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Como produzir sementes de trigo no campo?

Leia sobre aspectos gerais da produção de sementes de trigo no campo.



Foto: Divulgação

O uso de tecnologia adequada é muito importante para produzir sementes que expressem o seu potencial genético. A semente é constituida de quatro partes principais com importantes funções no processo produtivo

  • Conjunto pericarpo e tegumento: localizados externamente, protegem as estruturas internas da semente;
  • Camada de aleurona: concentra minerais e proteínas importantes na síntese de enzimas que iniciam o processo germinativo, e são também fontes de aminoácidos para a síntese de novas proteínas;
  • Endosperma: constitui a maior parte da semente e armazena fonte de carboidratos que serão transportados ao embrião para formar a plântula;
  • Eixo embrionário (embrião): contém as estruturas essenciais da futura planta (coleorriza, radícula, hipocótilo, plúmula, folhas primárias, coleóptilo e escutelo.

A produção de sementes de trigo no campo é semelhante à produção de grãos, porém, com algumas diferenças para evitar misturas com sementes de outras plantas (cultivadas ou invasoras), evitando cruzamentos naturais.

 

Qualidade das sementes 

A qualidade de uma semente depende dos seguintes atributos:

  • Genéticos: são definidos no programa de melhoramento, e se refere a características como homogeneidade, distinguibilidade, produtividade, estabilidade, resistência a estresses bióticos e abióticos, estatura e estrutura da planta, precocidade etc.
  • Fisiológicos: se refere à capacidade da planta em formar uma planta saudável em condições favoráveis de campo. Essa capacidade é avaliada pelo teste de germinação no laboratório, através da semeadura de quatro lotes de 100 sementes em condições simuladas que imitam as condições ideais para a espécie. Além desse teste, é feito também testes para avaliar o vigor das sementes, sendo essas submetidas a diversos tipos de estresses. Dentre esses testes podemos citar teste de tetrazólio, teste de envelhecimento precoce ou acelerado, teste de frio, teste complexo de estresses, teste de velocidade de germinação, teste de comprimento da parte aérea e da raiz etc.
  • Sanitários: avalia a presença de bactérias, fungos, vírus, nematóides ou insetos.
  • Físicos: a qualidade física é analisada em laboratório através da análise de pureza, que identifica e quantifica os materiais que compõem o lote de sementes. São separadas as sementes puras de materiais inertes e outras sementes, sendo estas sementes divididas em sementes silvestres, sementes de outras espécies e sementes nocivas, que podem ser proibidas ou toleradas. As sementes de outras cultivares devem ser eliminadas ainda no campo, através da purificação, que é mais detalhada ao longo do texto

Quanto às características fisiológicas, a longevidade é a mais importante, e é influenciada pela qualidade da semente e condições ambientais durante o armazenamento. Quando a semente é armazenada, diversos fatores vão influenciar na sua qualidade, como adversidades no campo, constituição genética, grau de maturação, tamanho e densidade da semente, secagem etc. Durante o armazenamento, os fatores que influenciam a qualidade dessa etapa são: temperatura, umidade do ar, danos mecânicos, presença de fungos, insetos e roedores e tipo de embalagem.

Durante a formação da semente, quando os nutrientes param de ser transportados da planta mãe para a semente, ocorre o momento de "maturação fisiológica", que é quando a semente possui o maior valor de peso seco e qualidade fisiológica. Porém, esse momento ocorre quando a semente possui uma umidade inadequada para o processo de colheita, pois pode causar uma debulha deficiente, sendo necessário esperar até que a umidade diminua para um teor no qual a colheita é praticável.

A semente de trigo pode ser colhida com umidade de até 20%. A partir desse ponto, quanto menor o período que a semente fica no campo, menos ela fica sujeita a condições ambientais desfavoráveis como vento, chuva, granizo, ataque de pragas e doenças etc. A umidade ideal para o armazenamento é de 13%, dessa forma, para evitar os riscos mencionados anteriormente, a semente pode ser colhida com umidades de 16% a 18%, e passar pelo processo de secagem, devendo ser feito de forma cautelosa conforme mais elevado for o grau de umidade da semente.

 

 

Produção de sementes de trigo

Escolha da área

A escolha da área de cultivo deve considerar dois fatores:

  • Cultivo anterior: devem ser evitadas áreas cultivadas com outras cultivares de trigo no ano anterior, evitando a contaminação por plantas voluntárias.
  • Plantas invasoras: plantas invasoras nocivas ou até plantas de outras espécies cultivadas (centeio, aveia, cevada etc.) devem ser eliminadas para não ocorrer contaminação.

 

Semeadura

A semeadura é semelhante à cultivos para produção de grãos quanto à controle de invasoras, método de semeadura e espaçamento entre linhas. Porém, pode-se usar uma população mais baixa, aumentando a taxa de multiplicação, obtendo mais sementes por cada semente semeada. Além disso, uma população mais baixa resulta em melhor nutrição da planta, interferindo diretamente na qualidade da semente. 

