos o limite de 1% para 13 novos OGMs que receberam opinião favorável dos cientistas mas que continuam fora do mercado.
A pressão sobre a Europa é grande. Os EUA, principais fornecedores mundiais de OGMs por meio da Monsanto, esperam que a UE coloque um fim à moratória.
Washington tem ameaçado denunciar a UE na Organização Mundial de Comércio (OMC) por barreira ao comércio. Alega perdas potenciais de exportações de milho para a Europa, de US$ 300 milhões por ano. Mas a tática americana parece começar a mudar. Procura agora isolar os europeus nessa questão. Os americanos notam que a China e vários outros países da Ásia flexibilizaram sua oposição a produtos geneticamente modificados.
Em todo caso, os conflitos podem aumentar, enquanto não existir nenhum sistema global de regulamentação de OGMs. No momento, algumas organizações estão engajadas em negociações. A Comissão do Codex Alimentarium (Codex), que faz o código internacional dos alimentos, prepara princípios para a análise de risco dos alimentos transgênicos para a saúde humana, defendendo uma avaliação caso a caso antes da comercialização. Os princípios do Codex podem ser adotados ate julho de 2003 e não tem efeito jurídico obrigatório sobre as legislações nacionais. Na prática, porém, serão levados em conta no Acordo Sanitário e Fitossanitário (SPS) da OMC. Podem assim servir em caso de litígio comercial.
Protocolo de Cartagena
Além disso, o protocolo de Cartagena sobre a biodiversidade, um tratado de meio ambiente e com disciplinas obrigatórias para os países, regulamenta os movimentos transfronteiriços de organismos vivos modificados suscetíveis de transferir ou replicar material genético. Esse protocolo pode entrar em vigor no começo de 2003.
Para a OMS, o debate público vai continuar em todo o mundo, focalizando a utilização de biotecnologias (em medicina, por exemplo) e conseqüências para as sociedades: custos, vantagens e segurança. Não há consenso em nenhum lugar sobre questões como etiquetagem, como meio de reduzir a inquietação dos consumidores, segundo a OMS.
A organização nota que certos grupos se inquietam sobre o que consideram como controle exagerado do mercado de sementes por algumas companhias químicas. Considera que o debate sobre os alimentos transgênicos terá conseqüências para os direitos dos agricultores.
Para a OMS, os futuros OGMs vão envolver certamente plantas com maior resistência às doenças e a seca, concentração de nutrientes mais elevados, espécies de peixes com crescimento acelerado, plantas e animais produzindo proteínas importantes para o setor farmacêutico, como vacinas.