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Irrigação do arroz

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IRRIGAÇÃO DO ARROZ

Arroz de sequeiro

Grande parte das lavouras de arroz de sequeiro está localizada na Região dos Cerrados. Durante a estação chuvosa, quando é feito o cultivo, a distribuição das chuvas é irregular, sendo comum, nas áreas classificadas como de médio a alto risco climático, a ocorrência de estiagens de duas a três semanas. A baixa capacidade de retenção de água dos solos, aliada à alta demanda evapotranspirativa da atmosfera durante esses períodos, causam sérios decréscimos na produtividade do arroz. Uma das alternativas para cultivar com sucesso arroz nessas áreas é a irrigação suplementar por aspersão, utilizando o equipamento para irrigar outros cultivos na entressafra.

Um aspecto importante a ser considerado é o intervalo entre as irrigações, sendo considerada como uma boa frequência de irrigação o cálculo com base no consumo de 30% a 40% da água disponível do solo (AD). Entretanto, como a curva de retenção de água tem formas distintas para os diferentes solos, uma dada porcentagem de AD pode corresponder a diferentes tensões de água do solo. Consequentemente, os resultados expressos em porcentagem de água disponível só podem ser considerados em solos com características semelhantes. Se, por outro lado, forem expressos em tensão de água do solo, podem ser mais facilmente aplicados em outro tipo de solo.

É difícil quantificar com exatidão o volume total de água necessário para irrigação quando se utiliza irrigação suplementar, uma vez que este volume depende da quantidade e distribuição das chuvas. A necessidade total de água para o cultivo do arroz de terras altas varia de 600 a 700 mm. O requerimento de água do arroz irrigado por aspersão pode ser estimado a partir de tanques evaporimétricos, com base na relação existente entre a evaporação da água medida no tanque Classe A (ECA) e a evapotranspiração da cultura (ETc). A relação é obtida utilizando-se o coeficiente do tanque (Kp) e o coeficiente da cultura (Kc), de modo que: ETc = ECA x Kp x Kc.

Com os dados de evaporação do tanque de um local (média de vários anos) e com os coeficientes, pode-se estimar a demanda de água de maneira mais precisa que a simples medição do consumo de água em um local e num dado ano.

Outra maneira de calcular a quantidade de água a ser aplicada no solo plantado com arroz é utilizando-se tensiômetro e a curva de retenção de água deste solo. Os tensiômetros são aparelhos que medem a tensão da água do solo. A curva de retenção relaciona o teor ou o conteúdo de água do solo com a força com que ela está retida por ele. É uma propriedade físico-hídrica do solo, determinada em laboratório. Os tensiômetros devem ser instalados em duas profundidades no solo, 15 cm e 30 cm, em pelo menos três locais da área plantada, quando se trata de irrigação com pivô central. Estes pontos devem corresponder a 4/10, 7/10 e 9/10 do raio do pivô, em linha reta a partir da base. Os resultados obtidos no tensiômetro de 15 cm indicam o momento da irrigação, enquanto os resultados do de 30 cm indicam se a irrigação está sendo bem feita, sem excesso ou falta de água. A irrigação deve ser efetuada quando a média das leituras dos tensiômetros de 15 cm estiver em torno de 25 kPa.

O procedimento para determinação da quantidade de água baseia-se na curva de retenção de umidade, verificando-se a quanto 25 kPa correspondem em conteúdo de água no solo, dado em cm3 de água por cm3 de solo. Em seguida, calcula-se a diferença entre o conteúdo de umidade a 10 kPa (capacidade de campo) e a 25 kPa. Esta diferença, multiplicada pela profundidade de 30 cm, indicará a lâmina líquida de irrigação. Isto se deve ao fato de que a camada de solo de 0-30 cm de profundidade engloba a quase totalidade das raízes do arroz irrigado por aspersão e de que a leitura do tensiômetro de decisão representa a tensão média da água do solo nesta camada.

Arroz irrigado

A irrigação da lavoura de arroz está intimamente relacionada ao sistema de cultivo adotado. A adoção de um ou outro sistema irá determinar diferenças na época de início e fim da irrigação, manejo e uso da água e, principalmente, no preparo do solo. Por esta razão, o planejamento da irrigação deve ser feito por ocasião da sistematização da lavoura.

