Como fazer a enxertia nas mudas de tomate
Tudo o que você precisa saber sobre a enxertia no tomate.
A enxertia é uma técnica que une duas partes de plantas diferentes para unir, em uma única planta, características favoráveis de ambas as cultivares. O processo é feito visando unir cultivares produtivas com cultivares resistentes ou tolerantes à doenças e pragas, salinidade ou oscilações de temperatura. Além desses benefícios, também pode ocorrer aumento do vigor da planta, melhor aproveitamento de água e nutrientes, melhor qualidade de frutos etc., proporcionando melhor retorno financeiro em diversos casos. Em outros casos, como em árvores frutíferas, porta-enxertos também são utilizados para alterar o porte das plantas, favorecendo o manuseio.
A parte inferior, que fica em contato com o solo e contribui com as raízes e é responsável pela absorção de água e nutrientes, é chamada de porta-enxerto ou cavalo. A parte superior, a qual produz o caule, folhas, flores e frutos, é chamada de enxerto ou cavaleiro. Observe a imagem abaixo:
Na imagem podemos observar um enxerto em plantas abacate, através de processo realizado com corte em "V", observado no caule, onde foram unidas ambas as plantas.
O plantio sucessivo de tomate favorece o aumento de populações de fungos, nematóides e bactérias patogênicos no solo, resultando em doenças como o fusarium, nematóide das galhas, murcha bacteriana etc. Dessa forma, a enxertia vem como uma solução, onde a copa, que possui boas características comerciais, é enxertada em porta-enxerto resistente / tolerante a essas doenças.
Atualmente, em Almeiria na Espanha, onde existe a maior área de cultivo protegido de hortaliças no mundo, o uso de enxertia é praticamente generalizado. No Japão e Coréia do Sul, mais da metade do tomate consumido é oriundo de plantas enxertadas.
O processo de enxertia em tomate - passo a passo
O local de enxertia e as ferramentas utilizadas devem ser bastante higienizados (de forma a evitar a transmissão de doenças durante a enxertia, como por exemplo o Tomato mosaic vírus), iluminado e com temperatura moderada. A enxertia pode ser feita de forma manual ou mecânica, onde robôs executam os principais processos da enxertia. A enxertia é mais eficiente quando a muda da copa e o porta-enxerto possuem diâmetro semelhante, e quando as mudas não são tão jovens e nem tão lenhosas. O enxerto de fenda possibilita uma variação um pouco maior dos diâmetros das mudas, podendo ser utilizado quando houver diferenças de tamanho impossibilitando a enxertia de emenda. Algumas práticas podem melhorar o sucesso da enxertia, como por exemplo suspender a irrigação / fertirrigação por 1 ou 2 dias antes da enxertia.
As mudas ideais para a enxertia são saudáveis, uniformes, com 2-4 folhas verdadeiras e aproximadamente 1,5 a 2,5mm de diâmetro de caule.
- Preparo das mudas - as mudas de copa (cavaleiro) e do porta-enxerto (cavalo) devem ser semeadas simultaneamente, ou em até 3 dias de diferença, semeando primeiro o material menos vigoroso. Se forem usadas mudas mais desenvolvidas para o transplante, o porta-enxerto pode ser semeado em recipientes maiores. As mudas devem ser produzidas em ambiente iluminado, de forma a evitar o estiolamento
- Enxertia - usando ferramentas como lâmina de barbear ou bisturi e presilhas, o porta-enxerto é cortado em bisel, cortando transversalmente o caule da muda em cerca de 8 centímetros de altura.
Fonte: EMBRAPA - Após, é feito uma fenda no caule, de cima pra baixo, com aproximadamente 1,5 cm de profundidade.
Fonte: EMBRAPA - Na muda da copa (cavaleiro), é feito um bisel duplo na parte de baixo, na altura das folhas cotiledonares, cortando aproximadamente 1 cm, formando uma cunha. Após, introduz-se imediatamente o bisel do cavaleiro na fenda do porta-enxerto (cavalo). Um detalhe importante é que, quanto maior a superfície de contato entre o enxerto e o porta-enxerto, melhor será a formação de calo.