Um espaçamento entre linhas maior pode facilitar o caminho durante as amostragens de inspeção e purificação. Caminhos abertos para as máquinas facilitam as pulverizações. Como desvantagem, o menor espaçamento resulta em menor área útil.

 

Aplicação de fertilizantes e defensivos

Um equilíbrio entre os nutrientes é importante para uma boa formação e tamanho da semente. Lavouras bem fertilizadas fazem com que as plantas tenham melhor resistência à doenças e melhor competição contra plantas invasoras. Porém, devemos ter cuidado com o excesso dos nutrientes, principalmente de nitrogênio, que resulta em acamamento e pode agravar algumas doenças.

Quanto aos defensivos, na lavoura para produção de sementes deve ser dada maior atenção quanto ao controle de doenças transmissíveis por sementes.

 

Máquinas

As máquinas utilizadas devem ser bem higienizadas, principalmente na semeadura, colheita e transporte, principalmente quando ocorre mudança de cultivar de trigo ou espécies com características semelhantes.

 

Isolamento

Ainda que o trigo seja uma planta que se auto poliniza, ocorre uma baixa taxa de polinização cruzada, e assim, é recomendado o afastamento de outras cultivares de trigo em uma distância de no mínimo três metros. Também é recomendado eliminar a faixa vizinha à outra cultivar de trigo na colheita. Devem ser evitados cruzamentos naturais e contaminações por outras espécies de plantas.

 

Purificação

A purificação objetiva manter a pureza genética da cultivar, e é realizada principalmente eliminando plantas da mesma espécie porém de cultivares diferentes ou com variações genéticas. Visa eliminar, também, plantas daninhas de outras espécies, cultivadas, silvestres ou nocivas, principalmente as de difícil separação durante o beneficiamento. A segregação residual também deve ser eliminada.

A etapa de purificação é realizada em diversas fases quando as diferenças entre as plantas são evidentes, facilitando a eliminação das plantas. No trigo, estas fases ocorrem no início do alongamento, espigamento e maturação pré-colheita. Nas fases iniciais, as plantas devem ser arrancadas junto com os afilhos e raízes para evitar a rebrota. Já no fim da maturação, as plantas devem ser eliminadas e retiradas da lavoura para não serem recolhidas pela colhedora.

Para se determinar a necessidade de purificação, podem ser feitas amostragens a campo, e comparar os valores com aqueles determinados na legislação vigente.

 

Colheita

Para serem produzidas sementes de trigo com boa qualidade, é preferencial que ocorra o mínimo de chuvas na fase final de maturação, principalmente entre a maturação fisiológica e colheita. Durante a colheita, devem ser considerados o grau de umidade das sementes, danos mecânicos e limpeza da máquina colhedora.

A colheita geralmente ocorre entre 15% e 19% de umidade na semente, evitando que esta permaneça tanto tempo no campo, ficando suscetível a doenças e ao ambiente. A colhedora é regulada visando causar o mínimo de danos mecânicos na semente, evitando reduzir a qualidade fisiológica destas no armazenamento. Desta forma, devem ser verificadas a abertura côncavo / cilindro e a velocidade do cilindro. Quanto maior a umidade da semente, maior deve ser a velocidade do cilindro para obter a trilha desejada. Já no caso de sementes mais secas, menor deve ser a abertura côncavo / cilindro, pois sementes secas possuem resistência à pressão. Assim, conforme a colheita vai sendo realizada, a umidade da semente vai diminuindo, e estas regulagens devem ser feitas durante o processo.

As avaliações dos danos nas sementes devem ser feitas no início e durante a colheita. É importante também observar a limpeza da colhedora, prevenindo a mistura mecânica das sementes com outras espécies / cultivares. Este cuidado é feito com o compressor de ar. Também é importante atentar-se ao acúmulo de sementes em elevadores, caixa armazenadora e transportadores. É recomendado descartar os primeiros volumes no início da colheita, pois pode haver a presença de sementes da colheita anterior.

 

Secagem

Já na unidade de beneficiamento, o processo se inicia pela pré-limpeza, utilizando máquina de ar e peneira (geralmente com dois jogos de peneiras, sendo um com furos maiores que as sementes e um com furos menores, e uma coluna de ar). São eliminadas as impurezas mais grosseiras, evitando que essas obstruam os equipamentos que serão posteriormente utilizados, como secadores e silos armazenadores com aeração.

A pré-limpeza não deixa a semente limpa, mas deve ser rápida para não estrangular as máquinas seguintes e possibilitar o recebimento de grandes volumes. As sementes úmidas (acima de 13% de umidade) devem ser secas imediatamente, evitando a perda de qualidade.

A remoção de água das sementes ocorre inicialmente através do transporte do vapor de água da superfície da semente para o ar, causado pelo gradiente de pressão parcial de vapor de água. Após este processo, ocorre o movimento de água do interior da semente para a superfície da semente.