O Rio Grande do Sul caracteriza-se pelo cultivo de grandes áreas de arroz, onde predomina amplamente o sistema de cultivo com taipas em nível. A irrigação, na grande maioria das lavouras, é pouco planificada, embora se tenha o domínio da água. O irrigante coloca a água no ponto mais alto e a conduz por gravidade, mantendo uma lâmina de água através de taipas construídas com diferença de nível de 5 a 10 cm.

O Estado de Santa Catarina caracteriza-se por pequenas áreas de cultivo, onde predomina amplamente o sistema de cultivo de quadros em nível. Este sistema tem-se mostrado mais eficaz no manejo da água, tendo em vista a boa distribuição da água e um maior planejamento no sistema de irrigação e drenagem.

Necessidade de água

A quantidade de água exigida para o cultivo de arroz é o somatório da água necessária para saturar o solo, formar uma lâmina, compensar a evapotranspiração e repor as perdas por percolação vertical, as perdas laterais e dos canais de irrigação. Esta quantidade depende, principalmente, das condições climáticas, do manejo da cultura, das características físicas do solo, das dimensões e revestimento dos canais, da duração do ciclo da cultivar, da localização da fonte e da profundidade do lençol freático.

No sistema de plantio com sementes pré germinadas, além da água necessária durante o ciclo da cultura, deve-se somar as necessidades para o preparo do solo, que normalmente é feito sob condições de inundação.
A evapotranspiração e a percolação são responsáveis pela maior percentagem da demanda hídrica. A evapotranspiração compreende a água transpirada pela planta mais a água evaporada da lâmina devido à diferença de pressão de vapor entre a superfície e a atmosfera. A evaporação está diretamente relacionada com a radiação solar e a temperatura e inversamente à umidade do ar e à cobertura do solo pela cultura.

A velocidade dos ventos incrementa a evaporação. A transpiração varia com o estádio de crescimento e desenvolvimento das plantas. A percolação, por sua vez, consiste nas perdas de água por infiltração profunda e está relacionada com a textura e estrutura do solo, preparo do solo e manejo da água.

Para suprir a necessidade de água durante o ciclo para os sistemas de cultivo convencional, cultivo mínimo e plantio direto, recomendam-se a utilização de vazões contínuas de até 1,5 L s-1 ha-2 num período médio de irrigação de 80 a 100 dias. Solos com textura franco arenosa ou arenosos e com maior gradiente de declividade necessitam de vazões maiores. O uso de água também aumenta em condições de alta temperatura e baixa umidade relativa do ar.

No sistema de plantio com sementes pré germinadas, o período de irrigação é proporcionalmente maior, iniciando-se já no preparo do solo. Apesar disto, normalmente ocorre um menor volume de água utilizado durante o ciclo da cultura. Para o preparo do solo, aplica-se uma lâmina de água de 4 a 5 centímetros sobre a superfície, mais a lâmina necessária para saturar o solo. A quantidade de água para saturar o solo é em função da profundidade do lençol freático e/ou da camada impermeável, do teor de umidade e do espaço poroso do solo.

Normalmente são necessários de 1.000 a 2.000 m3 ha-1 para essa fase. Outra fase crítica de demanda de água nesse sistema ocorre por ocasião da reposição de água após a aplicação do herbicida pós-plantio do arroz. Nesta fase, a reposição deverá ser feita em 1 ou 2 dias, sendo recomendável uma vazão mínima de 2 a 3 litros por segundo por hectare, o que sugere um escalonamento na aplicação do herbicida, para evitar falta de água na reposição da lâmina. Para a manutenção da lâmina, vazões em torno de 1 L s-1 ha-2 são suficientes, tendo em vista a baixa percolação da água no solo, devido à formação da lama.

Qualidade da água

A qualidade da água é definida por uma ou mais características físicas, químicas ou biológicas. Para a irrigação, leva-se em consideração, principalmente, as características químicas e físicas. Quando há suspeitas quanto à sua qualidade, deve-se coletar amostras para análise a fim de estabelecer a concentração de elementos que podem ser tóxicos à planta, ou danosos ao meio ambiente.

