Implementação e condução do sistema de plantio direto no trigo
Leia sobre como implementar o sistema plantio direto no trigo.
Breve histórico
O frequente uso de queimadas de restos culturais, excesso de mobilização do solo, provocando a desestruturação da camada arável e redução da estabilidade de agregados, aumento da densidade do solo, redução da porosidade e infiltração de água e aumento do processo erosivo representa um uso não conservacionista do solo, de modo que o uso ao longo dos anos vai se tornando insustentável, exigindo cada vez mais manejo e uso de insumos para se obter produtividades adequadas.
Nesse contexto, adotou-se o sistema de plantio sem preparo do solo, que é tão antigo quanto a própria agricultura, há aproximadamente 6.000 anos atrás, época em que os egípcios inventaram o arado. Porém, o plantio sem preparo do solo só se tornou possível em grandes áreas após o desenvolvimento de herbicidas, que surgiram em 1961 com o paraquat, sendo o trigo uma das principais espécies que adotou o sistema plantio direto. No Brasil, em 1961 começou-se a considerar a necessidade de uma agricultura mais conservacionista, a partir do cultivo mínimo e, em 1969, através de experimentos da UFRGS, a prática começou a ser introduzida.
De forma geral, o plantio direto elimina a erosão do solo, conserva água, economiza combustível, tempo e mão-de-obra, oferece maior possibilidade de semeadura na época certa, diminui os riscos de seca, proporciona melhor resposta da cultura às chuvas e melhora a germinação e emergência de plantas.
Foto: Paulo Kurtz / Embrapa Trigo
Implementando o SPD
Sistematização
Antes de implementar o SPD, devemos sistematizar a lavoura, que muitas vezes apresenta depressões e sulcos decorrentes dos processos de erosão, que surgem através de produções agrícolas não conservacionistas. Essas irregularidades concentram enxurradas, atrapalham o tráfego de máquinas e equipamentos, provocam manchas de fertilizantes etc. A sistematização tem o objetivo de eliminar a mobilização do solo após a implementação do plantio direto. A eliminação desses obstáculos pode ser feita através de moto niveladora ou plaina tracionada, ou até escarificações e/ou arações seguidas por gradagem, dependendo da situação. Para campos naturais, existem equipamentos específicos.
Calagem
A correção da acidez do solo de forma homogênea na camada de 0 a 20 centímetros de profundidade é fundamental para o sucesso do sistema, principalmente nos primeiros anos após a implementação. Com a evolução do sistema, o solo vai se acidificando novamente, principalmente quando o sistema de rotação de culturas contemple gramíneas. Quando o plantio direto já foi iniciado, a necessidade de calagem é determinada pela análise de solo, devendo ser feita regularmente. Para o RS e SC, a dose recomendada deve ser equivalente a ½ SMP, aplicada na superfície do solo sem incorporação.
Descompactação
Deve ser feita também a descompactação do solo. Um solo compactado reduz a infiltração e o movimento de água no solo, reduz a troca gasosa com a atmosfera, aumenta a enxurrada e erosão e dificulta a emergência das plântulas. Quando, no solo, existe a cobertura vegetal permanente do sistema plantio direto o encrostamento superficial do solo é reduzido, mas já a compactação do solo exige técnicas mais complexas. Primeiro é feito o diagnóstico das camadas compactadas, podendo ser feito através do exame morfológico das raízes, realizado no estádio de desenvolvimento das raízes. Pode ser feito também através do exame do perfil do solo, feito em pequenas trincheiras, com 30 cm de lado e 50 cm de profundidade. Também podem ser usados instrumentos como o penetrômetro ou penetógrafo.
Após o diagnóstico, a descompactação do solo pode ser feita com implementos de hastes preferencialmente, ou de discos. Devem ser observados aspectos como a umidade do solo, que deve estar na faixa equivalente à friabilidade para a operação, a profundidade de trabalho (aproximadamente 5 cm abaixo do limite inferior da camada compactada), espaçamento adequado entre as hastes e adição de material orgânico ao solo descompactado, usando uma cultura densa com abundante biomassa e sistema radicular, como aveia, centeio ou milheto.
Planejando a rotação / consorciação de culturas
No sistema plantio direto, é indispensável o cultivo de espécies que produzem altas quantidades de fitomassa (no mínimo 8 a 12 t/há/ano de matéria seca na superfície do solo). Desta forma, o planejamento da rotação / consorciação de culturas deve ser feito atendendo a conservação do solo e do ambiente, e também aspectos econômicos e comerciais, gerando produtos e diversificação de renda, bem como o histórico e estado atual da lavoura, observando se são atendidas as exigências de nutrientes, bem como fugindo de doenças e pragas em comum com as espécies do sistema.
Diversas culturas podem ser utilizadas na rotação de culturas com o trigo (clique aqui para saber mais),
Manejo dos restos culturais e culturas de cobertura
Culturas destinadas à produção de grãos
São feitas diversas regulagens para a trituração e distribuição dos restos vegetais na superfície do solo em função do tipo de cultura, espécie que se pretende implantar em sequência e tipo de equipamento disponível.
Culturas destinadas ao pastejo
A cultura para pastejo deve ser de desenvolvimento rápido e uniforme, com alta densidade de plantas e aporte de biomassa, evitando contato do animal com o solo exposto. O pastejo das culturas é interrompido por um determinado período antes da implantação da cultura seguinte, visando o desenvolvimento da biomassa. Por exemplo, a aveia preta, bastante utilizada no sul do Brasil, é pastejada desde o perfilhamento pleno, com as plantas com 25 a 30 cm, até 40 ou 45 dias antes do estabelecimento da cultura seguinte, visando a recuperação da planta e bom aporte de biomassa. Claro que estes períodos podem variar com as condições de clima, fertilidade, intensidade do pastejo etc. Também devem ser observadas possíveis compactações do solo após esta etapa.
Culturas destinadas à cobertura do solo
Estas culturas devem ter a capacidade de solucionar problemas presentes na lavoura, possuindo características de fácil manejo, boa velocidade de desenvolvimento, não ser uma possível planta daninha, produzir bastante fitomassa e reciclar / incorporar nutrientes no solo. Geralmente são manejadas no estádio de plena floração, quando possuem a maior quantidade de fitomassa.
Práticas mecânicas para o controle de enxurradas
Algumas vezes, apenas o plantio direto não é suficiente para conter a energia de enxurradas. A cobertura do solo diminui a energia erosiva da chuva, porém, em declives compridos/acentuados, a cobertura pode não ser suficiente para conter a enxurrada. Tal fato pode ser observado de forma prática através da presença de pontos de falha dos resíduos culturais ou da cobertura de solo. Para este problema, pode ser feito o plantio em contorno, terraços, faixas de retenção, vertical mulching dentre outros.
Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo
Referências:
BORÉM, A.; SCHEEREN, P. L. Trigo: do Plantio à Colheita. [S. l.]: Universidade Federal de Viçosa, 2015.
PIRES, J. L. F.; VARGAS, L.; CUNHA, G. R. da. Trigo no Brasil: bases para produção competitiva e sustentável. [S. l.: s. n.], 2011.