A temperatura da secagem é fundamental para uma boa secagem. Altas temperaturas reduzem o nível de germinação, prejudicam o armazenamento e podem trincar as sementes, devendo assim, não serem superiores a 40ºC.

 

Beneficiamento

O beneficiamento limpa, padroniza e embala as sementes. Diversas máquinas eliminam os materiais inertes, sementes deterioradas ou mal formadas e outras sementes. O lote de semente é padronizado e acondicionado em embalagens adequadas para o armazenamento e distribuição. Geralmente são usadas máquinas de ar e peneira, separador por comprimento ou cilindro alveolado, mesa de gravidade e balança automática de embalagem, que ficam posicionadas em linha, interligadas por transportadores.

 

Armazenamento

Assim que a semente atinge a maturidade fisiológica, é feito o armazenamento. Conforme as sementes ficam armazenadas, ocorre a deterioração dessas, sendo um processo irreversível, cuja velocidade depende das condições ambientais. Ocorre perda da integridade da membrana celular, alteração na estrutura do DNA e RNA e redução das atividades das enzimas. Esses processos resultam em:

  • Redução da atividade respiratório e biossintética;
  • Redução da germinação e processo germinativo mais lento, podendo até não germinar, resultando em morte da semente;
  • Redução do potencial de armazenamento;
  • Redução da taxa de crescimento e desenvolvimento da plântula;
  • Surgimento de anormalidades nas plântulas
  • Desuniformidade de crescimento;
  • Maior sensibilidade a adversidades.

 

Durante o armazenamento, as seguintes condições ambientais podem acelerar ou reduzir o processo de deterioração:

  • Umidade relativa do ar: em um ambiente com alta umidade relativa do ar, a respiração da semente é acelerada, além de favorecer o desenvolvimento de fungos que irão prejudicar a qualidade do produto. Assim, a umidade relativa do ar deve ser baixa, porém, em ambiente com a umidade muito baixa, a semente perde peso no armazenamento. Logo, a umidade relativa do ar deve estar em equilíbrio com o grau de umidade da semente. Em temperaturas de 22ºC, as sementes de trigo com 12% de umidade se equilibram com umidade relativa do ar de 50% a 60%.
  • Temperatura: altas temperaturas durante o armazenamento de sementes aceleram a respiração, prejudicando a qualidade das sementes. O resfriamento dos grãos de até 8ºC em regiões temperadas ou 12ºC a 15ºC em regiões subtropicais diminui a respiração das sementes, detém a proliferação de insetos e limita a contaminação de fungos.
  • Tipo de embalagem: a embalagem é escolhida conforme o grau de umidade da semente e visual da embalagem. Para sementes de trigo com 11% a 13% de umidade, recomenda-se embalagens permeáveis. Em locais com altas temperaturas e umidade relativa do ar, opta-se por embalagens impermeáveis, porém, a semente armazenada deve ter menos de 9% de umidade.
  • Danos mecânicos: ocorrem durante a colheita, secagem e beneficiamento das sementes através de manejos inadequados. As sementes trincadas e/ou amassadas ficam desprotegidas quanto à umidade, ataque de insetos ou microorganismos, causando a degradação da estrutura.
  • Impurezas: as impurezas podem causar o aumento da umidade nas sementes, além de favorecer o ataque de pragas e fungos. Assim, ressalta-se a importância da pré-limpeza ao receber as sementes na unidade de beneficiamento.
  • Insetos: besouros, gorgulhos, traças e outros podem causar altas perdas nas sementes de trigo. Deve ser feito o manejo integrado dessas pragas. Você pode ler mais sobre o assunto na nossa seção sobre a cultura do trigo.
  • Roedores: assim como os insetos, causam perdas físicas de sementes. Deve ser realizado o manejo integrado, através de inspeção e monitoramento buscando identificar focos, vedação e exclusão dificultando a entrada de ratos, limpeza e organização da unidade, controle químico (através de raticidas), dando preferência à produtos crônicos, que causam hemorragias internas nos ratos e uso de armadilhas. 
  • Micro-organismos: a umidade elevada das sementes favorece o desenvolvimento de bactérias e fungos que reduzem a qualidade das sementes, como por exemplo os fungos Aspergillus spp. e Penicillium spp.

 

Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo

 

Referências:

DARIO, G. J. A.; DARIO, I. S. N. Adubação. In: BORÉM, A.; SCHEEREN, P. L. Trigo: do Plantio à Colheita. [S. l.]: Universidade Federal de Viçosa, 2015. cap. 6, p. 119-140.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE CIÊNCIA DO SOLO. Manual de Adubação e de Calagem Para os Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2016.

WIETHÖLTER, S. Fertilidade do solo e a cultura do trigo no Brasil. In: PIRES, J. L. F.; VARGAS, L.; CUNHA, G. R. da. Trigo no Brasil: bases para produção competitiva e sustentável.. [S. l.: s. n.], 2011.

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