Fonte: EMBRAPA - Recomenda-se usar tubos ou clips de silicone para a união das mudas e evitar o deslize entre estas. Clips de silicone são menos agressivos e mais elásticos, acompanhando o crescimento das mudas. Pode-se sustentar as mudas com palitos.
Fonte: Governo do Tocantins
Sintomas de incompatibilidade entre o enxerto e porta-enxerto
Como sintomas de incompatibilidade entre as mudas enxertadas, temos:
- Baixo índice de sobrevivência do enxerto;
- Amarelecimento das folhas, desfoliação e falta de crescimento;
- Enrolamento das folhas e morte imediata da planta;
- Diferentes taxas de crescimento entre o enxerto e o porta-enxerto;
- Excesso de crescimento na zona de enxertia;
- Ruptura do ponto de enxertia.
Cicatrização e aclimatação das mudas de tomate
Após a enxertia, é comum o enxerto murchar devido ao rompimento dos vasos condutores. Por isso, as mudas são levadas para ambiente úmido, com no mínimo 80% de umidade, sendo o ideal acima de 90% durante três dias, junto com a temperatura em aproximadamente 20 a 25ºC. Deve-se cuidar para não atingir 100% de umidade relativa, que é favorável a doenças fúngicas, enraizamento adventício e estiolamento.
Geralmente as mudas são cobertas por plástico de 5 a 7 dias, para aumentar a umidade e reduzir a intensidade de luz, promovendo a cicatrização. A alta intensidade de luz pode beneficiar a cicatrização, desde que a umidade e temperatura sejam mantidas em níveis ideais. Caso estas não sejam mantidas, a luz precisa ser reduzida para moderar a temperatura e umidade relativa.
Já na segunda semana de cicatrização, pode-se diminuir gradualmente a umidade ao passo que se aumenta gradualmente a luminosidade. As mudas que saem de um ambiente com baixa luminosidade e alta umidade precisam de alguns dias para se aclimatarem, podendo ser feito durante 2 a 4 dias. Após, antes de enviar / transplantar, as plantas precisam ser endurecidas (2 a 3 dias de irrigação reduzida)
A aclimatação visa promover uma muda lignificada, que suporte o choque do transplantio, além de estresses abióticos e bióticos, sobrevivendo no campo. Como técnicas gerais para promover a aclimatação, temos a redução da irrigação, uso de fertilizantes à base de nitrato de potássio e/ou cálcio, estresses mecânicos e manutenção da luz (<350 mole/m²/s). As mudas estarão prontas para o transplantio em 25 a 30 dias após a semeadura, ou quando tiverem 4 a 5 folhas definitivas.
Escolha do porta-enxerto
O porta-enxerto para o tomate, resistente à doença, pode ser outro genótipo de tomateiro, ou até de espécies resistentes ao gênero Solanum, como por exemplo as jurubebas, o jiló e a berinjela. Se for usado um genótipo de tomate, facilita-se o processo de enxertia ocorre menor incompatibilidade entre as espécies, porém a resistência à murcha-bacteriana é menor, não sendo uma opção interessante em locais de alta pressão da doença, ou sendo necessárias outras práticas de controle simultaneamente, como rotação de culturas e solarização. nesse caso, geralmente são usados os híbridos Guardião, Protetor, Muralha e Magnet.
Já o uso de outras espécies para porta-enxerto, como berinjela ou jurubeba, podem proporcionar proteção mais eficiente contra a murcha-bacteriana, pois alguns genótipos são imunes a diversos isolados do patógeno. Porém, o processo de enxertia nesse caso exige mais tecnologia e maior incompatibilidade, o que pode reduzir a produtividade e qualidade do fruto.
É fundamental fazer uma boa escolha do porta-enxerto e copa. A semente da copa deve ser escolhida com base na pureza, rendimento, viabilidade, qualidade do fruto e demanda do mercado. Já as cultivares de porta-enxerto são escolhidas a partir de suas resistência a doenças, vigor e adaptabilidade às condições do ambiente. A compatibilidade entre a copa e o porta-enxerto também deve ser considerada, pois também influencia na produtividade.
