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Sistemas Produtivos de Rondônia



Newton de Lucena Costa

O Estado de Rondônia representa a mais dinâmica fronteira agrícola da Amazônia. Sua população passou de 36.935 habitantes em 1970 para 1,6 milhão em 2004. Cerca de 40% da população concentra-se na zona rural. Apesar da desaceleração do processo migratório e das restrições ecológicas à abertura de novas áreas de florestas, permanece no estado um potencial produtivo instalado muito grande. A capacidade de respostas aos estímulos governamentais ou não, visando a melhoria da produtividade agropecuária, tem sido excepcional. Para a Embrapa, conciliar o desenvolvimento agrícola usando racionalmente os recursos naturais deve ser o principal objetivo de todas as instituições responsáveis pelo processo produtivo.

Culturas anuais - As culturas alimentares anuais (arroz, feijão, milho, mandioca e feijão-caupi), tradicionalmente, destinam-se ao consumo próprio e o excedente é comercializado. Geralmente, estas culturas são implantadas em sistema de derrubada e queima, aproveitando a fertilidade natural do solo durante um período de dois a três anos. Os cultivos sucessivos em uma mesma área resultam na perda da fertilidade e degradação do solo, com o surgimento de plantas invasoras. Para a Embrapa, a utilização de tecnologias inadequadas pode inviabilizar economicamente as explorações, determinando o abandono e a incorporação de novas áreas ao processo produtivo, o que contribui para aceleração do desmatamento. Além disso, a carência de mão-de-obra e a comercialização e armazenamento deficientes são os fatores que mais contribuem para a elevação dos custos de produção, reduzindo a competitividade dos produtores no mercado nacional. No entanto, apesar destas limitações, o estado vem se firmando como um grande produtor de grãos. Em 1995, a produção estadual foi da ordem de 724 mil toneladas (arroz, milho, feijão, soja), o que representa um acréscimo de 15%, em relação à produção verificada no período 1992-94. Outra cultura anual que vem apresentando uma grande expansão nos últimos anos é a do algodão herbáceo. Esta cultura é favorecida pela baixa infestação de pragas, o que lhe confere um preço competitivo, em relação às regiões tradicionais da cotonicultura nacional.

Olericultura - na produção de olerícolas, o estado enfrenta grandes problemas devido ao excesso de chuvas no verão e as altas temperaturas anuais. Mesmo assim, as hortas comerciais vem produzindo tomate, cenoura, repolhos e folhosas em maior intensidade nos cinturões verdes das cidades mais populosas do estado, tais como Porto Velho, Ji-Paraná e Cacoal. Apesar desta produção, cerca de 80% desses produtos são importados de outros estados. Com a instalação do Pólo Hortícola de Vilhena, concomitantemente com um efetivo apoio técnico e creditício, o cultivo de hortaliças em estufas plásticas, durante o período chuvoso, está sendo viabilizado com bastante sucesso.

Culturas Perenes - as culturas perenes são estabelecidas em áreas recém-desmatadas ou em substituição às culturas anuais e, em menor proporção no reaproveitamento de capoeiras. Em geral, a exploração dessas culturas têm por base a mão-de-obra familiar. O café (187.739 ha), o cacau (34.591 ha) a banana (30.963 ha), além de fruteiras regionais ou exóticas (15.000 ha), conferem a Rondônia a maior área em cultivos perenes da Amazônia. Os estímulos às pesquisas e ao fomento com cultivos de ciclo longo deverão tornar ainda mais atrativa esta opção de exploração agrícola, com tendências para o aumento das áreas cultivadas com guaraná, urucum, mamão, acerola, pimenta-do-reino, palmáceas (palmito e frutos), desde que o mercado seja viabilizado. Além disso, há grande ênfase na implantação de sistemas multiestratos, que inclui espécies de banana, cupuaçu, seringueira, castanha-do-Brasil, café, cacau e diversas essências florestais.