Embora ainda não se disponham de parâmetros definitivos para a maioria dos agroquímicos usados para a lavoura de arroz, recomenda-se evitar a retirada da água da lavoura com resíduos de agrotóxicos e sólidos em suspensão. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) define alguns parâmetros sobre a qualidade da água de diversas classes, através da resolução nº 357 de 17 de março de 2005.

Salinidade

As características da água de irrigação quanto à salinidade são:

a) a concentração total de sais minerais;

b) a relação sódio em comparação com outros cátions;

c) a concentração de boro e outros elementos;

d) as concentrações de bicarbonato em relação à concentração de cálcio e magnésio.

Somente a determinação de todos esses fatores permitirá uma melhor avaliação da qualidade da água para irrigação.

Em anos onde a precipitação é muito baixa, principalmente em locais próximos ao mar, podem ocorrer sérios problemas para a cultura e para o solo, pela inversão do fluxo de água. Em tais circunstâncias, é possível iniciar-se o processo de salinização em solos onde não havia esse problema. O uso de água com alto conteúdo de sais pode também contribuir para a salinização dos solos. Este último problema ocorre nas lavouras da zona litorânea do RS e Litoral Sul de SC e se intensifica nos meses de janeiro e fevereiro, o que coincide com o início da fase reprodutiva, quando as plantas são mais sensíveis à salinidade. Cultivares de arroz com alto potencial produtivo cultivadas no RS e SC não toleram irrigação com água cujo teor de NaCl seja igual ou superior a 0,25%. Águas com estes teores, aplicadas a partir do início da fase reprodutiva, podem determinar redução superior a 50% na produtividade. O monitoramento sistemático da condutividade elétrica da água de irrigação é fundamental.

Toda a irrigação deve ser suspensa quando a condutividade elétrica atingir valores iguais ou maiores que 2 mS cm-1 (miliSiemens por centímetro), equivalente a 2 mmho cm-1 na unidade antiga.

Temperatura da água

O desenvolvimento da cultura de arroz, da fase inicial de irrigação até o início da formação da panícula, é afetado mais pela temperatura da água que do ar, em virtude de que as gemas responsáveis pelo desenvolvimento das folhas, perfilhos e panículas permanecem sob a água. Já nos estádios seguintes de crescimento e elongação, o desenvolvimento é afetado por ambas as temperaturas. Na maioria dos casos, a temperatura da água é superior à temperatura do ar.

À medida que a panícula se desenvolve e se sobressai do nível da água, aumenta a influência da temperatura do ar para a planta do arroz e diminui a influência da temperatura da água. A temperatura da água de irrigação, de um modo geral, não apresenta problemas nos climas tropicais, exceto quando são excessivamente altas e a água não sofre processo de renovação. Nestes casos, podem causar danos no início da formação da panícula, reduzindo o número destas e determinando a podridão das raízes. Em casos de fontes de água mais fria é recomendada a utilização de canais de condução mais largos e rasos.

Temperaturas elevadas causam prejuízos em semeadura com sementes pré germinadas, pois as plântulas não completam o processo de germinação sob temperaturas elevadas (>36°C). Neste caso, recomenda-se a aplicação de pequenas lâminas d’água para diminuir a temperatura do solo e da água estagnada. As temperaturas baixas (<20°C) prejudicam o desenvolvimento inicial da plântula e o desenvolvimento da cultura nas fases vegetativa e reprodutiva.

Manejo da água de irrigação

O manejo da água é de fundamental importância para o sucesso na produção de arroz irrigado por inundação, pois estudos efetuados demonstram que existe uma interação irrigação-cultivo. A água, além de influir no aspecto físico das plantas, interfere na disponibilidade dos nutrientes, na população e espécies de plantas daninhas presentes e na incidência de algumas pragas e doenças.

A cultura necessita de água durante todo o seu ciclo. Porém, há três períodos em que ela é mais exigente: estabelecimento do cultivo; perfilhamento; e no período entre início da diferenciação da panícula (IDP) e enchimento de grãos. Isto significa que a falta de água nestes três períodos causa danos significativos à cultura, com reflexos na produtividade.