Veja na lista abaixo algumas espécies de porta enxerto e suas respectivas resistências:
Porta-enxerto | Empresa | Resistência |
Defensor F1 | Agristar | Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Meloidogyne incógnita, Ralstonia solanacearum, Tomato mosaic vírus (verificar raças), Verticillium dahlia |
BS PE0041 | Blueseeds | Verticillium dahlia (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Tomato mosaic vírus (verificar raças), Phytophthora dreschsleri, Ralstonia solanacearum |
Intacto | Feltrin | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Ralstonia solanacearum, Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Verticillium dahlia, Pyrenochaeta lycopersici |
Enpower | Nunhems | Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pseudomonas syringae pv. tomato, Tomato mosaic vírus, Verticillium albo-atrum, Verticillium dahlia, Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Nun 00021 | Nunhems | Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pseudomonas syringae pv. tomato, Tomato mosaic vírus, Verticillium albo-atrum, Verticillium dahlia, Ralstonia solanacearum, Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Emperador RZ F1 | Rijk Zwaan | Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pyrenochaeta lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Embajador RZ F1 | Rijk Zwaan | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pyrenochaeta lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Rampart RZ F1 | Rijk Zwaan | Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Pyrenochaeta lycopersici, Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Volt | Sakata | Verticillium dahlia (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Tomato mosaic vírus (verificar raças), Meloidogyne incógnita (verificar raças), Meloidogyne javanica, Ralstonia solanacearum |
Woodstock | Sakata | Verticillium dahlia (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Tomato mosaic vírus (verificar raças), Meloidogyne incógnita (verificar raças), Meloidogyne javanica, Ralstonia solanacearum |
Gungang | Seminis | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pyrenochaeta lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Ralstonia solanacearum, Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica, |
Shincheonggang | Seminis | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Ralstonia solanacearum, Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Multifort | Seminis | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pyrenochaeta lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Maxifort | Seminis | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Pyrenochaeta lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
SVTX6258 | Seminis | Tomato mosaic vírus (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. lycopersici (verificar raças), Fusarium oxysporum f. sp. radicis-lycopersici, Verticillium albo-atrum (verificar raças), Verticillium dahlia (verificar raças), Ralstonia solanacearum, Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incógnita, Meloidogyne javanica |
Guardião | Takii Seeds |
Alta resistência a Murcha bacteriana (Ralstonia), Verticillium, Murcha de Fusarium (Fusarium oxysporum f.sp. lycopersici raças 1 e 2 e Fusarium oxysporum f.sp. radicis-lycopersici), Virus do Mosaico do Tomate (Tm-2a) e Nematoides (Meloidogyne arenaria, M. incognita, M. javanica). |
Green Power | Takii Seeds |
Porta enxerto de médio vigor com resistência ao Fusarium raça 3. Alta resistência a Murcha bacteriana (Ralstonia), Verticillium, Pyrenochaeta, Murcha de Fusarium (Fusarium oxysporum f.sp. lycopersici raças 1, 2 e 3 e Fusarium oxysporum f.sp. radicis-lycopersici), Virus do Mosaico do Tomate (Tm-2a) e Nematoides (Meloidogyne arenaria, M. incognita, M. javanica). |
Green Rise | Takii Seeds |
Porta enxerto de médio/alto vigor com resistência ao Fusarium raça 3. |
TD 1 | Takii Seeds |
Porta enxerto de alto vigor com resistência ao Fusarium raça 3. |
Vantagens e desvantagens da enxertia no tomate
Como vantagens, temos:
- Aumento de rendimento da planta;
- Maior resistência / tolerância à doenças e nematoides;
- Melhor absorção de nutrientes;
- Aumento do ciclo produtivo, e, consequentemente, maior lucro;
- Possibilidade de cultivo múltiplo e/ou sucessivo.
Como desvantagens temos:
- Maior custo das mudas;
- Possibilidade de ocorrência de distúrbios fisiológicos;
- Necessidade de práticas culturais;
- Crescimento vegetativo excessivo;
- Maior infecção por doenças transmitidas por sementes.
Anderson Wolf Machado - Engenheiro Agrônomo
Referências:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/105996/1/13-06-CT-131.pdf
BAPTISTA, M. J.; REIS JUNIOR, F. B.; XAVIER, G. R.; ALCÂNTARA, C.; OLIVEIRA, A. R.; SOUZA, R. B.; LOPES, C. A. Eficiência da solarização e biofumigação do solo no controle da murchabacteriana do tomateiro no campo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 42, p. 933-938, 2007.