Pecuária - a escassez de mão-de-obra, descapitalização do produtor e os baixos preços dos produtos agrícolas têm induzido o estado a um acelerado processo de pecuarização. A bovinocultura é a mais expressiva, tendo-se expandido a uma taxa de 22% ao ano, na última década. O efetivo bovino estadual está estimado em 11 milhões de cabeças. As pastagens cultivadas representam a principal fonte de alimentação dos rebanhos. No entanto, a utilização de práticas de manejo inadequadas, principalmente nos solos de baixa fertilidade natural, tem contribuído decisivamente para a instabilidade técnica, econômica e ecológica do processo produtivo adotado. Atualmente, pelo menos 40% das pastagens cultivadas apresentam algum estágio de degradação. Isto reflete diretamente nos baixos índices de desempenho animal e na necessidade de novos desmatamentos ou a transformação de áreas cultivadas em pastagens. Este aumento de área tem como finalidade de alimentar satisfatoriamente os rebanhos, além de comportar o seu crescimento vegetativo. A bovinocultura de corte tem se desenvolvido, em maior escala, nas grandes propriedades localizadas nas regiões sul e sudeste do estado, apresentando rebanhos com bom padrão racial. Nos projetos de colonização, onde as áreas variam entre 33 e 100 ha, predomina a bovinocultura mista, caracterizada por rabanhos de baixo padrão zootécnico. Nas proximidades dos municípios localizados ao longo do eixo da BR 364, predomina a pecuária leiteira, a qual apresenta baixos índices de produtividade: 580 litros leite/vaca/ano; 2,95 litro/vaca/dia e lactação média de 197 dias. Atualmente, existem no estado 42 unidades de beneficiamento e industrialização de leite, das quais 26 estão sob Inspeção Federal. A maior parte destas unidades estão localizadas na região centro-sul do estado. A capacidade atual instalada é de 1.258.000 litros/dia. O efetivo bovino deverá continuar crescendo em índices significativos, dado o interesse do produtor rural em eliminar seus problemas de mão-de-obra e assegurar um investimento de capital com alto nível de liquidez.

Sistemas agroflorestais - a utilização de Sistemas Agroflorestais (SAF’s) em Rondônia é uma prática relativamente bem difundida nas diferentes regiões do estado. No entanto, a sua efetiva adoção tem sido limitada por diversos fatores, dentre os quais destacam-se: a tendência dos agricultores à mococultura; a falta de uma política de desenvolvimento agroflorestal e a ausência de instrumentos de convencimento técnico-econômico-ecológico, que permitam uma atuação mais incisiva na redução da pressão antrópica sobre a cobertura vegetal original. Apesar desses obstáculos, experiências exitosas com SAF’s são constatadas nas localidades de Vila Nova Califórnia e Vila Extrema, ambas no município de Porto Velho, onde estão instalados os Projetos RECA (Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado) e PREPAM (Projeto de Reflorestamento Econômico para Ajuda Mútua). Estes projetos foram viabilizados a partir de 1989, graças aos recursos financeiros obtidos junto ao Governo da Holanda, entidades católicas da Itália e da Irlanda, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), DENACOOP (Departamento Nacional de Cooperativismo) e PMACI (Projetos para o Meio Ambiente e Culturas Indígenas). Tanto no RECA quanto no PROPAM foram utilizados diversos modelos de consórcios envolvendo castanha-do-Brasil, cupuaçu e pupunha. Estima-se que estejam estabelecidos naquela região mais de 800 ha, constituindo-se na maior concentração de SAF’s do estado. Outro fato que merece destaque é o incentivo para a adoção de SAF’s realizado pelo Governo de Rondônia, através das Secretarias de Agricultura (SEAGRI) e de Desenvolvimento Ambiental (SEDAM). De 1987 até o momento foram produzidas e distribuídas 1,3 milhões de mudas de espécies frutíferas e de essências florestais, que em grande parte foram utilizadas para o estabelecimento de SAF’s.

