Por milhares de anos o homem foi intuitivamente selecionando, para uso alimentar, plantas que apresentassem maior rendimento, maior resistência a pragas e melhor qualidade. Com o tempo, a ciência veio auxiliá-lo nesta tarefa. Manifestação mais contemporânea dessa aliança é o desenvolvimento, nas últimas décadas, de variedades de trigo, arroz, milho e soja com alto rendimento agrícola, capazes de alimentar uma população mundial crescente e urbanizada.
Há muito tempo novas variedades vêm sendo produzidas a partir de técnicas tradicionais de cruzamento e melhoramento, envolvendo transferência de genes por reprodução normal ou pelo uso de metodologias que alteram cromossomos, como a mutagênese química e a irradiação. Nos últimos 10 ou 15 anos, no entanto, introduziu-se uma nova tecnologia: a modificação genética para a produção de alimentos, chamada de “tecnologia do DNA recombinante”, que consiste num avanço nos processos naturais de melhoramento de plantas.
Nos cruzamentos convencionais, misturam-se ou transferem-se para uma planta, ao acaso e ao mesmo tempo, um grupo de genes, sendo o resultado a produção de uma variedade com múltiplas características, nem todas desejáveis. Como esse processo convencional é impreciso, separar as características desejáveis das indesejáveis é bastante demorado. Com a tecnologia do DNA recombinante pode-se, de forma rápida, alterar a operação de um gene pré-existente ou incorporar numa nova planta um único gene exógeno, correspondente a uma determinada característica que se deseja desenvolver.
A história mostra que mudanças na forma de produção e conservação dos alimentos sempre causaram preocupação e, quando recentes, geraram medo. Foi o caso do enlatamento, da pasteurização, da comercialização da margarina, do milho híbrido, do uso da irradiação e de microondas. E é por essa desconfiança face ao novo que crescem as questões relativas à segurança dos alimentos transgênicos.
A tecnologia do DNA recombinante permite a transferência específica de novos genes para uma planta, alterando a sua composição. Esta alteração acarreta efeitos intencionais, correspondendo à característica do gene introduzido (por exemplo, resistência a herbicidas), mas também pode gerar efeitos não intencionais (por exemplo, alteração do teor de um composto químico). Os riscos potenciais estão, portanto, associados ao novo DNA introduzido, ou ao produto de expressão desse DNA (proteína) ou a efeitos não intencionais, decorrentes da introdução no genoma e da expressão desse novo gene.
Muitos genes já foram transferidos de um organismo a outro com o objetivo de desenvolver características desejáveis, como melhoria do valor nutricional, da conservação ou da resistência a pragas. A segurança desses alimentos, obtidos por modernas técnicas da biotecnologia, é avaliada pela análise de risco que se baseia em princípios básicos, que medem sua segurança em relação à segurança dos alimentos que lhe deram origem. A aplicação dessas metodologias e o histórico de uso conhecido vem mostrando que esses produtos não são menos seguros do que aqueles que lhes deram origem.
No Brasil, esses novos alimentos estarão submetidos aos ministérios da Saúde, da Agricultura e da Ciência e Tecnologia, sujeitos a legislação específica relativa a normas de segurança e rotulagem, e avaliados por várias comissões técnico-científicas, responsáveis pela aprovação de sua comercialização. Por isso, quanto mais qualificada for a discussão em torno dos alimentos contendo organismos geneticamente modificados, maior será a informação que terão seus eventuais consumidores, e mais exigentes e mais adequadas serão as políticas reguladoras de sua produção, divulgação e distribuição.
Por Franco Lajolo professor na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP.