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Sertanejos criam avestruz no semi-árido


O semi-árido nordestino está se revelando cada vez mais propício para a criação de avestruzes. Além do clima quente e seco, que resulta em uma taxa de fertilidade superior ao de outras regiões brasileiras, criadores estão descobrindo que as aves aceitam bem a inclusão de plantas resistentes à seca na alimentação, o que contribui para reduzir os custos de produção.

Há quatro anos, a fazenda Nova Esperança, em Taquaritinga do Norte, distante cerca de 170 quilômetros de Recife (PE), administra a palma (um tipo de cacto) junto com a ração animal para o seu plantel de avestruzes. A proporção é de 3 quilos da planta, misturada a 200 gramas de farelo de trigo, para cada 1,5 quilo de concentrado.

"A palma é uma boa fonte de verde e substitui o capim na época da estiagem", observa o zootecnista André Pimentel. Os experimentos, contudo, indicam que a planta é uma fonte restrita de proteínas e não favorece a engorda dos animais. Mas essa lacuna é suprida a contento por outras variedades adaptadas ao clima semi-árido.

Entram nessa lista a leucena e o sorgo, já bastante disseminadas no sertão nordestino. Ou ainda a atriplex - planta de origem australiana que pode ser cultivada em água e solo salobros, comuns na região. Por fixar bastante sal e proteínas, ela pode ser administrada como suplemento nutricional às aves.

"O uso de qualquer dessas plantas significa redução de custos para o criador", resume André Pimentel. Outra vantagem da utilização das cultivares é a oportunidade aberta para que pequenos produtores rurais, mesmo de áreas muito áridas, também possam desenvolver a "estrutiocultura".Na prática, o mercado brasileiro já está atento às possibilidades que se desenham no sertão nordestino em relação à estrutiocultura. O grupo Aravestrux, com sede em Araçatuba, estado de São Paulo, e que atua na criação e abate de aves, além do curtimento de peles e fabricação de roupas e acessórios, está apostando alto no potencial do semi-árido.

Em parceria com o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), prefeitura e pequenos produtores de Paulo Afonso (BA), o Aravestruz participa de um projeto que inclui a instalação de um fazenda escola e um frigorífico. Orçado em R$ 3,8 milhões, o equipamento, que entra em operação em setembro, foi concebido para abater até 100 mil avestruzes por ano.

Plena carga

A expectativa dos investidores é que num horizonte de quatro ou cinco anos o frigorífico esteja operando próximo à capacidade plena e concentrando o abate regional de aves. A tarefa é ousada - considerando que todo o plantel nacional hoje é de 70 mil aves - mas o projeto vai contar com um universo expressivo de colaboradores.

"Entre quatro e cinco mil famílias de pequenos produtores vão colaborar conosco nessa empreitada", afirma o diretor-comercial do grupo Aravestruz, Maurício Lupifieri Júnior. Esse contigente inclui o reforço decorrente de outra parceria firmada com o município de Baturité, distante 100 quilômetros da capital cearense.

Pelo protocolo, assinado na semana passada, o Banco do Nordeste vai financiar a atividade até o limite de R$ 300 mil; a Prefeitura de Baturité garante as operações com um fundo de aval; e o grupo Aravestruz se compromete a repassar tecnologia e procedimentos de manejo, desde que tenha exclusividade no abate dos animais.

Mercado em expansão

A estratégia adotada em Paulo Afonso e Baturité tende a ser replicada em vários municípios nordestinos. Além da estrutiocultura ser considerada uma fonte de renda e de inclusão social para famílias sertanejas - o que agrada prefeituras e outras instituições - o mercado também recomenda investimentos na atividade."O México está disposto a nos comprar 60 mil peles de avestruz por ano. Mas isso implicaria em abater quase todo o rebanho brasileiro hoje", afirma Maurício Júnior, da Aravestruz. O grupo tem um frigorífico em São Paulo com capacidade para abater 200 animais/dia, mas vem processando entre 300 e 400 aves/mês. O couro custa US$ 180. O quilo da carne, por sua vez, pode alcançar R$ 80.

Para o produtor rural, o negócio também sugere vantagens. Além de requerer área reduzida - até 60 aves por hectare - apresenta um rendimento econômico superior a outros segmentos pecuários. A avestruz, por exemplo, pode fornecer até 2,1 mil quilos de carne num ano a partir de uma única matriz, enquanto o boi produz, em igual período, apenas 255 quilos.

Pelos cálculos da Aravestruz, a venda da prole de um casal de aves pode resultar em rendimento líquido de R$ 16 mil/ano. Essa vantagem é ainda mais expressiva para os criadores nordestinos, segundo Luís Robson Muniz, presidente da Associação das Empresas paulistas da Estrutiocultura (Aepe). "A fertilidade na região Nordeste é o dobro da verificada no Sudeste". A avestruz é originária de regiões semi-desérticas da África.

Na avaliação do presidente da Associação dos Criadores de Avestruz do Ceará (Acace), Edmar Vieira Filho, as potencialidades econômicas da estrutiocultura são amplas, mas o aproveitamento pleno da atividade pressupõe organização dos produtores. "É preciso integrar a cadeia produtiva, evitando que os criadores atuem de maneira isolada. Os instrumentos oficiais de crédito devem levar isso em conta", pondera.

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