Para o suprimento de água para a cultura do arroz, basta manter-se solo saturado uniformemente durante todo o ciclo. Entretanto, a presença da lâmina de água sobre o solo é importante, visto que influi na população de plantas daninhas, em termos de número e espécies presentes. Lâminas de água baixas ou apenas a saturação do solo favorecem o crescimento de gramíneas, ciperáceas e de folhas largas, as quais tem seu desenvolvimento prejudicado com lâminas de água mais profundas desde o início do cultivo. Em áreas mal drenadas, lâminas elevadas facilitam o surgimento e desenvolvimento de plantas daninhas aquáticas. Para determinar-se a altura da lâmina de água mais adequada, deve-se levar em consideração:

a) cultivar: as cultivares tradicionais suportam uma lâmina de água mais elevada sem prejudicar o desenvolvimento. Já as cultivares tipo intermediária e as cultivares modernas se desenvolvem melhor quando a altura da lâmina de água não ultrapassa a 10 cm de altura.

b) topografia do solo: lavouras com menor declividade possibilitam maior uniformidade na lâmina de água. Quando as lavouras têm declividades mais acentuadas, a altura da lâmina de água é bastante desuniforme. Em solos sistematizados, a lâmina é mais uniforme e o problema de topografia é minimizado.

Nos sistemas de cultivo convencional, cultivo mínimo e plantio direto, a interação herbicida-água é muito importante no controle de plantas daninhas. A aplicação de herbicidas precocemente, quando as plantas daninhas têm de uma a três folhas, diminui a dose destes e aumenta sua eficiência, propiciando bom controle e menor concorrência destas com a cultura do arroz, desde que logo em seguida se inicie a irrigação para que a lâmina d’água evite a reinfestação. Geralmente, em anos considerados normais, isto ocorre entre 15 e 20 dias após a emergência. Para isso, é importante que as estruturas de distribuição sejam planificadas e estejam em boas condições de funcionamento.

O início da inundação da lavoura depende das condições de umidade do solo e do controle de plantas daninhas, podendo ser realizado até 30 dias após a emergência das plantas. No sistema pré germinado, inicia-se a inundação antes da semeadura. Para o processo de renivelamento, alaga-se o quadro e utiliza-se o nível de água como referência para a operação. A semeadura é feita com uma lâmina de 5 a 10 cm. Após a semeadura das sementes pré germinadas em lavouras com adequado nivelamento superficial do solo, não se recomenda a retirada da lâmina d’água, seja por ocasião da drenagem inicial ou do perfilhamento da planta, independentemente da cultivar utilizada.

A manutenção de lâmina baixa de água (em torno de 5 cm de espessura) não altera o rendimento de grãos e a ocorrência de acamamento das plantas de arroz, em relação à realização da drenagem. Além disso, a presença de lâmina de água contribui para o controle mais efetivo de plantas daninhas e para a redução de perdas de solo e de agroquímicos aplicados na lavoura, diminuindo o impacto ambiental negativo da lavoura orizícola.

À medida que as plantas de arroz se desenvolvem, o nível de água deve ser gradativamente aumentado até 10 cm, mantendo-o assim durante todo o ciclo das plantas. Não há necessidade de circulação da água nos quadros, desde que esteja na temperatura adequada. Nas regiões onde há possibilidade de ocorrer frio (<16°C) durante a fase de emborrachamento, o nível da água deve ser elevado (mais 15 cm "afogamento") por um período de 15 a 20 dias, afim de que a água exerça maior efeito termoregulador, reduzindo a esterilidade de espiguetas.

Em qualquer sistema de cultivo, recomenda-se não retirar a água da lavoura antes de se completar 30 dias da aplicação de agroquímicos, efetuando-se apenas a reposição para manutenção da lâmina.

Drenagem

A supressão da irrigação deve ser feita, como regra geral, quando a maioria dos grãos tiver alcançado o estado pastoso. Se o solo possuir boa drenagem, a irrigação pode ser suprimida após o completo enchimento dos grãos. Em solos argilosos, de difícil drenagem, pode-se sugerir a supressão de água à lavoura de arroz 10 dias após a floração das plantas (±80%) para as cultivares do tipo intermediário e 15 dias para as cultivares do tipo moderno.

Durante o período de inundação, os drenos secundários devem permanecer fechados para diminuir as perdas de água. Na entressafra da cultura do arroz, o solo deve ser drenado para permitir a emergência das plantas indesejáveis.

 

José Luis da Silva Nunes

Eng. Agrº, Dr. em Fitotecnia

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