Florestas - as indústrias madeireiras em Rondônia vem utilizando 4,7 milhões de m3 de madeira/ano para abastecer suas necessidades de matéria-prima. Estima-se que nas florestas remanescentes do estado é extraído, anualmente, uma média de 15 m3/ha, numa área de aproximadamente 313 mil ha. Portanto, 60% dos 24,3 milhões de ha da área territorial de Rondônia já sofreram alterações antrópicas, tanto com a implantação de pastagens como pela exploração seletiva de madeira. As unidades de conservação compostas por florestas representam 24% da área do estado. Nos 16% restantes, correspondentes a 3,8 milhões de ha de reservas florestais, com uma exploração anual de 313 mil ha/ano, estima-se que a matéria-prima disponível será suficiente para abastecer as indústrias madeireiras, somente por mais 12 anos. De acordo com a Legislação em vigor, Portaria nº 1282 de 19/10/94, que regulamenta a política florestal da Amazônia, ficou estabelecido que é obrigatório a reposição de seis mudas para cada m3 de madeira consumida. Com base nesta Lei, as indústrias madeireiras deveriam plantar cerca de 28,2 milhões de mudas/ano (consumo de 4,7 milhões de m3/ano), utilizando uma área equivalente a 17 mil ha/ano. Nos últimos três anos foram reflorestadas apenas cerca de 14 milhões de árvores, enquanto que, neste período, deveriam ter sido repostas 84 milhões de árvores. Em parte, esta baixa reposição pode ser justificada pela incerteza de retorno dos investimentos aplicados pelas empresas madeireiras. Os fatores mais importantes que contribuíram para este fato foram a falta de sementes florestais de espécies nativas, em qualidade e quantidade, e o desconhecimento de técnicas silviculturais para espécies florestais nativas. Como na Amazônia existe um grande número de espécies de comprovado valor silvicultural que podem participar ativamente dos programas de reflorestamento, torna-se necessário o desenvolvimento de tecnologias, através da implantação de experimentos de crescimento de espécies, de espaçamentos e desbastes para dar suporte a um bom programa de produção de matéria-prima e sementes.

Extrativismo - a extração do látex em seringais nativos é a atividade predominante. O processamento do látex é realizado por diferentes métodos, em função do nível tecnológico e a disponibilidade de mão-de-obra e insumos. Os tipos de borracha natural obtidos são cernambi virgem prensado, cernambi virgem cocho (borracha de baixa qualidade), prancha defumada e folha fumada. A coleta da castanha-do-Brasil (Bertholletia excelsa), em termos financeiros, é mais rentável que a extração de látex da seringueira nativa (Hevea brasiliensis). O manejo efetuado consiste apenas na limpeza das áreas sob as castanheiras para facilitar a coleta de ouriços. A exploração atual da floresta se faz sem qualquer preocupação com o potencial inicial de regeneração natural. O critério para extração da madeira é puramente a conveniência econômica das serrarias, as quais compram as toras de intermediários que fazem a extração tradicional. Um problema típico da atividade é a dificuldade de extração durante o período chuvoso. Dentre as espécies de madeira comercializáveis destacam-se: angelim (Dinizia spp.), cedro (Cedrella spp.), freijó-louro (Cordia alliodora), freijó-cinza (Cordia goeldiana), cerejeira (Amburana cearensis) e mogno (Swietenia macrophylla).

Prognóstico - Rondônia representa uma situação impar dentro da Amazônia, pois sua estrutura viária e seu sistema fundiário permitem respostas rápidas às políticas de fomento à produção agrícola, pecuária e florestal, desde que viabilizados os canais necessários à comercialização. A proximidade com os mercados dos Países Andinos, aliadas às perspectivas de abertura viária para o Pacífico, colocam Rondônia em uma situação privilegiada, sendo promissores os resultados destes esforços, desde que estas alternativas sejam incluídas num futuro próximo. O cenário atual sinaliza um grande ciclo de desenvolvimento para a Amazônia e Oeste de Mato Grosso e por extensão, para todo o Brasil, com a existencia da hidrovia do Rio Madeira, que abre um grande corredor de exportação para os países da Ásia e Europa, tornando os produtos agropecuários estaduais mais competitivos no mercado Exterior. Em Rondônia, as perspectivas de desenvolvimento são ainda maiores com a instalação do porto graneleiro em Porto Velho, trazendo consigo maiores facilidades de escoamento, estímulo à produção e incremento nos programas de incentivos governamentais. Em fim, para um estado que já possui uma agricultura emergente, este ciclo terá um grande impacto na sua economia. A iniciativa privada, com suporte do governo estadual, vem desenvolvendo um projeto para a exportação de soja a granel através de Porto Velho. As alternativas presentes residem no aproveitamento da estrutura do porto existente e construção de unidades para o armazenamento e transferência dos grãos para as balsas de transporte, além da construção de um novo porto jusante ao antigo, cujo projeto foi aprovado pela Sudam. Com este sistema hidroviário, os grãos produzidos, principalmente, em Mato Grosso e sul de Rondônia serão escoados para Itacoatiara (AM) e daí para o exterior. Era previsto uma movimentação de 250 a 600 mil toneladas de soja através deste porto, já a partir de 1997. Em 2003, a quantidade movimentada foi superior a 2 milhões de toneladas.

Newton de Lucena Costa (Embrapa Amapá), José Ribamar da Cruz Oliveira (Sedam)

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